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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-07-27

UNDERGROUND 1971

1-2 terça-feira, 10 de Dezembro de 2002 - 71-07-28-ie-ls> 6500 bytes -antes-3>

IMPRENSA UNDERGROUND:LEIT-MOTIV DOS ECOLOGISTAS

28-7-1971 - 1 - A Imprensa «underground» foi um dos fenómenos que marcaram o advento, pós 25 de Abril, do movimento ecologista.
Pelos temas e pela forma «artesanal» de fazer jornalismo, a imprensa «underground» marcava posição contra o Establishment, pelo próprio «media» utilizado, assinalando a diferença que interessava aos pioneiros do ecologismo.
Em artigo sobre a revista francesa «Actuel», então modelo de imprensa «underground», escrevia-se no semanário «Notícias da Amadora» (28/7/1971) palavras que seriam um leit motiv do ecologismo depois do 25 de Abril:
«Particularmente sensíveis aos danos e malefícios de um sistema que não podem comparar com outro pior e anterior (pois só conheceram este) as novas gerações manifestam-se contra as aberrações de uma cultura tecnológica sem alma que, na febre de conquistar e dominar o mundo material, depreciou completamente o biológico e o afectivo. »
E mais adiante:
«Particularmente sensível à Ecologia e à Moral, a novíssima geração inicia a sua vida por uma atitude inevitavelmente crítica e revela a sua insatisfação, a sua revolta, a sua angústia a respeito de certos factos que já não escandalizam nem assustam os mais velhos.»
Isto escrito e publicado em 28/7/1971 era, no mínimo, prematuro, pois dava as premissas do ainda embrionário movimento ecológico.

2 - Se a conservação do ambiente estava na 1ª fila das preocupações, a verdade é que soavam ecos de preocupações mais vastas e mais profundas sobre o destino do ser humano, o significado da sua aventura cósmica, a sua dimensão metafísica ou religiosa, a sua ligação a uma transcendência. O Cosmos continuava a ser, para a ciência ocidental, apenas matéria de uma coisa chamada ...Astronomia e não propriamente como a nossa fonte, a nossa origem e as nossas raízes.
Um filósofo vindo do marxismo, André Malraux, dera o mote que encorajava os potenciais ecologistas quando afirmava: «O século XXI será religioso ou não será.»
Disfarçada por motivos óbvios, a vertente metafísica, cósmica ou religiosa do movimento ecologista, ela só viria a revelar-se, com mais à vontade, quando chegou, já na década de 80, o contributo de Etienne Guillé e sua ecologia, sua ciência alargada.

3 - O atrevimento de marchar para uma luta desigual e, à partida, para uma guerra perdida, explica-se pelo estímulo que um ou outro franco atirador teve, vindo de correntes e autores que, sendo malditos para o Establishment, estavam a fazer alguma fúria (nem que fosse por motivos comerciais ) na Europa.
O surrealismo primeiro e o realismo fantástico de Louis Pauwels e Jacquer Bergier, depois, foram duas dessas correntes de fundo que precederam o melhor das ideias ecológicas.

4 - Entre as palavras proibidas que os textos da «Frente Ecológica» colocariam entre as mais usadas, aparece a palavra «Tecnocracia».
Numa sociedade dominada por tecnocratas, esta atrevimento deve ser considerado uma atitude de coragem. Quem contestasse a Tecnocracia , era imediatamente insultado e humilhado.
Theodore Roszack, com o seu livro «Para uma Contra Cultura» foi um dos que encorajaram o jornal e as edições «Frente Ecológica» a manter essa hostilidade radical contra a Tecnocracia.
Tal como aconteceu com o movimento estudantil de Maio 1968, a dominante destes autores e correntes era não só, e pela 1ª vez, ecológica em sentido estrito (o ambiente físico) mas apontava também no sentido do ambiente cultural. Apontava portanto para um salto na vertical, para uma «espiritualização», palavra que era obviamente interdita nessa altura.
A luta contra o materialismo da época foi assumida, com mais à vontade do que na Europa, pelos grupos e movimentos que na Califórnia levaram a ecologia para o espiritualismo: Allen Ginsberg, Allan Watts, Timothy Leary e Theodore Roszack são nomes destacados dessa corrente «contra-cultura», expressão esta que escandalizou todos os bem-pensantes da época.

