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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-03-21

ETNOCÍDIOS 1989

rushdie-1> = diário de um leitor irritado

A MORTE NÃO INTERESSA

21/3/1989 – Fico podre de raiva quando leio e oiço e vejo os intelectuais do Ocidente – uma cultura que levou séculos a chacinar culturas – invocar a grande virtude democrática da livre expressão de pensamento.
Uma marca de automóveis que utiliza o palácio sagrado do Potala, residência do Dalai Lama, em Lassa, capital do Tibete, para promover o último modelo de carro, enquanto o povo tibetano continua a ser chacinado pela China comunista, sem um protesto de intelectuais, escritores e gente de cultura neste primoroso ocidente, é exemplo bem demonstrativo da supina hipocrisia com que as democracias laicas ocidentais e suas camarilhas intelectuais reagem aos genocídios e etnocídios deste tempo e mundo (imundo).
Como se a cultura em que todos estes intelectuais se empoleiram não tivesse levado séculos a explorar, a saquear, a dominar, a submeter, a aviltar outras culturas e identidades culturais.
Molière já não chega para retratar o tartufismo destes apoiantes do renegado Rushdie.
Porque não baixo-assinam alguma coisa em defesa de um povo - o tibetano - e de uma cultura - a budista - que é a mais evoluída da terra?
Porque se jactam de cultos tão fiéis servidores da barbárie?
O conceito que da morte e da pena de morte tem a matulagem que decidiu, em nome dos direitos humanos, apelidar de fanático o islamismo que condenou à morte Salman Rushdie, merece um minuto de análise. E já é perder tempo.
Uma concepção religiosa dá valor à vida - e , por isso, é à vida que a política deve dedicar todos os seus cuidados e zelos.
Para uma concepção religiosa profunda, a morte é uma ilusão, além de uma patetice.
A morte não interessa.
A morte é um chatíssimo encargo que cada vivo tem de resolver.
Quem se carrega de miasmas , ao decretar a morte de alguém, ou ao executá-la, é mais de lamentar do que aquele que for liberto desse fardo pelas suas mãos.
Lamentável é a condenação à vida dos vivos e a forma como isso se faz nas civilizadas democracias mais semelhantes a morgues ou colónias penitenciárias ou imensos manicómios e campos de concentração.
O sofrimento e as torturas em vida, infligidas por algozes que se inspiram nos discursos de peganhentos intelectuais, é que são uma violação inqualificável dos direitos humanos.
Os que defendem Rushdie, defendem que é lí~.cito, aos guardas nazis das democracias ocidentais, insultar as crenças religiosas de quem as tem. Aí, o direito ao pluralismo, que requisitam para Rushdie, desfaz-se em bruma.
Ínvia forma tem este marketing cultural e literário de promover os seus produtos.
Sem coragem de condenar à morte as suas vítimas, os algozes desta democracia preferem deixá-los apodrecer, preferem condená-los à morte lenta, preferem um suicídio aqui, o internamento psiquiátrico ali por "perturbações mentais".
Prefere as prepotências e sevicias diárias, prefere a tortura lenta e gradual, cientificamente programada, prefere o metro em hora de ponta, as greves dos transportes, enfim, as formas sociais e democráticas de liquidar, asfixiar, corroer a vida dos cidadãos condenados à vida.
Uma democracia que não tem a coragem de matar o cidadão que considera indesejável é, de facto, uma boa merda.
***

PLUTÓNIO 1981

5248 bytes 3841 caracteres janº-81 > os dossiês do silêncio - inéditos ac - balanços do apocalipse - esboços - forum dos aflitos - a leste e a oeste: em pleno gulag nuclear, o imperialismo tecnofascista das grandes potências

CARTA DE UM AFECTADO PELA RADIOACTIVIDADE À SENHORA MINISTRA DO AMBIENTE - PEQUENO MANIFESTO SOBRE O ÁTOMO PACÍFICO

[É bem perceptível o destinatário deste recado, os estalinistas, que levaram estes anos todos de Gulag português a desviar as questões da sua real prioridade e a encobrir com problemas de médio e longo e prazo os problemas mais prementes]

25/Fevereiro/1981 (21/3/1997)

