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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-04-21

GRATIDÃO 1992

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21-4-1992

OBRIGADO POR TODAS AS CRISES

«Se não fosse o demónio, não teria encontrado Deus»

Graças a Deus que fui meticulosamente afastado de tudo onde me meti, por aqueles que temiam sempre a chegada de um intruso ao seu reino.
Graças a Deus que fui afastado da crítica de cinema pelos peritos em cinema que nunca me deixaram pôr o pé em ramo verde.
Da crítica de livros, pelos que desde cedo viram que um herege confesso não podia corresponder satisfatoriamente ao equilíbrio de forças que deve existir entre os vários lobbies da influência literária (desde cedo que se deram conta de eu ser um teimoso desestabilizador).
Graças a deus que também do meu Alentejo natal e das minhas raízes ancestrais eu fui afastado pelos que instalaram, nessa província, a sua coutada privativa, dos que, com armas e bagagens, instauraram a ditadura estalinista no Alentejo, praticamante em todas as câmaras municipais, não me deixando, nem como hipótese, regressar à terra que me foi berço. Graças a deus que logo puseram em acção a polícia privada do PCP, para saber dos meus perigosos antecedentes de anticomunista primário.
Graças a deus que fui afastado dos meios naturoterapêuticos pelos que viram, desde cedo, a minha nula disponibilidade para fazer das artes de curar um negócio, para merceeirar, negociar com a vida e a saúde das pessoas.
Graças a Deus que fui expulso a pontapé das minhas paixões, dos meus apegos, até das minhas amizades, às quais estaria hoje apegado sem remissão e sem conseguir ver mais nada (a paixão cega).
Graças a deus que não me quiseram na literatura, onde estaria a esta hora a ser discutido pelo prémio que devia ter e não tive, porque o maldito fascismo larvar não consentiu e eu não fiz outra coisa na vida senão tirocínio para herói.
Graças a Deus que não tive memória, pois estaria hoje em professor do Secundário, ou do Primário, ou quiçá do universitário, definitivamente instalado até à minha jubilosa jubilação.
Graças a Deus que me criaram condições inviáveis de inabitabilidade absoluta naquele abençoado jornal, naquela casa de cancros que é a redacção daquele jornal «A Capital», zona de alto risco de Lisboa, câmara de Gás do País.
Graças a deus que não fui rico, que não fui célebre, que não fui poderoso, que não fui saudável, que não fui feliz, que não fui bem sucedido, que não fui belo nem esbelto, que não fui inteligente, que não fui simpático e boa pessoa, que não fui escolhido nem eleito entre os eleitos, que não acreditaram em mim para nada de nada, que nunca me convidaram para nenhum cargo que dá notícias logo no semanário da esquina.
Graças a deus que não fui gordo, forte, musculoso, bem disposto, bem parecido, que não me deram chances, oportunidades, lugares, empregos, hipóteses de me realizar e de poder declarar isso em entrevista à revista «gente», deixando roídos de inveja os eventuais leitores de tais declarações de auto-embevecimento.
Graças a deus que o demónio foi sempre minha dilecta e predilecta companhia, que com ele dormi, comi e forniquei, que dele recebi o bafo-hálito, que tudo me saiu errado das mãos calosas, que nunca gostei de cães nem de tecnocratas, especialmente se ladrantes e sem ideologia, graças a deus que abominei o que os outros amam, que levei o dobro do tempo a adaptar-me à nova tecnologia do computador, sob os risos trocistas dos colegas,
Graças a deus que morri trinta vezes em cada ano, que me enrosquei com dores no sofá, que estive dias seguidos sem dali sair, sem mudar de roupa, sem comer, sem falar, só vivo porque urinava e ia à casa de banho, sem esperança, sem graça, nem vontade.
Graças a deus que nunca fiz chichi ou cocó nas calças.
Graças a deus mesmo se o tivesse feito. Graças a deus que nunca me saiu a sorte grande, que me querem tirar a casa, que me andam a arrancar a pele aos bocados, que nunca mais me dão a reforma, que tudo nesta sociedade de consumo me faz brotoeja e me obriga a coçar que nem um danado até fazer sangue.
Graças a deus que nunca tive automóvel, nem casa, nem soube inglês como o Mega Ferreira, nem música como o Vasco da Graça Moura, nem economia como o Perez Metelo, nem fui vedeta como o Letria, nem como o Herman, nem como a Maria Elisa, nem advogado do Champallimaud como o Proença de Carvalho, nem [---]
Graças a deus que nunca me fiz entender, que dizia alhos e me respondiam bugalhos, que toda a vida andei a ver navios no Alto de Santa Catarina, que fiz planos e saíram todos furados, que fiz projectos e nunca concretizei nenhuns, que morri de tédio com o trabalho que me coube em sorte, que girei como um pateta no meio de montes de papéis, de livros para ler e que graças a deus não li, de filmes que nunca consegui ver, graças a deus que não vi todos os filmes que queria ter visto e que vi aquelas dezenas de milhar que nunca quereria ter visto, graças a deus que me cansei de ver filmes e de os criticar.
Graças a deus que me olhavam de revés no Metro, que me puseram no ficheiro da PIDE, que os estalinistas, tão bons como os fascistas, me puseram também nos seus ficheiros implacáveis, graças a deus que, onde quer que eu queria trabalhar, havia sempre informações de pessoa non grata a estalinistas e fascistas ou vice-versa.
Graças a deus que os amigos falharam ajuda nos momentos mais críticos, que os meus maiores apoios na luta política e ecologista acabaram por morrer (como o Dr. Rocha Barbosa, uma das almas mais lindas que conheci) ou por abdicar do desperdício e da Entropias da luta. Graças a deus que não sou, que não fui sábio, génio, pianista, recordista, escritor de ficção de nomeada, ganhador de prémios.
Graças a deus que chumbei a todas nos exames, que levei nota de 0,5 em Armamento no exame de sargentos Milicianos de Vendas Novas, graças a deus que chumbei nos exames de promoção à escala seguinte da hierarquia, graças a Deus que nunca passei da cerpa torta e que andei dois anos para me passarem, na inefável «A Capital», da Categoria II para a III.
Graças a deus que me atardei, perplexo e pouco expedito, pouco perspicaz, frente a três livros sem ler nenhum, que me proibi, como um Sabat de falsos demónios, de comer os belos pratos e molhos e vinhos e gorduras que dão gosto à vida e colesterol no sangue.
Graças a deus, enfim, como diria a Zélia Sacai, que sou ateu.

