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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-09-17

SAÚDE 1996

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SER PROFESSOR DE SAÚDE E MESTRE DE SI MESMO

Lisboa, 16/9/1996 - A radiestesia holística encara com grande cepticismo as terapias hoje em uso no meio das chamadas «medicinas naturais». À excepção da oligoterapia, da homeopatia, dos florais de Bach e de alguma acupunctura, as práticas hoje na moda são um bom e ledo engano, quando não são uma perversão total e completa da ordem e da lei universal.
A radiestesia holística convida as pessoas a tomarem conta de si mesmas e a tratarem-se a si próprias. Esta auto-suficiência é, no fim de contas, o que faz o cerne das medicinas hipocráticas mas que nunca é respeitado pelos terapeutas ditos hipocráticos. Nenhum terapeuta pode grande coisa para curar o doente. É o doente que, devidamente consciencializado, deve fazer a maior parte do trabalho da sua chamada «cura».
Por isso as relações médico-doente devem ser, cada vez mais, substituídas pela relação professor-aluno.
Individuais, se quiserem, mas aulas.
Será para o doente mais produtivo ver-se livre da eterna dependência relativamente ao seu médico, ao seu terapeuta, ao seu técnico de saúde, sendo cada vez mais terapeuta de si próprio.
A radiestesia holística é a melhor técnica de auto-cura e auto-suficiência . Talvez a única, ao olhar o panorama que hoje se nos apresenta de assistanato e monodependências.
A ideia de progresso está invertida desde o início: a CO coloca o progresso no futuro quando, na realidade, o progresso existiu num passado e num remotíssimo passado, dito Idade de Ouro. O resto é decadência.
***

PETRÓLEO 1978

petróleo-5> os dossiês do silêncio

DEPOIS DO PETRÓLEO, JÁ NÃO É O DILÚVIO(*)

