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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-06-15

INFERNO 1958

1-2 - 58-06-15-ls> = leituras selectas - cesbron-1>

O OUTRO DEVER(*)

(*) Este texto de Afonso Cautela terá sido publicado no quinzenário «A Planície» (Moura), 15-6-1958

À loucura do padre Pedro, que podemos presenciar ao longo deste livro de Gilbert Cesbron (1), lembrou-se a edição portuguesa de juntar um sensatíssimo texto de Voillaume, certamente para impedir que os leitores se assustassem demasiado.
Voillaume é uma voz idêntica a algumas que, no contexto, ajuízam, do alto da sua comodidade, sobre o santo heroísmo do padre Pedro. Mas o que nele há de louco, heterodoxo e até de herético, e lhe confere, precisamente, a auréola de santidade, não o podemos varrer da memória, venham quantos Voillaume vierem a deitar água na fervura.
O que deste livro admirável podemos colher é que não basta estar, como o director da fábrica que recebe Pedro, o padre-operário, «certo de cumprir o seu dever». Porque o dever de Pedro, o dever de quem soltou as amarras do porto seguro e, por amor de Cristo, se meteu na tempestade, o dever que a nossa consciência desperta e liberta nos ensina e nos ordena é o Dever Maior, o de uma responsabilidade e exigências maiores.
O dever para Pedro não era o de se «arranjar», porque ele sabia e dizia: «se é preciso arranjar-me, temos que nos arranjar todos». Por isso abalou da sua casa, da sua tranquilidade, da paróquia onde apenas teria missa aos domingos e baptizados de primeira classe... « A linha de maior alegria estava no sofrimento dos outros».
Como o filho pródigo tradicional pôde, porém, regressar à casa e à classe de onde partira, já em cheiro de santidade. Nascera operário e o dever que o chamava nada mais fez do que completar a vocação de padre-operário que no bairro miserável de Sagny abriria caminho à luz e à cruz de Cristo. Mas o filho do meio burguês será o filho pródigo sem regresso, aquele que partiu e nunca mais poderá voltar, aquele que Gide evocou, preludiando uma das mais dramáticas encruzilhadas do nosso tempo, no Retour de l'Enfant Prodigue. Enquanto o padre Pedro regressa, não poderá regressar aquele que renunciou à classe onde nasceu, quando a missão que o chama está na classe em luta aberta com a sua.
É preciso, frente a este livro corajoso de Cesbron, compreender o «drama de classes» vivido por uma juventude onde a fome de heroísmo e a fraternidade é maior do que se pensa, porque a vileza da sociedade a oculta, ridiculariza ou mata.
Saídos de uma família com as exigências espirituais comuns à classe, o ideal destes jovens não fica obrigatoriamente prisioneiro da mediocridade circunjacente. Acossado, repelido, perplexo, surpreendido e incompreendido, o jovem encontrar-se-á naquela terra de ninguém, onde não sabe nem pode escutar ninguém e onde ninguém o escuta. Sobre as fossas de sangue que separam os homens, sobre as muralhas de hostilidade que dividem classes e mundos sociais, tenta lançar a bandeira inquietada da cumplicidade. Quantas vezes, oriundas de todas as pessoas felizes e sensatas que o rodeiam, a pobre vítima não ouvirá intimidações como estas: «Isso há-de passar com a idade». «O menino é louco. Pense antes nos sacrifícios dos seus pais para fazerem de si um homem».
