12507 caracteres - 4 páginas - marta-1> chave ac para et (entrevista-testamento)-13824 bytes 21-5-1997RESPOSTA AC ÀS PERGUNTAS DA MARTA LEANDRO PARA A REVISTA «FORUM AMBIENTE»
1 - - Foi um dos fundadores do MEP(Movimento Ecológico Português), nascido em 75, e acabou por ser visto como «enfant terrible» do ecologismo português, mas entretanto abandonou a «causa verde». É hoje um «ambiento-céptico»?
1 - Aquilo a que chama «causa verde» é que, pelos vistos, me abandonou. Desde que o Ambiente começou a dar lucro, dispensaram os meus préstimos, serviços e «know how». De vez em quando lembram-se de mim - especialmente sociólogos e etnólogos - para me perguntarem se ainda detenho aquela fabulosa documentação que fez da «Biblioteca para os Tempos Difíceis» uma das melhores da Península (depois do centro do México de Illich e depois da biblioteca do meu particular amigo José Carlos Marques). Mas, na maior parte dos casos, todo esse background informativo já foi, ou para o lixo, ou para as instituições de caridade (que o queimam no Inverno para aquecer os velhinhos sem lar), ou para o meu amigo Carlos Filipe Marreiros da Luz, de Portimão, que fez o favor de acolher dezenas desses caixotes com informação ecológica.
Nestas alturas de balanço, em que se dá volta à casa e só se encontra pó, cinza e nada, regra geral diz-se mal dos governos que não apoiam iniciativas tão lindas como foi o Movimento Ecológico Português, ou o Grupo Coordenador de Paço de Arcos. Mas os governos existem exactamente para não apoiar o que deviam, senão não eram governos, eram uns pelintras como eu, cuja dedicação àquilo que chama «causa verde» me leva a que seja o único jornalista português sem automóvel.
Quando vejo os meus colegas olharem para mim com um misto de comiseração e dó, acho de facto que me enganei na agulha, quando, em 1969, publiquei, nos «Cadernos do Século», o primeiro livro sobre ecologismo que apareceu em Portugal ou quando, em Fevereiro de 1975, fui ao décimo cartório notarial de Lisboa, com mais 5 amigos, para registarmos os estatutos do MEP. Sigla e nome que, anos mais tarde, quanto o ambiente começou a dar lucro, os camaradas do Partido Comunista nos roubaram sem aviso prévio e sem sequer dizerem «lá vai assalto».
Detesto rememoriar estas tolices, pois até parece que estou ressaibiado, quando na verdade estou reconhecidíssimo a toda a esta gente. Se não fossem esses e outros que andaram sempre a chular-me as ideias e a chutar-me de todos os sítios e lugares onde quer que se possa ter um cagagésimo de Poder, eu não tinha chegado, em Março de 1992, aos 59 anos, ao Etienne Guillé, meu clarão de Damasco e, entre outras coisas, autor de uma Ecologia Alargada como sempre a entendi, no meio dos naturais e inevitáveis mal-entendidos com todos em geral e com os que se dizem ecologistas em particular.
2 - Apesar da amargura que se pode depreender das suas palavras, sei que se tornou um optimista. Ao trocar o efémero da Ecologia - efémero porque a destruição ecológica põe em causa a continuidade da Terra - ganhou a certeza da eternidade?
2 - Sem regresso às fontes do sagrado, continuaremos a beber na fonte do Chafurdo que é toda a civilização ocidental, último estertor de uma Era zodiacal particularmente macaca que foi a Era dos Peixes.
Agora que mudámos de Era - em 26 de Agosto de 1983, ao meio dia - eu pergunto-me o que é que andamos aqui a fazer, a fingir que somos isto, aquilo ou aqueloutro. A única coisa a fazer é fitar de frente a Eternidade, como faz a Esfinge, e saber que os pontos cardiais são agora outros. E que temos o Paraíso (inclusive ecológico) nas nossas mãos e ao dobrar da esquina.
O único obstáculo é que o Mundo dos três M (Merda, Morte, Mentira) continua a ser rentável para muito boa gente, especialistas, grupos, ciências, indústrias, pelo que vai demorar um tempo até que um universo estruturado e programado pela Era zodiacal do Aquário, uma das mais sublimes que o Cosmos já emitiu, possa emergir.
A Ecologia redutora e reducionista dos actuais grupos e militantes não leva em consideração esse macro-ambiente que é o canal cósmico que nos estrutura o ADN da célula e provoca a nossa alquimia de base. Ecologia sem alquimia e as restantes 12 ciências sagradas, deixou de me interessar. Ecologia planetária é um acidente, o Planeta terra é um acidente geográfico, e a quem mitifica a Mãe Terra eu gosto de dizer que me apetece mais chamá-la de megera. O telurismo cansa-me. Ou levamos em consideração a nossa dimensão de seres humanos, entre o infinitamente grande e o infinitamente pequeno, ou andamos a perder o nosso rico tempo e a fazer perder o dos outros.