16/9/1978 - Quando o Clube de Roma encomendou ao M. I. T. e mandou publicar, em 1972, o famoso relatório sobre os «limites do crescimento económico», era claro para os ecologistas, como Michel Bosquet/André Gorz, que se tratava de uma manobra óbvia do imperialismo petrodólar, ao mais alto nível ideológico, para generalizar e intensificar a psicose da escassês, o mito da penúria.
Já estava na forja a «crise-bluff» do petróleo (1), marcada para Setembro de 1973, com uma frota de bombardeiros «Mirage», e era preciso uma base ideológica, mesmo científica, estatística de alto a baixo, para não deixar dúvida. na opinião pública mundial e sua religiosa necessidade de mitos numéricos.
Uma das ameaças do célebre relatório - o previsionismo joga na intimidação, joga na «guerra de nervos» ou guerra psicológica - era que o petróleo ia acabar. Mais uns espichos e daria a alma ao criador.
«Bem feito», - disseram alguns amigos de Peniche.
«Ainda bem», disseram os ecologistas incomodados com o cheiro das petroquímicas, fartos de mazute nas costas de todas as bretanhas, enjoados com os derivados desse fóssil (medicamentos, adubos, etc ) que, enquanto durar e enquanto fóssil, é não só a maior ditadura mundial que a humanidade conheceu como o maior obstáculo a que vá além da era... fóssil, o maior impedimento à Civilização Solar de que os ovnis nos trazem repetidas e quase diárias notícias.
«Credo, que aflição», disseram todos quantos apoiam o negócio do oiro negro. «Como é que a gente vai andar?», perguntaram, cheias de medo, as sociedades que só andam de automóvel.
Mas uma opinião era por todos compartilhada, até mesmo pelos ecologistas, desconfiados na quinta casa: o petróleo estava por dias, era preciso reactivar a construção de centrais nucleares, enfim, ainda havia males que vinham por bem, etc. etc.
Pois qual não é o nosso espanto quando os futurologistas, irmãos daqueles que, nos computadores do M. I. T., tinham, «urbi et orbi», lançado a atoarda da penúria (que tanto ajudou a fazer subir, mensalmente. o preço dos barris...) nos mandam agora dizer que «há reservas petrolíferas quase inesgotáveis», como afirmava há dias um estudo publicado aos bochecos em Paris, pelo diário «Le Matin», documento confidencial (?) da Companhia Exon (Esso), o maior consórcio multinacional de petróleo.
Estas (in)confidências de alto nível!...
Segundo este estudo (autêntico contra-relatório M. I. T., que torna de novo o crescimento ilimitado!...), as reservas potenciais de petróleo do planeta ascenderiam a 430 milhões de toneladas. Duzentos jazigos petrolíferos continuariam inexplorados e ainda agora a era fóssil do petróleo ia na praça...
Quanto a previsões, o tecnocrata já nos habituou a rigores idênticos. Tudo o que ele prevê, sai ao contrário. Os meteorologistas da N. A. S. A. tinham avisado algumas empresas portuguesas de que não ia haver Verão, este ano, em Portugal, e o sol aí está, radioso, dando razão à N. A. S. A.
Ou porque o computador avaria, ou porque o computador, às vezes, subversivamente, partilha ideias esquerdistas ou mesmo marxistas, ou porque o tecnocrata poderia dizer como Descartas - «erro, logo existo», diz hoje o que desdiz amanhã, a verdade é que para o simples cérebro artesanal que é o dos simples mortais, esta «desdita» constante atrapalha.
O melhor é deixá-los, que eles calarar-se-ão.
Se ontem, «aqui d'el rei que o petróleo está nas lonas» e hoje «viva a festa que nunca mais acaba a fartura», nada melhor do que a gente ser de boa-fé e acreditar em tudo. Tá tudo certo.
Inesgotável como o petróleo é a paciência do cidadão.
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(1) A crise e o «bluff» - pedra angular de toda a crise mundial de recursos e de ambiente - foram largamente comentadas, da perspectiva ecológica, na livro «Depois do Petróleo, o Dilúvio», edições Estúdios Cor, 1974.
Para quase todos as países embarcados na via do «crescimento industrial infinito», o petróleo constitui o fardo mais pesado da respectiva balança de pagamentos. Portugal não foge à regra.
Um automóvel de capacidade média produz de um quarto a meia tonelada de óxido de carbono e de hidrocarboneto por dia (qualquer dos dois, cancerígeno). Em cada mil quilómetros, consome o ar que uma pessoa consome em um ano. Nos países ocidentais – assentes em quatro rodas - metade da poluição do ar é causada pelo automóvel. Actualmente existem 300 mil toneladas de chumbo em suspensão sobre a Europa, devido ao automóvel. Os milhares de mortos por ano em acidentes de automóvel, ajudam a fazer dele, de facto, o símbolo da nossa civilização do petróleo. Fóssil, mas civilização.
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(*) Publicado no jornal «A Capital» (O Mundo da Ecologia), 16/9/1978

EDUCAR 1976

1-2 - alternativas-1-aa-ie> artes alternativas – ideia ecológica - Quarta-feira, 16 de Julho de 2003 – inéditos ac

EDUCAR PARA A VIDA OU EDUCAR PARA A MORTE?