Ao mesmo tempo acodem-lhe as palavras de Corção, que conseguiu ler às escondidas da família: «Contanto que se bata e morra pela única causa que não pode perder sem deixar de ser burguês: o seu critério de vitória, o seu culto do sucesso e do prestígio».
Que nenhum pai queira modelar um filho à imagem e semelhança de si próprio. Que nenhum pai julgue fazer a felicidade de um filho, tutelando-o com um jugo onde se atiçam preconceitos de classe e casta. Não pode haver felicidade na vocação frustrada. E a uma carreira de triunfos, deve o pai certificar-se se o filho não preferirá uma outra, de riscos e perigos, ciladas e alçapões, missão e pobreza voluntária. É preciso dizer aos pais, cegos de amor pelos filhos, que há, que pode haver para eles maior glória do que o triunfo, do que o dinheiro, do que a profissão rendosa, do que um lugar egoísta na sociedade.
É preciso dizer aos pais que o dever nem sempre é conforme em geral uma falsíssima moral do trabalho o prescreve, nem se circunscreve aos sucessos escolares, na profissão e na carreira. É preciso gritar-lhes: - O teu filho não falhou. Pode haver luz (a luz da vocação realizada) nos caixotes do lixo sociais onde julgas que o teu filho desceu. E quem sabe se o renegaste por isso!
De qualquer maneira, se ele abalou, é tarde. O filho pródigo não voltará, porque tem fechado o portão de ferro que nunca cede: a classe. A partir de há muito que o exilado apenas consigo conta. Se procurou ainda a conciliação dos monstros, acabou por ver a desigualdade da luta. No meio, ele é apenas a vítima. Estava a tempo de voltar, podia ter calado dentro de si a voz da vocação, podia ter crucificado Cristo sem lhe dar ouvidos, calado todos os apelos que o desnorteiam e endoidecem. Não lhe faltaram as relações familiares e de amizade, a escola e os livros para o demover. Mas mais forte do que a inércia, do que a sensualidade e o mundanismo, do que a corrupção e a futilidade, foi a chama íntima que nele crepitou. A corrente da verdade partiu a corda podre da mentira. Proibiram-no de ler o Bernanos do Diário de um Pároco de Aldeia, o Coccioli de O Céu e a Terra, o Kazantzaki de O Cristo Recrucificado, o Cesbron de Os Santos Vão para o Inferno, e o Gorki de A Mãe, livros heróicos, livros de redenção, livros de libertação; mas esses poucos conseguiram vencer toda a literatura burguesa de abdicação, conformismo e mudez.
Cristo entrou a jorros pela sua janela de menino-família. E ele será, como Bernanos, como Coccioli, como Kazantzaki, como Cesbron, como o Padre Américo, como o Padre Joaquim, um dos acusadores da sociedade que escorraçou Cristo e diariamente o recrucifica.
O apelo de Cristo será mais forte do que as algemas do hábito, dos interesses de classe, do que a rotina, do que a inércia. Cristo vivo acordou nele, Cristo será mais forte do que os afectos de família. É preciso repetir ao pai:
- O teu filho não traiu. Quiseste-lo tranquilo e feliz e rico, mas ele abalou, ao vento e ao frio, a beijar na boca a adversidade, a pobreza, talvez a ignomínia. Cumpriu. Cumpriu o Dever.
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(1) Os Santos Vão para o Inferno, de Gilbert Cesbron, tradução portuguesa de Xavier Coutinho, Porto, 1958 (3.ª edição).
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SILÊNCIOS 1980