Como cidadão a que puseram o carimbo de Contribuinte
Como consumidor diário de electricidade diariamente enganado pelos aparelhos diários de propaganda e de intoxicação pró Electro-nuclear
Como Rato das herdades que serve diariamente de Cobaia às experiências científicas de técnicos, engenheiros, cientistas e outros grandes filhos da Pátria
Como
(...)
manifesto e proclamo o que penso a respeito do terror nuclear e da escalada imperialista, a Leste e a Oeste, do Estado do Plutónio:
1 - Quando um simples erro de computador é suficiente para fazer estalar uma guerra nuclear, à qual ninguém escaparia segundo os cálculos daqueles cientistas, parece-me platónica qualquer discussão sobre o local onde os armamentos podem ou não podem estacionar
2 - A partir do momento que se defende como necessária ou lícita a indústria pesada em geral e a indústria nuclear em particular - e a menos que os engenheiros da indústria nuclear se decidam a comer o Plutónio que dejectam, pelas centrais nucleares que instalaram - parece-me bizantina qualquer discussão sobre as bombas que há, ou não há, e onde as armazenar; se há Plutónio, há bombas; e se há centrais nucleares pacíficas, há Plutónio. A partir daqui bem pode a juventude comunista protestar contra o armamento
3 - Uma vez colocado o Plutónio no centro da questão, outros problemas, mais terra-a-terra, do que os do armamento, se põem ao cidadão comum:
a) Um desses problemas é o da Guerra Sísmica que há [16] anos temos de gramar, sem que ninguém diga «basta» e com os cientistas todos, os sismologistas todos, totalmente vendidos, a Ladrar que não há relação entre bombas subterrâneas (a reciclagem do Plutónio!!!) e Terremotos
b) Outro problema é o dos Sobreregenadores, única via que a indústria nuclear, em total falência económica, diz ter encontrado para superar a crise: de facto, e com o Urânio a acabar-se, a indústria nuclear tem que escalar pelo Sobre-regenerador acima, nele metendo, para reciclagem, o Plutónio que lhe sai das centrais nucleares e que lhe sobra das bombas destinadas a produzir Sismos sob o nome de «testes nucleares»
c) Outro problema resultante do Plutónio é o dos cemitérios atómicos e a necessidade de manter em stock os resíduos radioactivos para os quais não há armazenamento possível
d) E aqui dois outros problemas derivados destes surgem concretamente para Portugal: um é o dos contentores com resíduos radioactivos que a CEE vem despejar na fossa dos Açores e ao largo da Galiza; o outro, é o das 3 centrais que Espanha está a instalar nos três rios portugueses, o cemitério de resíduos de Salamanca e sabe-se lá que mais, porque nada se sabe do acordo secreto assinado entre Lisboa e Madrid
4) Perante estas situações, muito reais, muito concretas e que já estão em cima de nós, o menos que, enquanto cidadão afectado, eu posso considerar das campanhas sobre o armamento é que são «manobras de distracção»: muito antes que um porta-aviões nuclear americano venha para Lisboa, Sines ou Lagos; muito antes que a NATO ou o Pacto de Varsóvia venham instalar aqui a sua porcaria; muito antes que o Computador do Pentágono se avarie e os mísseis comecem a chover em cima das nossas cabeças, já cá temos e há muito tempo, a guerra santa das santas potências que, com o seu chamado «átomo pacífico», declararam, em Hiroxima, vai para [36] anos, a guerra total chamada guerra ecológica contra o Planeta e a Espécie Humana.
***

ECOLOGIA 1981

lumpen-2> os dossiês do silêncio

ECOLOGIA, LUTA DO POVO(*)

21/3/1981 (in «A Capital») - Defender a vida e o meio ambiente onde se habita, é quase sempre defender a principal das prioridades humanas: a comida, o alimento, a subsistência primária.
O exemplo, recente, vem dos antípodas, mas serve de incentivo, aqui e agora, à nossa luta concreta por um habitat mais saudável, por um ambiente mais livre e limpo.
Notícias de Camberra, dizem que os sindicatos australianos acabam de aderir, em força, à luta dos aborígenes do Oeste da Austrália, que nos últimos tempos têm tentado boicotar a passagem do uma companhia petrolífera disposta a começar, na terra deles, a prospecção desse produto, indispensável à chamada "civilização".
Note-se que, nesta região inóspita do sexto Continente do Mundo, os naturais alimentam-se quase exclusivamente de uns lagartos gigantes, chamados "grandes iguanas", com dois metros de comprimento, alimento que certamente será destruído com as sondagens petrolíferas que a companhia "Amex" ali quer realizar, com a conivência do governo central australiano.
Note-se ainda que estes aborígenes têm a sua própria civilização do deserto, construída há milénios sobre uma secreta sabedoria obtida no contacto com um meio ambiente de incrível hostilidade. Eles, no entanto, têm conseguido sobreviver: e quem vai agora ameaçá-los, após séculos de existência, são os instrumentos e as armas de uma sociedade que se diz civilizada.
O que está em causa, no Ocidente Australiano, e o que motivou a solidariedade total de todos os sindicatos, é evidentemente este facto central: se as prospecções forem por diante, é mais um genocídio e um etnocídio de um povo que esta civilização de petróleo e da morte terá de averbar no seu curriculum...mortem.
Na luta dos aborígenes, estão empenhados também muitos brancos australianos e muitos pastores protestantes.
Afinal, a defesa da vida não compete apenas aos ecologistas. Quando as pessoas decidem tomar em suas mãos essa luta e essa defesa, os ecologistas não têm lá nada que fazer. E ficam a descansar, que bem precisam...
I
OS ÍNDIOS DE MATO GROSSO