15/9/1976 - O sistema recupera tudo quanto ameace a sua ditadura sobre os homens.
A engrenagem trituradora apressa-se a ver o que constitui a semente da sua própria subversão para a deturpar primeiro, e depois comercializá-la (segunda forma de a deturpar e quase sempre liquidar).
A Ecologia entra na lista das disciplinas a abater e que, portanto, já foram, estão sendo ou vão ser cada vez mais recuperadas.
Bastava que lá estivesse o sufixo "logia'' para a tornar, desde logo, suspeita aos olhos de um militante radical. Tal como a parapsicologia, a análise energética, a antipsiquiatria, a etnologia e outras ciências que o sistema inventa para adiar a sua autodestruição iminente, entra a Ecologia no capítulo da ciência-alibi, da ciência-bóia-de-salvação.
Já repararam, com certeza, nos volumosos tratados que vão surgindo no mercado com gráficos estatísticos arrepiantes. Já repararam como a ciência estabelecida, mais uma vez, pela terminologia arrevezada, pela linguagem "esotérica", pelo calão técnico, pela superespecialização, tenta afastar da Ecologia o aprendiz militante.
Mais uma vez a ciência é deles, só eles a podem ministrar como sacerdotes encartados de mais este culto, como intermediários, medianeiros e vulgarizadores do excelso saber.
A classe universitária não quer que o poder do saber desça à rua. Acontece com a Ecologia, mas acontece com toda a investigação que se faça no sentido de subverter o sistema.
0 que o sistema está fazendo para liquidar as "artes marciais" é digno de nota.
Basta abastardar a nobre arte do Zen, basta reduzi-la a mercadoria e a objecto vendável, basta fazê-la entrar no circuito do consumo para que tais artes e práticas, tais técnicas percam o poder subversivo de que estão animadas.
Sabiam, por exemplo, que o senhor René Dubos é catedrático de Biomedicina Ambiental na Rockfeller University? Ilustre ecólogo de reputação, serve ele de intermediário respeitado e respeitável para evitar que a Ecologia caia na rua, na mão de radicais ecomilitantes...
Na Psicosomática e seus catedráticos temos outro exemplo flagrante de como o sistema distrai, adia, recupera, abastarda para nunca a gente ver o fundo ao saco.
Tal como a Parapsicologia, a Etnologia e a Ecologia, reformula a Psicosomática os temas do Saber Primordial e da Tradição Primeira, para os "tratar" à sua maneira, para os filtrar e liofilizar, para os submeter à sua própria lei e ao exame da sua própria estrutura.
Para ser aceite no seio das famílias, esses assuntos ou fenómenos esotéricos, "insólitos', etc., têm que passar a provada ciência estabelecida. Ela é que determina como e se tais temas ou fenómenos são científicos e dignos de ser tomados em consideração...
No seio das famílias, o problema é de saber se vão "educar" as crianças nos sãos princípios desta Sofistica Tecnocrática, ou segundo a Lei da Sabedoria Infinita. Se vão educar as crianças para a Morte ou para a Vida.
Quando se diz que um militante é radical demais e que as coisas não são assim tão más, o militante responde que a opção, hoje, é apenas entre a Morte e a Vida. A morte que o Sistema oferece e a vida que oferecem as alternativas.
O sistema está feito com a morte, o contra-sistema do militante radical está com a vida.
Trata-se de saber, para as famílias, se vão transmitir aos filhos os mitos e as mentiras que nos escravizaram a nós, durante vidas, durante gerações, durante eras, ou se vamos dar aos nossos filhos a oportunidade de evoluir, de criar um mundo de harmonia que nós não tivemos.
Mundo solar que espreita, de que há sinais evidentes, mundo que nasce entre flores e bombas, lágrimas e sorrisos, desespero e esperança, sismos e auroras boreais, mas que está nascendo já.
Mundo que não é possível construir em cima deste e dentro deste mas paralelamente a este.
Agrocomunas, bioagricultura, técnicas pobres, indústrias não poluentes, artesanato, criação de animais (para viverem connosco e não para abater), meditação, são sinais de um mundo solar que desponta.
Depois, as artes de curar: aprender a comer, a dormir, a respirar, a sonhar, a andar, a estar sentado, a olhar, a ver, a defender-se; aprender a transmutar o negativo em positivo; a suportar a dor e o sofrimento da violência, transformando-a em harmonia e sabedoria.
Nada disto, porém, nos será ensinado pelo ciência do Ocidente. Nada disto virá do sistema que nos escraviza e monopoliza com base nos mitos e crimes da sua infindável verborreia. Nada disto pode ser aprendido nas escolas que servem de suporte ao sistema, porque tudo isto subverte desde a raiz o sistema.
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VENENOS 1973

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A CRIANÇA E OS VENENOS QUE A CERCAM(*)

(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no semanário «O Século Ilustrado» (Lisboa), 15-9-1973


Acorrem ao banco de urgência de Santa Maria crianças intoxicadas por petróleo. Porque havemos, no entanto de consentir que o petróleo constitua perigo e provoque acidente? Hoje, quem utiliza petróleo? E em que condições, em que "casas" se utiliza?