É a reflexão possível aos 64 anos. E o que me dá mais pena nos jovens é não poderem perceber, aos 20, o que é isso de ter 64 anos. Tudo se relativiza, quando caminhamos, através da noite, para a Claridade do outro lado.
Sabe que o chamado «Livro dos Mortos Egípcio» (um dos meus livros de cabeceira) se intitula afinal «Abertura à Iluminação»?
2 - - Depois de tantas batalhas travadas e escritas, porquê mesmo assim um silêncio tão sepulcral? Já não vale a pena defender o Planeta?
2 - Gosto do «silêncio sepulcral». Um dos dossiês que ainda não rasguei, tem por fóra o rótulo «Silêncios & Silenciamentos», ou seja, guarda os «temas malditos» que, através dos anos, foram silenciados ou caindo no esquecimento. Quer no lado da Entropia (o que chamo de tecnoterror industrial), quer no lado da Neguentropia (o que chamo de tecnologias eco-alternativas), os silêncios são mais que muitos. O sistema que vive de ir matando os ecossistemas tem um aparelho de contra-informação bem montado. Mas eu acho que as pessoas - dando audiência às televisões e comprando o papel dos jornais - têm os silêncios, a desinformação e a contra-informação que merecem. Estamos, não esqueça, na Era do Virtual e ninguém como Baudrillard, num livrinho precioso sobre «simulacros», terá teorizado tão bem esse virtual. De que a informação Internet é apenas um dos tentáculos.
Que jornais e telejornais ajudam muito a silenciar as questões decisivas para o futuro do Planeta e do ser humano, é um facto. Contra o qual não tenho nada, além de pura e simplesmente não aderir. E de me estar nas tintas para os destinos do Planeta e ninharias semelhantes.
Considero que a democracia criou os seus fascismos peculiares e que o homem dimensional de Marcuse atingiu, também entre nós, a perfeição. Viva o mundo tolatitário, pois!
3 - Tornou-se ao mesmo tempo um crítico das associações ambientalistas da actualidade, as mesmas que directa ou indirectamente ajudou a criar. Como é que isso aconteceu?
3 - Houve um tempo do movimento ecologista, de pendor anarquisante, em que toda a gente criticava toda a gente. É uma forma de expressar o desespero de não se poder agir verdadeiramente pelo que supomos verdadeiro e justo. Aliás, de todos os desperdícios que se produzem nesta sociedade de consumo («do luxo e do lixo», como a baptizei) o desperdício de palavras, de tempo, de energias é um dos que mais me horripilam hoje. Quando os jovens de hoje tiverem os meus 64 anos vão compreender porquê. Uma das campanhas em que, desde 1975, me empenhei - um Programa Nacional de Reciclagem Sistemática - depois de ser ignorada acabou por ser recuperada por algumas autarquias, que recebem em troca fundos e mais fundos comunitários, preço a pagar por todos os progressos que a Europa nos irá cá metendo como quem enfia um supositário delicado.
4 - A Ecologia deixiu de ser um ideal para se tornar um folclore?
4 - A ecologia tornou-se no que o próprio sistema quis que se tornasse, por mais que alguns grupos ecologistas andem a fingir independência. Um dos que melhor fingem é o «Green Peace». Uma vez que os problemas ecológicos só podem ter solução, mudando de sistema - e ninguém quer nem pode mudar, porque vive dele - é evidente que só podem subsistir na base do folclore para atrair militantes.
As verdadeiras questões da crise ecológica não só não são atacadas como irão agravar-se, através de secas e dilúvios, as duas faces da mesma realidade: a alteração deliberada e provocada dos climas.
5 - O progresso tornou-se no anti-progresso? E este percurso seria evitável?
5 - O percurso actual nunca poderia ser evitável. Desde os anos 70 que patetas como eu vinham dizendo que ou se mudava tudo ou tudo seria irreversível. Ninguém mudou nada. Só que já dava para governos e poderes tomarem juízo, mas nada indica que isso aconteça. O discurso sobre o delírium tremens das autoestradas, sobre a lepra de Alqueva, sobre o cancro dos gasodutos, sobre a megalomania de todos os projectos megalómanos e assassinos, diz-nos que políticos e economistas vão continuar a piedosa obra de destruição que com a industrialização têm emprendido.
Os chamados «estudos de impacto ambiental» com que todos (incluindo ecologistas) enchem a boca, são uma boa anedota, ou uma boa «história para camelos», como gostava de dizer o meu ex-director Rudolfo Iriarte.
Progresso, para mim, só tem sentido o «progresso do ser humano enquanto ser humano», capaz de desenvolver as suas potencialidades divinas. Os chamados progressos do desenvolvimento sempre tive o cuidado de lhes chamar «retrocessos». E acho que tenho razão.
Portugal 96 está em retrocesso acelerado para o abismo. Mas não sou eu que vou mexer uma palha para o impedir. Quando os senhores do Governo quiserem um consultor ecologista, terão de me pagar à hora e a preço de ouro. O que tinha a dar a este País já dei e acho que dei de mais.