5 - Outra expressão que escandalizou todos os quadrantes políticos e economistas de várias formações, foi a de «crescimento zero», baseada no relatório sobre os limites do crescimento, mandado elaborar pelo Clube de Roma ao MIT (Massachusets).
O movimento ecológico iria, posteriormente, adoptar estas premissas que os próprios desenvolvimentistas tinham estabelecido, mas de nada lhe valeu: o assunto, como tantos outros que iam à raiz da questão ambiental, viria a cair no esquecimento.
Se não fosse Ribeiro Teles, nunca mais ninguém teria falado em discutir «modelos de desenvolvimento» e em assumir posição por um modelo que viabilize economica e ecologicamente o País.
Mas mesmo Ribeiro Teles também se cansou e o crescimento selvagem continua como dantes ou, se possível, ainda mais frenético.
É caso para perguntar o que andaram os ecologistas cá a fazer.

6 - O pacifismo, muito ligado às correntes anarco-libertárias, foi uma ideia que também pesou no nascente movimento ecológico.
O que se escrevia e publicava, em 1970, sobre o livro de Danilo Dolci, traduzido em português, indica como as preocupações pacifistas acompanharam as ideias e actividades dos activistas ecológicos.
Mais tarde, viria a ter certa relevância o pensamento e exemplo de Lanza del Vasto.
Podemos interrogar-nos como foi possível desaparecerem, sem deixar rastro, autores e empreendimentos dessa natureza e dessa envergadura.
Não há dúvida de que o movimento ecológico, naquilo que era fundamental e de relevância para o destino humano, foi um total e irreversível fracasso.
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1-3 - roszak-3-ls> quinta-feira, 26 de Dezembro de 2002-scan

UTOPIA OU MORTE (*)

[«Notícias do Futuro», jornal «Notícias da Beira», Moçambique, 28-Julho-1971 ] - Particularmente sensíveis aos danos e malefícios de um sistema que não podem comparar com outro pior e anterior (pois só conheceram este), as novas gerações manifestam-se contra as aberrações de uma cultura tecnológica que, na febre de conquistar o mundo material, depreciou completamente o biológico e o afectivo.

Particularmente sensível à Ecologia e à Moral, a novíssima geração, que difere da imediatamente anterior (mais preocupada com a Economia e a Política), inicia a sua vida por uma atitude inevitavelmente crítica e revela a sua insatisfação, a sua revolta, a sua angústia a respeito de certos factos que já não escandalizam nem assustam os mais velhos.

A revista Actuel, que se publica mensalmente em França, que é um dos órgãos mundiais mais importantes da imprensa «underground» (ou «free press» conforme é conhecida nos Estados Unidos), que não se ocupa só de “free jazz” e de música pop, de fitas desenhadas e alucinógenos, de emancipação feminista e de revolução existencial, de «hippies» e de comunas, publica no seu último número (Julho/Agosto de 1971) (1) este «poema» que é uma quase anedota, sobre a composição do «pão» americano ( e o leitor já vai compreender porque metemos o pão entre aspas), progresso que os outros países, fatalmente, em vias de desenvolvimento têm tendência para imitar e já começaram mesmo a imitar.

A revista Actuel, num artigo intitulado Utopia ou Morte, enuncia assim a dezena de agentes químicos que entram na fabricação do «pão nosso de cada dia»: «propianato de cálcio para conservar a farinha; diacetato de sódio para retardar a maturação; sulfato duplo de alumínio e de potássio para facilitar a acção da levedura artificial; butol-hidroxi-anisol para evitar a oxidação; citrato de mono-isopropilo para assegurar a conservação uma dezena de dias».

Isto é apenas um caso, um exemplo, um facto. Há centenas de outros. Quando uma certa demagogia insiste em acusar o cigarro como o único responsável do cancro, as novíssimas gerações resolvem, através de uma imprensa «underground» e sem demagogia, denunciar a manobra e afirmam que não é só o cigarro mas tudo ou quase tudo o que a indústria descarrega sobre o indefeso animal que é o homem, tudo o que lhe injectam pela boca, que era por onde antigamente morria o peixe más é por onde morre hoje o animal que se julga mais espertinho e o mais dotado da Natureza: o animal racional de “homo sapiens” auto-cognominado. Sapiens? Não muito, convenhamos.

Resultado: perante esta e outras que tais, os jovens da nova utopia decidem a tempo e enquanto não imolaram o seu capital de saúde às benesses da civilização, decidem não entrar no jogo, não se servir do banquete, não ingressar na lógica e na engrenagem infernais do sistema estabelecido.