O famoso "progresso industrial" é sempre mais industrial do que progresso e, portanto, relativo.
Diz-se que as intoxicações por produtos químicos são, entre muitos outros perigos, o "preço" a pagar pela "civilização". Gostaríamos de saber se os benefícios extraídos da referida civilização (onde estão que não os vejo?) são tantos que compensem os prejuízos, o tal "preço" a pagar.
No caso das crianças e dos riscos que, em casa, a sua segurança corre, diríamos que ainda é cedo para os benefícios cobrirem e compensarem os males.
Detergentes, pesticidas, raticidas, comprimidos, medicamentos, são apenas alguns dos factores que tornam o ambiente doméstico inseguro e muitas vezes insalubre para a criança mal vigiada.
"Vale mais prevenir do que remediar" - lemos esta advertência em muitos cartazes expostos nos corredores do hospital. De facto, prevenir é a grande regra de segurança e que se opõe ao remedeio. Se evitarmos o acidente e as doenças, vamos poupar horas de trabalho a hospitais e postos de enfermagem, a médicos e enfermeiros - mas até onde vai., na nossa vida quotidiana o conceito de "prevenção"? Será que o exemplo de prudência e profilaxia vem sempre de onde devia vir?
Como falar de "prevenção" quando a resposta para os malefícios do "progresso" industrial é o preço a pagar pelos benefícios a receber? Não se chamará a isto um ciclo vicioso?

DROGARIA CASEIRA

À mão de semear, os cosméticos da mamã podem constituir um perigo para os filhos nas suas primeiras idades.
Como o assunto dos cosméticos tem sido muito agitado ultimamente, vem a propósito uma rápida retrospectiva daquelas informações que neste momento podem ser mais úteis às famílias em geral e às que tenham crianças em particular.
A. propósito de cosméticos deve dizer-se que há já, marginal e sem repercussão pública, um sem número de produtos naturais, inofensivos, criados por adeptos da Macrobiótica Zen em França e que se recomendam a simpatizantes do movimento ou não. Cosméticos simples, sem dúvida, como tudo o que aquela "filosofia" alimentar recomenda, podem talvez estabelecer um correctivo aos exageros tóxicos do consumismo que, neste campo dos cosméticos, exibe todo o mal de que é capaz, e já tem levado a tragédias entre as quais a do Hexaclorofene até não é a única e maior nem será infelizmente a última.
O que os eco-tácticos aconselham, nestas e em outras armadilhas do consumo, é sempre o retorno à simplicidade: o que significa uma reviravolta na nossa mentalidade toda voltada para as inúteis complicações.
Para quê talcos e desodorizantes providos dos mais desvairados bactericidas? - perguntava o semanário «Nouvel Observateur», a propósito da tragédia Hexaclorofene.
Sim, para quê tão caras e complicadas defesas da "higiene corporal", se afinal, à antiga portuguesa, a água e o sabão (e não digo piaçaba ) podem fazer milagres?...
Se queremos viver um pouco mais e um pouco menos em sobressalto, há que conter os ímpetos "bactericidas» do fabricante, sempre pronto a inventar um "novo prodígio da técnica moderna" para desbancar um não menor prodígio da firma concorrente ou fascinar o consumidor. Ao consumidor compete saber, estar educado para se defender. No caso dos cosméticos, é principalmente a consumidora que deve estar alerta e vigiar os rótulos que compõem a sua..."drogaria" caseira: cremes, leites, sabões, pós-.de-arroz, depilatórios, desodorizantes, bronzeadores, vernizes, champôs fixadores.
Sobre a recente portaria que regulamenta a indústria de cosméticos em Portugal, um industrial da modalidade opinou desta maneira:
«Mais do que uma portaria, era necessária uma lei que definisse o que é a cosmética, quem pode ser industrial ou manipulador, e ser muito rigoroso sobre os locais onde se manipula ou fabrica. O pessoal para esta indústria deve ser qualificado, higienicamente formado e consciente."
Digamos que um manipulador de explosivas daria mais ou menos as mesmas regras de prudência e diria pouco mais ou menos o mesmo se o convidassem a falar de segurança na sua respectiva indústria...