80-06-15-ecc> = ecos da capoeira – os silêncios que falam – os dossiês do silêncio – inédito ac de 1980 – devo ter enviado ao deodato para «barlavento»

OS SILÊNCIOS DA DEMOCRACIA

15/6/1980 - Com tantos órgãos de comunicação social, deputados, conselheiros da Revolução, Governos, os portugueses nunca andaram tão bem informados como agora.
Não há dor de barriga (ou de dentes) que aconteça a político ou desportista que não ressoe por montes e quebradas, até às serranias do Nordeste transmontano, às penedias alentejanas de Elvas, Portalegre e Monsaraz, ou aos descampados raianos da margem esquerda do Guadiana.
Já não se pode dizer que a Imprensa e restantes “mass media" ponha o mesmo zelo em informar São Bento, Belém e o Bairro Alto do que se passa naquelas zonas distantes deste pequeno País. Mas, pelos vistos, grande demais para a Imprensa que tem.
Por exemplo: no Pomarão, afluente do Rio Guadiana, "consta" que os espanhóis estão construindo portentosa barragem. "Consta" também que houve em tempos um "acordo" luso-espanhol que daria as águas do Guadiana ao aproveitamento dos portugueses. Como - também consta - Alqueva não anda nem desanda, eis que os "hermanos" espanhois - também "consta" - avançaram em beleza para aquilo que o "Jornal do Algarve" (Junho de 1980) classificava, extasiado, de grande empreendimento "na mira do progresso":
“Grandes torres de alta tensão erguem-se, qual gigantes estendidos ao céu".
Violentamente emocionado, "Jornal do Algarve" logo acrescenta:
" Casas constroem-se. Caminhos novos rasgam os montes".
Mas como tudo decorre no "consta", no silêncio (dos deuses) dos espanhóis, e o Governo tem mais que fazer do que preocupar-se com estes incidentes-fronteiriços, o "Jornal do Algarve" insurge-se, convidando os algarvios a "bater o pé", " a exigir que se façam negociações" e "que se veja até” que ponto estão os espanhóis a ir."
Peremptório, o semanário de Vila Real de Santo António quer saber até onde vai aquele empreendimento do Chança, que conhecimento do que ali se prepara tem o Governo português, como se integra aquele empreendimento nos acordos estabelecidos com o nosso país..."
Governo ocupado, deputados ocupadíssimos, grande imprensa não se fala, Conselho da Revolução só marcando consulta, claro que ninguém vai ocupar-se desta e de outras ninharias que afectam o povo deste País.

AGUIEIRA: OUTRA NINHARIA QUE DEU BRADO

Pertence ao domínio de caricatura bordalesca , o que se (des)disse da Barragem da Aguieira, no Mondego, confluência com o Dão.
As notícias contraditórias ora davam como beneficio o que era calamidade, ora davam como calamidade o que era o paraíso para os agricultores ribeirinhos, de repente com as terras alagadas.
Os Serviços Hidráulicos guardaram-se para melhor oportunidade. Conferência de imprensa é só quando algum senhor importante sente os calos pisados, ou quando se trata de anunciar "grandioso empreendimento".
Para explicar como e quando vai ser alagada a albufeira da Barragem da Aguieira, cada um disse a sua e foi um ver se te avias.
Resultado: impossível hoje, pelas notícias que saíram , saber como vai a Barragem da Agueira, que espécie de impacto vai ter, que reflexos e resultados terá na agricultura regional.

INSTITUCIONALIZAR O SILÊNCIO: A DEMOCRACIA CONCENTRACIONÁRIA

Há silêncios pesados, prolongados, suspeitos. Podres.
Se duram muito, a Democracia oscila. E quanto mais duram, mais a Democracia oscila.
Se há canais por onde devem ser dadas as informações que devem ser dadas, convém que os advogados da Democracia, sempre tão preocupados com a sua saúde e bem estar, informem mesmo. Ou que veladamente não ameacem quem pretende informar porque inclusive é essa a sua profissão.

MISTÉRIO DOS «LARANJAS»

Mistério a que igualmente só se conhece a cor, é o dos famigerados "laranjas". Já nem os mortos, agora, são noticiados. Passou-se à fase perfeita : a rotina.
Institucionalizado o caos e desde que o acidente (al) se torne sistemático, deixa de ser notícia. Passa ao campo santo do silêncio (fúnebre). Lembram-se das três linhas para os soldados mortos em Angola, Guiné, Moçambique?...
Cruzes, cruzes, muitas cruzes, em vez de informação, para santificar os mortos. Mais mortos por "laranjas" que importância tem isso, se até já não 4" novidade? Se já deixou de ser noticia? Se já entrou na rotina?
Antes e depois do 25 de Abril, sempre que o silêncio se institucionaliza, passamos à fase da "democracia concentracionária". E os advogados, pelo seguro, vão indo de férias, que a vida são dois dias e o Verão no Algarve uma frescura.
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PILATOS 1983