Como vivem e querem viver, decidem ficar à porta da abundância e preferem o que os senhores sisudos talvez venham a classificar de vagabundagem. Mas tentemos nós (menos sisudos e mais insensatos) compreender que espécie de vagabundagem é essa. No fundo os errantes peregrinos da nova utopia foram, são e serão expelidos

O que hoje fazem algumas minorias, terão amanhã de fazer as próprias maiorias, assoladas pela super-poluição, asfixiadas de congestionamento urbano, traumatizadas por uma engrenagem infernal, expulsas, também, por um habitat perfeitamente inabitável, por uma alimentação suicida, por toda uma indústria de agressão quotidiana que, de manhã à noite, nos injecta de cancros, de vasculares, de morticínio nas estradas e de outras alegres endemias para as quais depois nos virão dizer que há «remédio» em novas doses «industriais» de venenos químicos chamados drogo-fármacos, ou de uma moral tão venenosa como eles.

Se os «hippies» e outros grupos de jovens escolheram a marginalidade, não é tanto por preguiça e horror ao trabalho (acusação que essa tal venenosa moral lhes atira): foi a brilhante civilização do lixo e do luxo que os expulsou, como nesse livro-manifesto de Theodore Roszack (2) de leitura fascinante e de imprescindível consulta, se demonstra.

Se os novos jovens preferem as comunidades rurais, é porque só aí é ainda possível que os seus filhos e os filhos dos seus filhos não comecem a comer cancro logo de pequeninos. Só aí, em comunidade independente, fora dos grandes circuitos da produtividade à tout prix -- onde a química é sempre usada para acelerar o crescimento, para conservar, para alindar, para embelezar e, claro, em última instância para cancerigenizar - a vida pode recomeçar. Trata-se de começar a viver em «new style» que é a única forma de não viver para a morte. Ou a escalada da tecnologia estaca na sua voracidade homicida (e não há sinais de que isso possa acontecer, pois todo o sistema estanque se caracteriza exactamente pela sua inércia) ou as novas gerações decidem mesmo ir fazer «ingrícola» para bem longe.

Se este aspecto da nova agricultura para os novos tempos não veio a talhe da foice durante a recente Agro 71 - que nos dizem um notável acontecimento ao nível nacional - é caso para considerar que as novas gerações não foram, mais uma vez, suficientemente informadas sobre o mais importante, e iludidas na sua boa fé.

No fundo e para o futuro próximo, o problema de uma agricultura biológica é tão importante como o do subdesenvolvimento e desenvolvimento respectivos. E não digo mais importante, porque sobrepor a vida à matéria, a Ecologia à Economia, a moral à política, pode ainda escandalizar os que têm dos problemas a visão mecanicista herdada de um positivismo ainda vigente. De facto, abundância para a morte, para quê? Que o mesmo é dizer, parafraeando o célebre slogan renascentista - «ciência sem consciência é ruína da alma» - quantidade sem qualidade é ruína do corpo. Logo, ruína total do homem.
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(1) - Actuel, nova press, n.°1 10/11, Julho/Agosto de 1971, dirigida por Francois Bizot, Rue de Richelieu 60, Paris 2
(2) - Para uma Contra Cultura, de Theodore Roszack, Colecção Vector, n.° 9, Publicações Dom Quixote, Trad. de Jorge Rosa, Lisboa, 1971
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(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado em «Notícias do Futuro», jornal «Notícias da Beira», Moçambique, 28-Julho-1971 e em «Futuro», »O Século Ilustrado», Lisboa, em 10-7-1971
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BEHAVIOR 1992

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27-7-1992

MILHÕES DE CONTOS GASTOS COM ERROS ALIMENTARES - AUTORIDADE MÉDICA EM DIETÉTICA
DENUNCIA DOENÇAS DE NUTRIÇÃO (*)

Rego de Aguiar à ANOP:

«As entidades oficiais têm descurado a educação alimentar e a sua importância na saúde da população»
«Estatisticamente não há fome em Portugal, mas há uma situação generalizada de má nutrição, que faz com que o país gaste anualmente mais de 200 milhões de contos com os problemas que dela derivam»
«Portugal importa anualmente mais de cem milhões de contos de géneros alimentares, metade dos quais desnecessariamente, porque não há sensibilidade, a nível oficial, para a necessidade de apoiar um programa alimentar racional»
«Porque importamos açúcar em quantidade suficiente que permite um consumo médio diário, por indivíduo, de 80 gramas, quando a OMS recomenda que se consuma apenas 20 gramas?»
«O cancro do cólon, um dos tipos de cancro com maior incidência na população portuguesa (e a apendicite) estão directamente dependentes de erros alimentares. A apendicite foi uma doença que surgiu há 150 anos com a refinação dos cereais, que as classes com mais recursos consideravam de luxo.»
«Os portugueses abusam do consumo de carne de vaca, bebem leite em excesso, comem poucos ovos, comem gorduras excessivamente, comem poucas leguminosas e cada português consome mais de sete ou oito gramas de sal do que deve».
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(*) Ideias e práticas ecológicas de fundo para o ecodesenvolvimento autosustentado e democrático de Cabo Verde: Produzir mais, Importar menos
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Doenças induzidas por ambiente - POLUIÇÃO LUMINOSA NO COMPORTAMENTO HUMANO(*)

Lisboa, 27/7/1992 - De um artigo por Jorge Landeiro, médico oftalmologista, publicado no «Diário de Lisboa» [18/5/1987], transcreve-se:

«O excesso de luz provoca sensações e alterações que vão desde o ligeiro incómodo até à dor viva e à cegueira, muitas vezes definitiva. São conhecidos de todos, os malefícios que a exposição prolongada às luzes intensas provocam. Os banhos de sol excessivos ou o fixar o Sol, por exemplo, durante eclipses, provocam lesões, muitas vezes irrecuperáveis.
Os oftalmologistas conhecem bem estas situações que, em alguns casos, só são detectadas em tardios exames de rotina, por poderem ser unilaterais e indolores. Estes casos, digamos, extremos, são a consequência da agressão brusca e intensa da luz (um dos instrumentos de tratamento ocular utiliza estas propriedades de fotocoagulação, provocando necroses celulares localizadas)».
«O problema da poluição luminosa existe por excesso e por carência. (...) Meios considerados hostis, como os desertos, o mar, os gelos e a neve, ou sob a terra, criaram reacções no organismo, que, talvez por ainda não terem tempo de provocar mutações e sequentes alterações anátomo-fisiológicas, provocam lesões de fravidade variável, mas habitualmente crónicas.»
«Lembremo-nos de quantos trabalhadores de radiações gama (raios X) sofreram e mesmo pereceram»
(...) Já é antigo que o conhecimento de determinados comprimentos de onda luminosa e, portanto, a sua cor, têm efeitos sobre o comportamento humano.»
«Na arquitectura e decoração, fazem-se pavimentos brancos, edifícios brancos, muros brancos, superfícies espelhadas, móveis brancos e espelhados, etc, que reflectindo a luz quase totalmente, tornam-se extremamente agressivos para o globo ocular. Os faróis, a iluminação de recintos com luzes fortes intermitentes, de cores variadas, o abuso dos «flashs», os projectores de cena de teatro e cinema, são algumas formas de agressão luminosa que todos experimentamos.»
«Muitas doenças, ligadas a ambientes agressivos, como as Blefarites, o Pterigium, o Tracoma, hemorragias de retina, etc., poderão ter, na sua origem a agressão luminosa.»
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DESTINOS 1992

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OS BURACOS ONDE EU ME QUIS METER (OBOEMQM)