Mas voltemos às intoxicações das crianças no ambiente doméstico. É a drª Maria de Lurdes Levy, professora na especialidade de Pediatria do Hospital Escolar de Lisboa, que nos diz palavras bem úteis para nosso e público esclarecimento:
«O número de compostos químicos com os quais o homem se encontra em contacto todos os dias vai aumentando em ritmo vertiginoso.
Essas substâncias, quer sejam produtos industriais, agrícolas, de higiene doméstica ou medicamentos, são cada vez mais numerosos, podendo dizer-se que não há lar onde não se encontrem, alguns desses produtos, destinados aos mais variados fins e sendo muitos deles potencialmente perigosos.
A sua ingestão acidental na criança põe problemas muito difíceis de resolver para o médico que é chamado a intervir em tais circunstâncias.
Segundo Dreisbach, os venenos são classificados em 5 grupos de harmonia com a sua origem:

tóxicos agrícolas
tóxicos industriais
tóxicos de uso caseiro
tóxicos medicamentosos
animais e plantas venenosos"

Diz ainda a Dr.ª Maria de Lurdes Levy:
"Numa época em que os progressos da Medicina, nomeadamente os da Pediatria, conseguiram baixas tão importantes na mortalidade e na morbilidade infantis, o problema das intoxicações acidentais na criança, reveste uma importância que se deve salientar. É um problema actual e sobretudo evidente para os médicos que trabalham em serviços de Urgência.
Em Portugal (Lisboa), sobretudo desde a abertura dos serviços de Urgência Infantis, o pediatra, obrigado a entrar em contacto frequente com estas situações, tomou delas maior consciência.
Assim, em Lisboa, nos serviços de urgência do Hospital de D. Estefânia observaram-se 740 crianças abaixo dos 10 anos, com intoxicações várias, desde 1957 até Julho de 1964 e no serviço de urgência do Hospital de Santa Maria, de Abril de 1961 até Julho de 1964, trataram-se 314 casos de crianças até 10 anos com Intoxicações."
Referindo o aumento de intoxicações na estatística de todos os países, a Dr.ª Maria de Lurdes Levy indicou os factores que condicionam esse aumento:
"1 - 0 progresso industrial e farmacêutico, que ampliou a uma enorme escala o espectro etiológico das intoxicações, lançando para uso do público uma gama cada vez maior de produtos químicos;
2 - A evolução da técnica de apresentação dos produtos, sobretudo dos medicamentos, em embalagens mais simplificadas, ou sob forma , aspecto ou sabor mais aliciantes para os sentidos aguçados da criança, que tem em si intacto o espírito de investigação e o sentido da experimentação. "

(Para dar ao leitor elementos seguros e muito concretos sobre as medidas de urgência a tomar em caso de acidente por tóxicos com crianças, socorremo-nos de um trabalho da Drª Maria de Lurdes Levy apresentado ao Simpósio sobre "Intoxicações Acidentais na Criança", organizado pela Sociedade Portuguesa de Pediatria e que teve lugar em Lisboa em Novembro de 1964.)

É o Prof. Mário Cordeiro que indica ainda outro factor condicionante das intoxicações em flecha: "As sensíveis modificações ambientais que se operaram nos últimos anos na vida da criança, a evolução das suas próprias características psicológicas, reflexo fisionómico do meio familiar e social em que ela gravita."