83-06-15->

AGENTES QUÍMICO-MEDICAMENTOSOS CAUSADORES DE DOENÇAS

15/Junho/1983 - À medida que se caminha na pormenorização das causas que produzem determinadas doenças, o médico fecha-se ao diálogo. No final da conversa [com o jornalista] o médico permite-se mesmo alvejar o interlocutor, se este foi crítico e não se deixou enrolar pela sofística médica, com este comentário irónico: «A sua angústia em querer saber as causas não pode ainda ter, neste momento, uma resposta da ciência». Ponham-se aqui os pontos de espantação necessários e suficientes a este manso dislate.
Subentende-se que a palavra «angústia» estará na sua mente médica associada à palavra «metafísica» e que esta tem portanto para si um sentido pejorativo. Filosoficamente falando, os médicos mais eruditos estão no positivismo de há cento e tal anos. «Angústia», no entender irónico deste especialista, é querer saber as causas e não se contentar com a exposição consumada dos efeitos. A tal «angústia», porém, deve-se no entanto todo o ímpeto investigador dos celebrados cientistas e da celebrada ciência através da história, nos tempos em que investigador e cientista queriam evidentemente dizer alguma coisa. Mas o investigador ou cientista como indagador de causas está hoje, pelos vistos, travestido do seu oposto: o explorador dos efeitos sem jamais indagar das causas. Por isso um médico ilustre considera angústia ir às causas da insuficiência renal crónica.
Foi indisfarçável também, nesta conversa com um eminente nefrologista, que quanto mais soubermos das causas da insuficiência renal crónica menos hemodialisados haverá. E um médico, por mais humanista que seja, é sempre mais amigo da clínica que dirige ou na qual trabalha. É humano. Mesmo remota, a hipótese de o número de hemodialisados vir a descer, é desconfortável para as clínicas de hemodiálise que tanto dinheiro custaram a instalar. (Sejamos humanos e compreendamos.) Ora uma análise das verdadeiras causas da insuficiência renal poderia fazer com que esse número descesse perigosamente...
Portanto e em vez de um claro «despiste precoce» - como dizem por dizer os médicos - o que temos, na prática, é uma nebulosa, ambígua e abstracta predisposição para não referir os principais «culpados» da insuficiência renal crónica que são evidentemente os medicamentos. Remetendo a doença para o poço sem fundo das causas «congénitas» ou hereditárias, boa desculpa de todo o culpado, a medicina lava daí as suas sujas mãos.
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Em Novembro de 1974, estudo realizado pela Universidade de Florida, indicava que analgésicos de venda livre representam um dos causadores mais frequentes de efeitos «indesejáveis». De acordo com o estudo publicado pelo jornal da Associação Americana de Medicina, sobre mais de 6000 doentes admitidos no decurso de três anos, 2,9 por cento sofriam de enfermidades provocadas por medicamentos. Em segundo lugar vinham os antibióticos. Ao todo, estavam implicadas 109 drogas farmacêuticas.
Em Novembro de 1979, a OMS salientava que os perigos inerentes à vacinação antivaríola, podem ser hoje maiores do que os perigos específicos da doença. A encefalite pós-vacinação era apontada pela OMS como um desses perigos.
Em Agosto de 1981, relatório publicado pelo centro da ONU sobre empresas multinacionais, refere efeitos «posteriores»[a posteriori] de:
-hormonas sexuais sintéticas no Brasil
-pesticidas no Egipto
-sementes tratadas com fungicidas à base de mercúrio na Guatemala, Iraque e Paquistão
Em 1973 era levantada publicamente a questão dos efeitos provocados sobre a saúde pública pelo pó de alcatrão que os pneus revestidos de cravos - usados nos pisos de estradas com neve - provocariam no aparelho respiratório dos automobilistas e da população em geral. O Dr. Serge Neukomm, director do Instituto Universitário de Medicina Preventiva e Social de Lausana efectuou uma série de experiências para provar o risco existente nesse pó de alcatrão. Pôde provar-se que o pó continha hidrocarbonetos policíclicos como o 3,4-benzopireno, de natureza cancerígena reconhecida há muito tempo.
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ECO-DIAGNÓSTICO 1983