Cabo, 27.7.1992

Se quisesse justificar, em poucas palavras, os milhares de páginas que escrevi, os inéditos que não consegui ou não quis publicar, o diário teimosamente tecido, linha a linha, ponto por ponto, etc., etc., se quisesse mostrar o lixo ou ouro que tudo isso é, diria que girou sempre tudo à volta da mesma obsessão, que foi também a da minha guerra perpétua: respeitar as pessoas enquanto pessoas, a criança, a mulher, o homem, o jovem, o velho, o ser humano enquanto ser humano, quer dizer, depositário do Espírito (santo) de Deus!
Foi isso - essa luta inglória e sem quartel - que me fez amargo, que me fez irritável, que me fez incómodo, que me fez indesejável, que me pôs em todas as listas negras de todos os partidos, de todas as igrejas, de todas as seitas, de todos os lobbies, que me tornou persona non grata em todos os gabinetes e redacções, que me condenou à mediocridade material, aos 100 contos de ordenado, à reforma de fome, etc., etc.
Ao reler textos meus publicados e que na altura me pareceram brandos, sem consequências, vejo como arranjei bem a caminha onde me deitar.
Vejo porque estou metido nas listas negras.
Vejo como o «fundamentalismo ecologista» foi o fanatismo que me perdeu e me impediu de fazer carreira.
Vejo como me enganei redondamente pensando que não havia censura e que estávamos em democracia. Não estamos em democracia e a Censura nunca foi tão subtil e drástica. Não eram só em Bruxelas que tomavam nota dos meus artigos. Aqui, pressurosos, nas várias centrais da Grande central, iam sendo registados os meus desmandos.
Vejo agora que devia ter dado mais atenção às merdas que escrevi. Um artigo aparentemente tão brando, como o que escrevi sobre o livro de Francesco Alberoni - «Génese» - acaba por ser, visto de agora, explosivo. Os buracos onde eu me quis meter, de facto, foram muitos. E este artigo inocente e inofensivo sobre Alberoni diz bem do estado de Sítio que tem vindo a tecer-se à minha volta, estado de Sítio que, de um modo geral, tem vindo a institucionalizar-se, como uma Teia inextrincável, na alegada democracia.
Esse artigo está cheio de flechas envenenadas que a Central não deixou de registar:
- Piadas aos meninos de «O Independente» (o intocável); referências à «barbárie do petróleo», à «barbárie da guerra cirúrgica», ao «fascismo tecnológico», ao «ecofascismo verde» ;
E ainda acho pouco?
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GERIATRIA 2002

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Sábado, 27 de Julho de 2002

Maria Rosa:
Não levo nada a mal que me tenhas enviado as fotos da Cristina, antes pelo contrário: também estou a tentar resolver o destino que darei àquilo que, no meio da papelada inútil, tu classificas, e muito bem, de sagrado. É essa triagem que estou, muito lentamente, a fazer há anos... Aquilo a que chamo os meus «balanços» pessoais.
O que me entristece, sim, é o teu estado de espírito e essa depressão continuada, que eu compreendo muito bem porque também tento defender-me dela. Fui descobrir, na medicina chinesa, que, maltratando o Baço, com abuso de coisas no forno, farinhas e etc, piorava do Baço e, portanto, da depressão. Mas de vez em quando , ela volta a galope e o vazio de tudo também. Não preciso de te explicar o que é isto, porque infelizmente também o conheces bem. Estou reagindo, neste momento, com a ajuda do computador , com o qual se vai matando o tempo, matando em sentido literal.
Calha dizer, a propósito de depressões, que tenho vindo a ficar cada vez mais materialista e menos psicologista. Materialista, no sentido chinês, significa que todo o psiquismo, especialmente o das emoções, tem uma base física (fisiológica) e que nos andamos a carpir uma vida inteira (ou a correr para psicanalistas e psiquiatras) quando o que devíamos fazer era saber qual o órgão que, maltratado por nós, está a manifestar-se (a queixar-se) por aquilo a que chamamos emoções. Na menor das hipóteses, o que alguma vez poderemos ter, neste Ocidente que fabrica doenças, é uma psicosomática, deitando então fora todas as psicologias, psiquiatrias, psicanálises e psicomoralismos em que a chamada «civilização» é estupidamente fértil.
Pedindo desculpa destas minhas filosofias baratas, digo-te então que estou agora a matar o tempo com o computador e com o que o computador pode fazer para matar o tempo. Tendo a sorte de haver quem me ensine (e venha a casa dar lições) estou a aprender como se trabalha num programa «Front Page» que se destina, imagina tu, a fazer «sites» para a Internet. Há dois anos, proclamava eu, com grande arrogância (alguma vez deixaremos de ser arrogantes?) , que nunca me meteria nesse charco da Net. Por coincidência, a Cristina trabalha numa empresa de jovens e também é o que faz. Pode ser que, por isso, um dia venha a interessar-se pelos escritos do pai, o que até agora não aconteceu.
Mas no tal site que se chamará « O Gato das Letras» , irei incluir não só os meus escritos (os menos perigosos, pois a Net é uma exposição sem público-alvo definido) e numa secção especial «Lugar aos Amigos» tenciono incluir, evidentemente, os meus amigos.
Por muitos e prolongados silêncios que eu use, não poderás duvidar da minha amizade. Aliás, sem ela, ainda o balanço de vida seria mais pobre e com saldo ainda mais negativo. Só que cada um tem a sua maneira de mostrar e demonstrar a amizade pelo outro.
Sei que tens muitos livros publicados. Mas se quiseres enviar-me alguns títulos teus (de que ainda tenhas exemplares e que eu possa ainda não ter) seria o momento, pois, como te digo, ando a triar tudo o que se refere aos amigos para o tal «Gato das Letras». Permitirás que eu depois te envie a importância com a despesa do correio: na era dos «euros» é preciso mesmo contar bem os cêntimos.
Sempre que queiras, telefona, nem que seja para relatar problemas sem solução. Ou para os quais eu não sei dizer mais do que o pouquíssimo que sei e que não aprendi nos livros mas com a experiência. Os meus silêncios têm a ver também com a minha incapacidade de falar ao telefone longamente, ficando sempre com a frustração de ter dito ainda menos do que queria (ou mais do que devia). Já sabemos as nossas discordâncias sobre saúde e doenças, mas acho que isso nada impede de a gente minimamente dialogar sobre o assunto. Ou de tentarmos.
No fundo, o que tenho sempre procurado é seguir, aí e no resto, aquela máxima de Alberto Camus: «Diminuir aritmeticamente a dor do Mundo.» Acontece que a medicina tal qual a temos (agora acrescida com a fascismo da Virulogia e da Genética) aumenta exponencialmente a dor do Mundo...Foi por isso que intitulei os meus diários de consumidor de medicinas ( são dez dossiês Fercor, dos maiores!...) com um título muito apropriado: «Mein Kampf». De facto, trata-se da «minha luta» de há uns cinquenta anos para cá!... O que para os meus amigos esquerdistas até é capaz de ser um sacrilégio!!! Somos todos muito democráticos e à esquerda: mas recusar o fascismo da actual biologia, da actual cirurgia, da actual medicina química, tá quieto oh mau.