UM TELEFONO DE SOCORRO

Se a indústria os fabrica é, evidentemente, para bem do povo. A indústria nada faz que seja para mal: bombas ou bombons, acrílicos ou monóxido de carbono, pesticidas ou formicidas, é sempre ao serviço do homem, da civilização do progresso, do futuro. Pelo menos é o que lemos.
Além disso, a indústria pensa em tudo. Na ferida, mas logo no penso para a ferida. E se conseguiu lixívias, anticoncepcionais, desodorizantes de frigorifico (!), enfim, o que se chama por vezes a "ofensiva do consumo" e a que outros preferem chamar "romantismo do desperdício" - logo pensou nos antídotos.
Daí os Centros de Desintoxicação. Pois não é verdade que se inventou também a confissão para aliviar o herege de seus pesados pecados?


Os telefones estão largamente divulgados. Mas nunca é demais tomar nota, meter na carteira ou colar no próprio telefone:
76 11 76
76 77 77
76 34 56
No centro de intoxicações que existe em Lisboa (Av. Elias Garcia, 81) funciona um serviço informativo contra venenos. O único em Portugal. Os Estados Unidos, muito mais tóxicos, necessitam de 400 centros de desintoxicação, e não quer dizer que cheguem.
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(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no semanário «O Século Ilustrado» (Lisboa), 15-9-1973

SURREALISMO 1966

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ALGUNS APONTAMENTOS SOBRE SURREALISMO - AINDA(*)

[(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no suplemento literário do «Jornal de Notícias» (Porto), em 22/6/1967]