83-06-15-eh>ambpat>silenc> manifest> - mein kampf 15/junho/1983

SINTOMATOLOGIA E CAUSALIDADE - O TABU DA ECOLOGIA HUMANA

15/Junho/1983 - Tema-tabu, como logo se compreende, é o que relaciona doença e meio ambiente. Denunciar as doenças produzidas ou fabricadas pelo Ambiente, é denunciar o Ambiente e todas as componentes políticas, económicas, ideológicas, culturais, que o constituem. Denunciar o ambiente, através das doenças por ele provocadas, é pôr uma alavanca por baixo da engrenagem para a fazer saltar. Apontar a causa dos efeitos (a que chamam sintomas, ou doenças) equivale a apontar o «criminoso» ou «inimigo» principal.
Reforça o carácter tabu deste tema o facto de a maior parte dos «escândalos» no âmbito da chamada saúde pública e/ou segurança quotidiana, ocorrerem, não em casa, não na rua (apesar do contingente de mortos e estropiados das estradas) mas nos locais de trabalho, ao ponto de se poder concluir que as principais doenças não são só doenças do Ambiente mas doenças do trabalho. Ao ponto de se poder concluir: o Trabalho é a (principal) doença. Por antonomásia.
É óbvio como este pressuposto abala os fundamentos de todas as ideologias políticas, estruturalmente neo-esclavagistas, baseadas na religião do trabalho e, algumas, na do proletariado.
Analisar as doenças do Ambiente é ainda pôr em causa as indústrias médicas e paramédicas que vivem (e lucram) exactamente com a prorrogação - exponencial - da causa, o ambiente, que persiste enquanto não for erradicado. Para que o combate ao sintoma, para que o combate à doença «progrida» sempre, fazendo que «progridam» clínicas, cirurgias, farmácias, laboratórios de análises, multinacionais, etc., a concepção oficial e única admitida, única adoptada, só pode ser a concepção sintomatológica da doença, e não a causal ou ecológica.
É evidente que todo o sistema médico, construído sobre a necessidade crescente de haver cada vez mais doentes, não poderia sobreviver, com a complexidade que alcançou, se a tendência se invertesse e em vez de mais, cada vez mais doentes, como actualmente acontece, houvesse menos, cada vez menos. O mundo é um hospital, com porta de saída para o cemitério, não porque a medicina não queira ou não saiba fazer diminuir aritmeticamente a doença, mas porque a sobrevivência do sistema depende do crescimento exponencial da doença.
Ora ao ligar a doença com o ambiente que a provoca, a resposta ecológica e realista iria exactamente no sentido, economicamente utópico, de haver cada vez menos doenças na medidas em que se combatessem e erradicassem os ambientes patogénicos e não os seus efeitos.
A perspectiva do realismo ecológico sobre a doença é assim, por natureza e à partida, altamente subversiva. E a ligação da doença ao ambiente um assunto verdadeiramente tabu.
À medida que se caminha na pormenorização das causas que produzem determinadas doenças, o médico fecha-se ao diálogo. No final da conversa [com o jornalista] o médico permite-se mesmo alvejar o interlocutor, se este foi crítico e não se deixou enrolar pela sofística médica, com este comentário irónico: «A sua angústia em querer saber as causas não pode ainda ter, neste momento, uma resposta da ciência». Ponham-se aqui os pontos de espantação necessários e suficientes a este manso dislate.
Subentende-se que a palavra «angústia» estará na sua mente médica associada à palavra «metafísica» e que esta tem portanto para si um sentido pejorativo. Filosoficamente falando, os médicos mais eruditos estão no positivismo de há cento e tal anos.«Angústia», no entender irónico deste especialista, é querer saber as causas e não se contentar com a exposição consumada dos efeitos. A tal «angústia», porém, deve-se no entanto todo o ímpeto investigador dos celebrados cientistas e da celebrada ciência através da história, nos tempos em que investigador e cientista queriam evidentemente dizer alguma coisa. Mas o investigador ou cientista como indagador de causas está hoje, pelos vistos, travestido do seu oposto: o explorador dos efeitos sem jamais indagar das causas. Por isso um médico ilustre considera angústia ir às causas da insuficiência renal crónica.
Foi indisfarçável também, nesta conversa com um eminente nefrologista, que quanto mais soubermos das causas da insuficiência renal crónica menos hemodialisados haverá. E um médico, por mais humanista que seja, é sempre mais amigo da clínica que dirige ou na qual trabalha. É humano. Mesmo remota, a hipótese de o número de hemodialisados vir a descer, é desconfortável para as clínicas de hemodiálise que tanto dinheiro custaram a instalar. (Sejamos humanos e compreendamos.) Ora uma análise das verdadeiras causas da insuficiência renal poderia fazer com que esse número descesse perigosamente...
Portanto e em vez de um claro «despiste precoce» - como dizem por dizer os médicos - o que temos, na prática, é uma nebulosa, ambígua e abstracta predisposição para não referir os principais «culpados» da insuficiência renal crónica que são evidentemente os medicamentos. Remetendo a doença para o poço sem fundo das causas «congénitas» ou hereditárias, boa desculpa de todo o culpado, a medicina lava daí as suas sujas mãos,
[agentes químico-medicamentosos causadores de doenças]