Se quiserem continuar a correr para o abismo, corram e que lhes faça muito bom proveito.
6 - Quando era militante ecologista, gostava de ser referido como «anarca não-institucional». É vegetariano, não usa elevadores , não fuma, não anda de carro. A ecologia é também anarquia?
6 - Sinceramente não me lembro dessa do «anarca não institucional» mas se a Marta o diz é porque foi. Hoje prefiro ser conotado com a extrema direita e dá-me certo gozo pensar que, ao pé de mim, o Paulo Portas é um perigoso esquerdista.
Aliás, a questão dos rótulos que nos colocam é daquelas coisas que ontem me irritavam e hoje me divertem. Há grupos especializados a criar a imagem deste ou daquele elemento mais indigesto ou incómodo. Um labéu que convém muito é o de «gajo mal disposto»: sempre que, numa situação de opressão, alguém refila ou protesta, é porque tem maus fígados. Ditadura e democracia têm alimentado até à perfeição este tipo de hipocrisia, que na política se chama demagogia e nos ex-comícios de esquerda se chamava provocação.
No fundo, os «sapos vivos» que nos condenaram a comer, antes e depois do 25 de Abril. Já os digeri e a minha capacidade para continuar, no dia-a-dia a dia jornalístico, a digerir estes sapos, é posta à prova. Se ainda não morri e continuo disposto a viver mais 64 anos, o melhor é mesmo tirarem o cavalinho da chuva. O que não mata, engorda.
6 - Na sua obra «Ecologia e Luta de Classes em Portugal», considera o ruído, tal como a publicidade, o tráfego automóvel e o consumo medicamentoso «crimes insidiosos» porque «se tornaram familiares e criaram, como qualquer outra droga, habituação. Daí até à naturologia foi um passo?
6 - Não renuncio a uma linha de tudo o que escrevi e publiquei (e escrevi demais), mas é evidente que acho essa nomenclatura do «crime» um exagero e só própria dos auges gonçalvistas revolucionários.
Sei que me recriminaram sempre a violência da linguagem, mesmo os meus amigos mais próximos como o José Carlos Marques ou o Carlos Filipe Marreiros da Luz. Ou o Prof. Gomes Guerreiro ou o Prof Delgado Domingos.
Dei-lhes sempre razão mas a única maneira de escapar à violência da linguagem para expressar a violência do ambiente, era calar-me. Calei-me, com proveito para todos.
E agora só a Marta me faz falar. Sem recidivas.
Termos que também me fazem um bocado de brotoeja são os de «vegetarianismo», «naturismo», etc, pois servem à maravilha para fazer cair no ridículo os menos simpatizantes da medicina oficial como eu. Não sou mesmo nada simpatizante, mas também não quero que me crucifiquem por isso. Calma aí, senão vou queixar-me ao Padre Milícias, franciscano como eu fui, quando soube que o santo de Assis fora o primeiro ecologista da Europa pré-industrial...
O que eu sempre referi foi a Ecologia Humana, ou seja, a Holística, ou seja, as tecnologias ecolternativas à medicina.
Foram 30 anos de «silêncio sepulcral» à volta desta minha ecomania. O que só prova que todo o mundo estava certo e só eu estava, estou e continuarei errado.
Valeu-me, para companhia nesta solidão, a descoberta do Taoísmo (um maravilhoso sistema de Neguentropia energética), do budismo tibetano e, desde 1973, o Etienne Guillé, o maior sistémico que conheço, entre o Céu e a Terra.
7 - O pêndulo, a radiestesia e as medicinas alternativas com base na auto-diagnose e auto-cura são hoje o seu mundo. A naturologia pode ser uma boa filosofia de vida para toda a gente?
7 - Agradeço ter concedido em fazer-me essa pergunta. Quando hoje falo do pêndulo de Radiestesia, sinto-me tal e qual como nos anos 60, a falar de Ecologia: ou seja, sinto-me a falar pró Boneco. Mas hoje ainda mais do que ontem. Porque a informação quântica simbolizada pelo Pêndulo de Radiestesia ultrapassa de tal modo o quadro actual das nossas referências, que de facto vamos viver ainda muito tempo uma conversa de surdos.
Se quiser resumir numa palavra o que hoje me interessa sem escandalizar os bem-pensantes e os polícias do pensamento, é a palavra «Energia(s)». Ler e compreender as energias, acho que foi isso, sempre, o que me mobilizou as energias e o pouco entusiasmo que fui pondo nas coisas.
Hoje posso dizer que, sobre energias, já não tenho crenças (há um mercado de crenças, hoje, no mercado das energias, como sabe), tenho apenas CERTEZAS, poucas mas boas.
O que me leva a trabalhar com o Pêndulo de Radiestesia as 48 horas do dia (disse 48, não disse 24). O resto, de facto, é lixo. Não reciclado.
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