15/Outubro/1966 - Inclui cartas, comunicados colectivos, esboços de manifestos, conferências, tábuas cronológicas, reproduções fotográficas, textos polémicos, etc., o volume que Mário Cesariny de Vasconcelos elaborou sob o título de “A Intervenção Surrealista” para a Editora Ulisseia.
Pelo título se poderia concluir que são surrealistas, na opinião do coordenador, quantos ali intervieram umas vezes por influxo da corrente francesa com esse nome, outras vezes sob a pressão de circunstâncias e acontecimentos, quase sempre no desejo de marcar posição em relação a coisas directamente circundantes, adjacentes. Mas que de todo esse heteróclito conjunto de documentos resulte uma unanimidade de propósitos, eis desde logo a questão que se põe, a pergunta que se faz.
Se é certo que cada surrealista entende à sua maneira os dados fundamentais de um movimento que André Breton codificou mas não limitou, é bem possível que a unanimidade tenha de ser substituída, neste e noutros casos, por uma variedade de intentos e de posições individuais que, apesar do grupo (forma-do, a formar-se ou a desfazer-se) não participaram de um propósito colectivo.
Se houve ou não houve tal propósito colectivo, quer dizer, se houve ou não houve surrealismo em Portugal, se as manifestações surtas com esse rótulo podem, de perto ou de longe, aparentar-se com as congéneres manifestações ocorridas em outros idiomas, seria porventura a pergunta que as pessoas interessadas fazem de há muito e que calculavam ir finalmente encontrar respondida no interventor livro de Cesariny.
No entanto, por agora, parece-me mais viá-vel analisar a utilidade da colectânea independentemente de responder a tal pergunta (a que, diga-se já, o livro não responde) e de satisfazer ou não a princípios que, começando por não estar definidos em português, expostos e proclamados, acabam também por não ser da intenção explícita ou implícita do coordenador. Intencional ou não, o coordenador fez deste livro o seu definitivo testamento “em branco” e também, de passagem, o tribunal onde sova os acusados que lhe apetece e solta as iras recalcadas.
Aos absolvidos de tão temível cólera, subentende-se que Cesariny os considera de seu lado, não definitivamente surrealistas, talvez, mas inofensivos à causa. Do resto, não se salva ninguém; aos condenados que serviram de pano de fundo, de alvo e de pretexto para haver surrealismo “à moda de Lisboa”, trata-os o insigne poeta com o sarcasmo, o desprezo, a auto-suficiência que em tal auto de fé se requeriam necessários mas que ele aplicaria com melhor justiça e proveito a outros sectores bem mais acres e culposos. A divisória estabelecida serve para um ajuste de contas quer com os surrealistas que nunca o foram, quer com os que estavam de fora e de-sejaram meter lá o bedelho ou a colherada crítica. A ver isto, “a gente que ainda estava à espera” e, entre essa gente a pessoa con-vidada a escrever sobre “A Intervenção Surrealista” deve pensar três vezes e, se nutre simpatias pelo surrealismo, evitar que o expurguem da confraria; se não nutre, preparar-se para uma saraivada em forma de comunicado colectivo.
Os surrealistas sabem, mas há mais alguém que também sabe: claro que houve aqui para toda a irreverência intelectual, um re-conhecimento tardio, torpe ou ignorante; de tal se podem queixar não só os que Cesariny acolhe sob a sua asa protectora mas quantos não tiveram, porque não quiseram, patrono ou protector, traduzido ou não do francês. Que estamos no País mais anti-poético do Planeta, também me parece e têm razão as investidas que contra académicos e neo-académicos são historiadas, no volume. Que o poeta dificil ou impossivelmente porá pé em ramo verde nesta terra calcina-da por academias que tão poderosas fortalezas erguerem, para seu uso e proveito, - também eles têm razão. Mas só os surrealistas? Só os que sob o rótulo Cesariny congrega? Só os que, não tendo outro lugar comum onde figurar, lhes valeu a amizade do autor de “Pena Capital” para passarem à história e à literatura?
Como, a não ser por favor, se justificariam hoje em letra de forma os destroços poéticos de H. R. Pereira e Pedro Oom, os mais contrários ao conceito surrealista da poesia como oficio da existência, como realização e acto absorventes, como extensão de responsabilidades a todos os instantes e recantos da vida?
Como a não ser por favor, se justificaria a inclusão do texto “Pelaguin”, de Carlos Eurico da Costa, já que por intrínseca qualidade poética em nada se recomenda e muito menos como expressão polémica, crítica ou etc?
Esparsos rascunhos que estavam lá guardados na gaveta, não podem, só porque Cesariny os antologia, porque se incluem de cho-fre numa intervenção chamada surrealista, adquirir magicamente o mérito e representatividade que nunca tiveram nem teriam.
Inversamente, a ter de avaliar o mérito do surrealismo por tais amostras, onde iríamos cotar o surrealismo?
Pretexto para reunir algumas brincadeiras de alguns jovens que depois arranjaram mais que fazer e se marimbaram na poesia, não teria o Poeta Mário sido logrado no seu propósito e traído por excessiva boa fé?