Em Novembro de 1974, estudo realizado pela Universidade de Florida, indicava que analgésicos de venda livre representam um dos causadores mais frequentes de efeitos «indesejáveis». De acordo com o estudo publicado pelo jornal da Associação Americana de Medicina, sobre mais de 6000 doentes admitidos no decurso de três anos, 2,9 por cento sofriam de enfermidades provocadas por medicamentos. Em segundo lugar vinham os antibióticos. Ao todo, estavam implicadas 109 drogas farmacêuticas.
----Em Novembro de 1979, a OMS salientava que os perigos inerentes à vacinação antivaríola, podem ser hoje maiores do que os perigos específicos da doença. A encefalite pós-vacinação era apontada pela OMS como um desses perigos.
Em Agosto de 1981, relatório publicado pelo centro da ONU sobre empresas multinacionais, refere efeitos «posteriores»[a posteriori] de:
-hormonas sexuais sintéticas no Brasil
-pesticidas no Egipto
-sementes tratadas com fungicidas à base de mercúrio na Guatemala, Iraque e Paquistão
Em 1973 era levantada publicamente a questão dos efeitos provocados sobre a saúde pública pelo pó de alcatrão que os pneus revestidos de cravos - usados nos pisos de estradas com neve - provocariam no aparelho respiratório dos automobilistas e da população em geral. O Dr. Serge Neukomm, director do Instituto Universitário de Medicina Preventiva e Social de Lausana efectuou uma série de experiências para provar o risco existente nesse pó de alcatrão. Pôde provar-se que o pó continha hidrocarbonetos policíclicos como o 3,4-benzopireno, de natureza cancerígena reconhecida há muito tempo.
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CRESCIMENTO 1984

1-4 -84-06-15-ie> = ideia ecológica - quinta-feira, 21 de Novembro de 2002-scan – provavelmente inédito, este texto recapitula algumas ideias e autores básicos da ideia ecológica, falando do que hoje pomposamente se chama «desenvolvimento sustentado».

QUANDO O DESENVOLVIMENTO PRODUZ O SUBDESENVOLVIMENTO

15-6-1984 - Que o desenvolvimento produz o subdesenvolvimento e o crescimento industrial fabrica pobreza/miséria, já foi suficientemente provado por pensadores do realismo ecologista.
Números estatísticos vieram confirmar o que a intuição de alguns eco-profetas previra.
As instituições, quer económicas quer políticas, abaladas no seu dogma máximo - a religião do crescimento económico como panaceia universal para resolver todos os problemas - fingiram não notar.
Mesmo quando as estatísticas da CEE provaram haver nos países desenvolvidos e prósperos da Comunidade, uma zona negra de pobreza - 11,4% da população abaixo da linha de extrema pobreza - as mesmas estatísticas indicavam que 50% da população ignorava os pobres dentro das suas imponentes e prósperas sociedades!
Ainda aqui não estalou o escândalo, mesmo entre as consciências cristãs.
O desenvolvimento ou crescimento industrial era e continuaria a ser a "religião universal dos nossos tempos e mundos".
Só em 1981, João Paulo II lançava a encíclica "Laborem Exercens", muitos anos depois de Ivan Illich, Michel Bosquet, Frederich Schumacher, Jacques Attali e alguns outros, enfrentarem os dragões ferozes da Economia oficial , disposta a devorar os próprios filhos.
Valentina Borreman's, no Centro Internacional de Cuernavaca que fundara no México com Ivan Illich, editava em 1978 o “Reference Guide to Convivial Tools", bíblia das Tecnologias Alternativas e do Eco-Desenvolvimento.
Qual das respeitáveis instituições que lamentam a Pobreza dos Povos leu ou mandou ler essa bíblia?
Em 1982, surge em Espanha talvez o primeiro grande Tratado de Anti-Economia-como-Religião, a obra de Ramon Tamames ''La Polemica sobre los Limites al Crescimiento".
A nível mais oficial, o presidente do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (P.N.U.M.A.), com sede em Nairobi, compila em 1982 os seus discursos de vários anos sob o título genérico "Desenvolvimento sem Destruição: a abrir o seu livro, Mustafa Tolba fala de "Alimentação e Meio Ambiente", mostrando como o desenvolvimento tem fundamentalmente a ver com ecologia e ética ecológica.