Fiquei ontem mais tranquilo, quando vi uma carrinha toda pinocas com estes dizeres em letra garrafal: ASSISTÊNCIA GERIÁTRICA DOMICILIÁRIA. Parece um serviço oficial, com carrinha e tudo, mas deve ser uma empresa particular que viu o bom negócio de ajudar os velhinhos nos seus tugúrios. Há um mês, aqui na rua, ardeu completamente um primeiro andar, onde morava uma senhora idosa que nem deu pelo fogo e foi transportada com queimaduras para o hospital. Estas coisas assustam-me, nunca se sabe quando vamos ficar em situação idêntica.

Olha, Maria Rosa: levanta-me esse astral e conta-me como estás a fazer o teu «balanço» pessoal, o deve e haver dos anos vividos: eu poderei ir transmitindo as minhas notícias, até porque nunca como agora os meus projectos de vida são apenas um projecto: como morrer em paz e serenamente quando a hora que nos está programada chegar.
Afonso
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MEP 1974

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27-7-1974

MANIFESTO DO MOVIMENTO ECOLÓGICO PORTUGUÊS

Em reunião convocada através da Imprensa diária e que se realizou em 27 de Julho de 1974, na Cooperativa Unimave, Rua da Boa Vista, 55-2°. - Lisboa, foi discutido e aprovado o texto do Manifesto que a seguir reproduzimos e que foi posteriormente subscrito por várias pessoas interessadas.

1.1 - Num momento em que se fazem ouvir com insistência as críticas ao industrialismo e à ideologia da sociedade de consumo, e em que aumenta a angústia das novas gerações face a um mundo e a espaços sociais quase inabitáveis;
1.2 - Num momento em que aumenta a insatisfação e a revolta contra os sistemas alienantes e dominadores, nos quais se revela o carácter repressivo e asfixiante da maioria das instituições, que dizem existir para servir o homem, mas que apenas dele se servem, explorando-o ou manipulando-o;
1.3 - Num momento em que se assiste à proliferação incontrolável de poluentes e de resíduos industriais de todos os tipos, e em que, por outro lado, se verifica o fracasso das políticas reformistas do ambiente e das legislações contra a poluição e outros abusos intoleráveis contra os diversos sistemas de equilíbrio ecológico;
1.4 - Num momento em que se torna urgente informar a população de tais perigos e alertá-la contra as manobras de uma publicidade tendenciosa e sensacionalista votada à promoção de produtos supérfluos e atentatórios da integridade do meio ambiente e, portanto, do próprio ser humano;
1.5 - Num momento em que se torna imperioso contribuir para a formação de uma consciência ecológica capaz de mobilizar meios e pessoas e de intervir contra tais processos de exploração do homem e da natureza;
1.6 - Num momento em que a ecologia deixa de ser ciência elitista e académica para se converter na preocupação quotidiana de maiorias voltadas para uma acção sócio-politica militante à escala mundial,