Do surrealismo cada um abichou o que lhe apeteceu e calhava. Agora, incluído entre os ortodoxos, possivelmente até já nem se lembrava. A quem vier depois, (a quem “ainda estava à espera”) e se queira servir do livro para instrução, escusado será repetir que pouco mais lhe acontece do que ver frases, abaixo-assinados, car-tas pessoais (com os rancores sine que non), esboços de poemas, esboços de ideias, esboços de intenções, esboços de esboços, e uma tábua de datas a servir de memorando.
Nunca os surrealistas chefiados por Cesariny quiseram saber de quem os entendesse, embora os víssemos iradíssimos sempre que os não entendíamos. Nada adianta portanto ao esclarecimento (embora adiante muitíssimo à alegre confusão que a tantos agrada) do surrealismo ou de algo que esteja fora e além dele, o caderno de equívocos, ambiguidades, boca-dos de bocados de afirmações ( o fragmento do fragmento, tão famoso e que tanto serviu para desculpar consequências como inculpar causas), insinuações com aparência de profundas - eis a que se resume, em balanço afinal, “A Intervenção Surrealista”.
Levemente irritante é a tendência do surrealismo ali com-pilado para não selectivar os alvos dos seus remoques. Indiscriminadamente se atiram ao péssimo e ao mau, sem se preocuparem em atingir os pontos-chave da Abjeccção e declarando-se lesionados quando alguém os chama pelos nomes. Com enorme berreiro, já não querem outra coisa, já não elegem outra luta. Bem podiam ter ocupado o seu (deles) tempo com coisas diferentes das zangas e zaragatas pessoais. E talvez ninguém fosse ao ponto de lhes pedir virtudes tão vulgares como um pouco de inteligência ou de compreensão crítica, se eles não tivessem, sempre aflitos, procurado uma tão decantada intervenção nos negócios da cidade e desejado fazer-se, a todo o transe, homens atentos à história, presentes na circunstância, íntegros e vertioais, antes quebrar que torcer, etc., etc.
A pretensão de dizer o que nunca foi dito com palavras que nunca foram escritas — preocupação central, ao que consegui perceber, dos diligentes textos redigidos por Cesariny - admite-se, creio eu, como toda a expressão ou voz poética, enquanto forma única de dizer o indizível, admite-se para usos e abusos de imaginação criadora, admite-se como disposição prévia convencionada para se enfrentarem as “vozes do silêncio” de que os poetas são os porta-vozes. Mas quando se trata de manifestar, de escrever textos para agir em concreto, de falar para intervir, - para defender dos fariseus o “dourado” património — entender-se-á porventura o uso da cifra hermética, da esotérica palavra e da iniciática visão para iniciados?
A avaliar pelas actividades surrealistas do Café Gelo, nada restaria a um poeta, além de cantar e desistir. Também da presente colectânea se não avista para a alternativa - poesia ou po-lítica - uma saída. E essa saída (seriam os surrealistas os primeiros e últimos a sabê-lo, se fossem de facto surrealistas) existe, pode ser compreendida dentro das limitações conhecidas. Ao surrealismo - segundo o que pode apurar-se destes confusos textos - nada
mais resta do que um resignado regresso a duvidosas fontes ocultistas. Aí pretende imitar a rábula dos que em França tentaram reatar tradições de épocas soterradas não apenas como curiosidade teórica mas como prática quotidiana.
Dentro da História que é a nossa, as mágicas desse estilo são não só impossíveis como suspeitas: a fuga à Abjecção por ignorância dela é uma forma mais ou menos triste de colaborar com ela e só uma via que a tome por termo de oposição constante - a via abjeccionista - deixa de .ser menos que utopia e mais que escapismo.
Da via abjeccionista, entretanto, está Cesariny decidido também a tomar o monopólio como se as palavras e o que elas significam pertencessem a pessoas ou grupos de pessoas! Pal-mar também o abjeccionismo (como fizeram para o surrealismo) com fins esotéricos, parece-me abusivo, tanto mais que a posição abjeccionista - uma vulgaríssima filosofia da História como qualquer outra - se distancia bastante dos optimismos surrealistas (jamais ceder ao cor-de-rosa seria o que de melhor nos ensinaram os “transfugas” do surrealismo).
Fiquem-se estes surrealistas, pois, já que teimam, a produzir textos “originais” para si mesmos, sem termos de ligação que os prendam à realidade histórica, à vulgaridade quotidiana; fiquem-se a imitar truques zénicos respondendo alhos a bogalhos e julgando assim que estão a intervir; fiquem-se nas pequenas manobras publicitárias; fiquem-se hipocritamente puristas num mundo corrompido, cinicamente convencidos de uma exclusividade poética, de um satanismo barato, de uma predestinação de iniciados; fiquem-se, enfim, a ruminar para si mesmo (à custa do surrealismo que pouco tem a ver com isso) enquanto o apodrecimento à sua volta não diminui nem aumenta; fiquem-se a escrever em cursivo pena de pato as belas palavras - Poesia, Liberdade, Amor; fiquem-se enfim com suas artes e letras. “A gente que ainda estava à espera” - finalmente - é que deixou definitivamente de estar à espera.
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(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no suplemento literário do «Jornal de Notícias» (Porto) , em 22/6/1967
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ABJECÇÃO 1971