Caso idêntico ao que está em curso na Austrália, acaba também de estalar no Brasil, estado de Mato Grosso, por causa da estrada que pretende ligar Brasília a Manaus, esmagando o território índio onde vivem ainda algumas tríbus que os brancos não conseguiram totalmente dizimar. Encontram-se em pé de guerra as tríbus dos índios suia, juruna, caiabi e txucarramos, tendo esta última desencadeado um ataque onde foram mortos onze brancos.
Também neste caso, em que os índios brasileiros não cedem às exigências, ambições e pilhagens do chamado "progresso”, são as forças da igreja que com eles se solidarizam, nomeadamente o Bispo Dom Pedro Casal da Liga, acusado, pelos poderosos fazendeiros, de ajudar os índios na sua resistência contra os cortes de árvores seculares que continuam a fazer-se na região.
Também neste caso, os índios e os bispos que os apoiam, não precisaram dos ecologistas para defender o seu território, a sua floresta, as suas raízes, enfim, a sua cultura ancestral e, mais concretamente, a base da sua subsistência alimentar, da sua vida.

Também os índios de Mato Grosso resolveram, finalmente, não suportar mais as agressões ao seu meio ambiente, enquanto os fazendeiros, que limpam as armas à espera do ataque, vão dando a opinião que têm do povo índio. "Indio é cão" - diz Moacir Prata Ferreira – “Índios são todos escravos, ladrões preguiçosos, agressores: prefiro as minhas galinhas”, acrescenta o rico fazendeiro do centro oeste do Brasil.
Só faltou insultar os índios de serem também, hoje, os grandes militantes ecologistas da Humanidade.
Um banho de sangue pode assim ocorrer, a todo o momento, em S. Félix de Araguaia, onde se encontram reunidas as condições para isso. Mais ou menos condicionados no parque de Xingu pela FUNAI (Fundação Nacional do Índio), é bem possível que os índios estejam agora dispostos a rejeitar também o paternalismo desta organização, entrando na acção directa. Tudo isto, embora alguns guerreiros índios ainda suponham possível um acordo sobre o traçado da estrada Brasília-Manaus (a famosa BR-080) se lhes for concedida a propriedade "Agropexim" e se for previsto “um parque florestal ao longo do rio."
É este amor dos índios à sua floresta, ao seu rio e à sua terra, que os brancos ricos e poderosos principalmente não lhes perdoam. E por isso limpam armas, à espera da guerra...
A oposição frontal dos índios ao corte das árvores que orlam as margens do Rio Xingu, riquíssimas em caça, baseia-se exactamente nessa razão: se as árvores forem barbaramente cortadas, como se tem estado a fazer, a caça desaparece e os índios ficam sem a sua única fonte de sobrevivência.
Tal como na Austrália o "grande iguana'', a caça é aqui, entre os índios do Mato Grosso, a principal razão das suas inquietações ecológicas, e da sua tenaz oposição a mais um ramo da Transamazónia, essa autoestrada transcontinental que alguém já designou como a "estrada para o abismo planetário".
A luta dos índios, portanto, é pura e simplesmente pela sua sobrevivência, como são sempre aliás todas as lutas em defesa da Vida e da Natureza. Selvagem será quem isto não compreender. Canibal será o que não compreende a razão das outras civilizações diferentes da sua.

OS SINDICATOS BRITÂNICOS

Atitude igualmente assinalável e que demonstra haver uma íntima ligação entre relações de trabalho e defesa ecológica, acaba de ser tomada pelos sindicatos britânicos, através da sua poderosa central, a T.U.C., cuja Comissão Económica decidiu exercer pressão sobre o governo da senhora Thatcher no sentido de este proibir totalmente a importação de produtos derivados da baleia.
Há dois anos, a mesma comissão Económica hesitara nesta atitude, receando que semelhante proibição provocasse desemprego nas indústrias derivadas dos cetáceos. Considerando agora que já não há perigo de desemprego, a poderosa central sindical inglesa lança-se na defesa da baleia, ao lado dos ecologistas, provando assim que a luta pela vida não é incompatível com a luta contra o custo de vida e outras clássicas reivindicações sindicalistas.
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(*) Publicado no jornal «A Capital» (Crónica do Planeta Terra), 21/3/1981 e, provavelmente, no semanário «Voz do Povo» e no «Diário de Coimbra»
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