é criado o Movimento Ecológico Português

Que pretende:

2.1 - Agrupar movimentos, indivíduos e grupos que tenham por finalidade a melhoria da qualidade da vida e que pretendam alertar e combater erros, abusos, crimes que a industrialização acelerada e indiscriminada e certas formas de vida social podam perpetrar sobre o ambiente humano e demais seres vivos;
2.2 - Abrir caminho às alternativas eco-tácticas e eco-estratégicas e fazer sair do anonimato aquela soma de informações que permitam ao cidadão e ao consumidor optar pelas soluções que mais lhe interessem ou pareçam justas no combate às tendências que pretendem impor, pela força do hábito e da argumentação tendenciosa, uma única opção à liberdade de escolha do indivíduo;
2.3 -Colocar no justo lugar a noção de apropriação da natureza pelo homem, evitando assim os perigos de uma. concepção há séculos difundida pelas ideologias dominantes - a qual incita o indivíduo a combater, a espoliar, a dominar o meio e os recursos naturais - , reafirmando a complementaridade do homem e do ambiente;
2.4 -Defender o progresso e, por isso, criticar as mitologias do "progresso" e do "bem-estar" material (que podem levar a comprometê-lo irremediavelmente), alertar a população para o sofisma da inevitabilidade de certas indústrias pesadas e fontes de energia hiperpoluentes, e denunciar a inviabilidade e o perigo das falsas soluções propostas pelo industrialismo e pelos ideólogos tecnocratas;
2.5 -Proclamar a necessidade de politização dos fenómenos sócio-económicos quotidianos e imediatos que até à data a ela têm escapado - saúde, salubridade, água pura, ar livre, silêncio, paisagem, espécies animais e vegetais, cidade, condições de trabalho, cultura, publicidade, sexualidade, procriação, suicídio - já que se revelam, mais do que nunca, fenómenos de índole política e portanto essenciais à reformulação de novas estruturas sociais;

2.6 -Denunciar:

2.6.1 - a comercialização e a propaganda abusivas do biológico, do natural, do saudável, do higiénico, do turismo, dos tempos livres, através das quais o sistema social visado procura resistir à sua própria decomposição interna;
2.6.2 - a escalada da produção indiscriminada de bens de consumo e de modelos de bem-estar material por meio da qual o homem da civilização tecnológica explora e transforma os recursos naturais dando origem a resíduos e desperdícios que envenenam todas as cadeias ecológicas e o meio social;
2.6.3 - a existência e o agravamento de um novo tipo de colonialismo à escala mundial, mascarado de auxílio, que tende a segregar a grande maioria da população em regiões do Terceiro Mundo, obtendo delas grandes produções e lucros, num ambiente permanentemente contaminado, por meio de transferência para essas zonas de indústrias altamente poluentes, que nos países colonizadores exigiriam grandes encargos salariais e a instalação de custosos dispositivos antipoluição
2.6.4 - a estrutura económica e política que impele a grande maioria da classe trabalhadora a viver e a produzir em áreas urbanas fortemente poluídas e insalubres, com o fim de obter mão-de-obra fácil e barata e, simultaneamente, reunir grandes possibilidades de consumo;
2.6.5 - as manobras reformistas e parcialistas - "leis antipoluição", "campanhas de protecção do ambiente e similares - que visam recuperar as críticas feitas ao industrialismo e à tecnocracia, as quais tentam ocultar ou dar como recuperáveis e benéficas as graves anomalias do sistema económico em questão e o despotismo da produtividade e, acima de tudo, desacreditar a contestação ecológica e as suas alternativas;
2.7 -Advertir que a noção de "mais tecnologia" deve ser substituída por "melhor tecnologia” e "mais lucro" por "qualidade de vida", denunciando desse modo a actual "barbárie tecnológica" que promete emancipar o homem quando, na realidade, mais o aliena e aniquila, contribuindo para a regressão das suas potencialidades como ser vivo e como ser social.
Lisboa, 27 de Julho de 1974
Reeditado em 22 de Fevereiro de 1975
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