A propósito do colóquio sobre "Crise Económica e Pobreza", realizado em Lisboa por iniciativa da Caritas, lembrámos aqui em semana anterior (16-6-1984), a operação "Pirâmide" que a Cruz Vermelha Portuguesa realizou no Natal de 1978.
Lembrámos como essa Operação foi criticada pelas vozes dos que já na altura prometiam paraísos e, o que é mais curioso, continuam prometendo, ainda hoje, com êxito igual.
Falou-se mesmo de "indignidade" a que se prestavam nomes famosos do palco e da Televisão.
Vale a pena retomar este "leit-motiv" da ética que nos convém para a miséria que temos. Ou seja: que moral pode ser a nossa quando quase 50% da população está abaixo da linha mais baixa da pobreza.
Se a Operação Pirâmide foi "ofensiva da dignidade nacional", como alguns fogosos progressistas proclamavam, teríamos então que fazer uma "pirâmide" quase até ao céu de coisas que já então eram e continuam sendo bem mais aviltantes da consciência nacional.
No calendário do oportunismo político a que a Igreja dá sempre boa e oportuna colaboração, os cancros sociais como a Pobreza têm dia e hora para serem devidamente empolados e enfatizados. Cada coisa a seu tempo - dizia a Bíblia.
Com efeito, dramatizar, neste preciso momento e neste pobre País, a Pobreza que sempre existiu e descobrir que Setúbal, o tal pólo do desenvolvimento industrial que traria prosperidade para todos, era uma das "bolsas" pobres mais pobres de Portugal, parece ter sido coisa do demónio mas, paradoxalmente, a coqueluche das consciências alarmadamente cristãs nos últimos tempos.
Últimos entenda-se: depois de a despenalização do aborto ter sido aprovada e a Igreja ter ficado por isso com um grande melão, nunca mais perdoando ao Dr. Mário Soares e aos governos de Mário Soares.
As consciências menos cristãs desconfiam da fartura (de só agora haver tanta miséria!...) e vão ao colóquio da Fundação Gulbenkian, sítio aliás adequadíssimo e de extrema pobreza para decorrer, como é óbvio, um colóquio de tão evangélica natureza.
Vão e aprendem que, afinal, já em 1973 - meses antes da alvorada de 25 de Abril que daria tantas insónias aos homens sem sono - um inquérito do I.N.E. assinalava que um terço da população portuguesa vivia em degrau de "extrema pobreza".
A evangélica instituição eclesial, sempre de coração despedaçado pelos pobres, cinquenta anos na mó de cima com um regime político que inegavelmente protegia e a protegia, não teve tempo de realizar colóquios na Fundação antes da crise petrolífera.

Abençoada crise das ramas que pode explicar quase tudo, inclusive o 25 de Abril, a Fundação, o Calouste, o endividamento externo de Portugal, o Terceiro Mundo do Médio Oriente que apertando as torneiras deu origem ao Quarto Mundo dos estrangulados pelo "choque petrolífero", Londres iluminada a velas, a inflação galopante com o freio nos dentes, a sobre-exploração dos já explorados, o fosso Norte-Sul ainda maior, o endividamento externo, o FMI, etc

MESES ANTES DO CHOQUE PETROLÍFERO

Meses antes do choque petrolífero vir dar uma explicação teológica global de tudo e mais alguma coisa - inclusive por em causa o conceito religioso de crescimento industrial - já o I.N.E., em Portugal, no entanto, assinalava um terço da população portuguesa em pobreza extrema.
Quando o governo do Bloco está em apuros, a Igreja lembra-se de rezar esse Terço. E que bem o reza, na linha da encíclica "Laborem Exercens" , laboriosamente dada à luz por João Paulo II em 1982, com uma crítica implícita às ideologias do desenvolvimentismo e do produtivismo.
Consciências muito cristãs, entretanto, continuavam dando aval aos dogmas do desenvolvimento, para elas, consciências, também transformado em religião. É tardiamente que se põe em causa o Establishment quando ainda agora, por toda a parte onde o subdesenvolvimento alastra por culpa do desenvolvimento, se continua a fabricar o sub-desenvolvimento com o nome teimoso e vicioso de desenvolvimento.
Não adianta muito falar em "desenvolvimento sustentado" só para evitar falar de Eco-desenvolvimento.
O manifesto pudor cristão perante o dogma do Crescimento significa que, mais uma vez, a tutelar Instituição se deixou ultrapassar pela História.
Ainda não reconhece a análise ecológica da realidade económica, quando o chamado Desenvolvimento já tem as tripas à mostra há muitos anos, já mostrou todas as atrocidades de que era capaz, já exibiu suficientemente as suas fauces fascistas e já se revelou em toda a plenitude de sistema totalitário, pai de totalitarismos.
A surdez de quem não quer ouvir teve uma ocasião prática de se mostrar no âmbito do movimento inter-grupos, primeiro, e no do Movimento para o Aprofundamento da Democracia depois, onde os espíritos verdadeiramente de vanguarda e sensíveis à mutação dialéctica da história eram sistematicamente abafados por meia dúzia de couraças rijas, de burocratas que ali impunham as respectivas cartilhas e cassetes, deixando mais uma vez que a Mediocridade reinasse, já que dos medíocres é sempre o Reino dos Céus.
Foi pena. Perdeu-se um bom capital humano, queimaram-se figuras-chave de um verdadeiro movimento de eco-alternativas, deixou-se a Esperança mais uma vez sucumbir.

A MÍSTICA FRANCISCANA

Confesso que não vi por aqui muitos cristãos e evangelistas muito interessados em renovar a mística franciscana do amor à Natureza como condição sine que non de matar a fome no Terceiro Mundo e salvar da catástrofe o Planeta Terra.
Vi, sim, alguns católicos repetirem as cassetes terceiro-mundistas de grandes blocos hegemónicos, quando já era claro estarem os recursos planetários pilhados e delapidados pelos blocos hegemónicos, a Leste e a Oeste, mais do que nunca na origem do fosso Norte-Sul.
Mais do que nunca a questão de fundo é ecológica e ainda católicos célebres hesitavam em perceber de onde soprava o vento, e já os próprios protestantes, do ramo ecuménico das Igrejas, por exemplo, se davam conta, muito mais cedo, de terem nos ecologistas os aliados de primeira fila.
Se hoje, em assembleia cristã, se fala da Ecologia como a Ética evangélica por excelência há sempre os que, com falsa modéstia, alegam não estar suficientemente informados.
Mas quem anda nisto e diz defender acima de tudo a causa divina do homem e a causa humana de Deus, não pode alegar "ignorância da lei". Não pode desertar. Essa alegada ignorância talvez seja, no entanto, outra questão mais difícil de confessar: o coração desses cristãos tem-se fechado e continua a fechar-se à sensiblidade ecológica nascente, que exige, pouco mais ou menos, quase tanto como uma reconversão religiosa.
Pôr em questão um dogma, seja ele religioso ou científico, equivale a um terremoto mental de consequências desastrosas para os funcionários que vivem desse dogma.
Todos temem a mudança, mesmo aqueles que gostariam de pôr o dogma em causa, neste caso, o dogma do desenvolvimento económico e/ou do crescimento industrial.
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