Graças a deus que morri de inveja de todos os que tiveram sucesso. Do Emílio Rangel e do seu sucesso, mas que junta o útil ao agradável e fica agora um dos homens poderosos do Presidente, o homem forte de Balsemão.
Graças a Deus que não fui Balsemão, o mais poderoso português (depois) dos anos 90.
Graças a deus que não fui Deus Pinheiro, Capucho, Cravinho, Pimenta, enfim, a deputado europeu com ordenado de Nababo.
Graças a deus que não fui Nababo, nem Maxwell, nem Lindon Johnson, nem Ronald Reagan, nem Rockfeller, e outros poderosos donos da Trilateral. Graças a deus que não fui o dono da Sony, os monstros do Dinheiro, os Cracks do êxito, os eternos namorados da Sorte e do Sucesso, os abre-te sésamo de milhões de dólares, os inveterados da Bolsa, os sempre ganhadores, os eternamente felizes, os categorizadamente plenos, gordos, possantes, potentes, poderosos.
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Graças a deus que moro em uma casa que me querem tirar, numa casa que é de Cancro porque está assente num veio de água subterrâneo, eventualmente estagnado e poluído com os metais pesados da [---]
Graças a deus que não fui nunca nada, porque se não tivesse sido tudo isso, esse rol de inicuidades, azares, frustrações, solidões, erros, perversões, desordens, diarreias, prisões de ventre, raros sonhos nas minhas noites, se não tivesse no meu ADN esses estigmas de todos os Hereges, de todos os interfaces, de todos os eternamente hesitantes, de todos os cépticos, os estigmas da Confusão e do Caos, não teria encontrado, hoje mesmo, 21 de Abril de 1992, o meu mestre guru e segundo Eu que é (olá, compincha) Etienne Guillé.
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POLUENTES 2001

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POLUENTES E ECOLOGIA HUMANA (CHAMADA SAÚDE PÚBLICA)

21/4/2001 - Da lista negra cuidadosamente elaborada a seguir, penso que não inventei nenhum dos itens. Faltam ainda é muitos e muitos itens a esta bela lista dos poluentes que inundam o meio ambiente e que, portanto, condicionam a vida e a saúde dos que desse ambiente precisam para comer, beber e respirar. Digamos, genericamente, o consumidor, mas alguns nem é preciso consumir, chegam até nós naturalmente.
É esta lista negra (quando completa) que deverá inaugurar qualquer tentativa de ecologia humana. Fiquei-me pela lista (incompleta) porque logo se percebe, por ela, que uma equipa de 100 pessoas não chegaria para isso tudo, ou seja, para começar a sistematizar a ecologia humana que é, afinal, uma toxicologia alargada. E que já me tinham chamado, vezes demais, inimigo da pátria e do progresso, e por listas bem mais pequenas. O xilofene, por exemplo, ou o cloreto de vinilo.
Esporàdicamente, os jornais noticiam estes itens de ecologia humana a que chamam, quando chamam alguma coisa, saúde pública. Mas o que interessa aos jornais é sensação e provocar adrenalina no consumidor, não é defendê-lo. Aliás, nem o próprio consumidor está interessado nisso: está mais interessado em continuar a engolir desgraças e, melhor ainda do que as desgraças, as notícias de jornais e telejornais sobre as sobreditas desgraças.
Aí vai, para começar, alguns dos itens, sem esquecer que faltam ainda centenas que não estão aqui compilados. Viva o progresso e a civilização.

aditivos
aerossóis
aflatoxinas
alergenos
amianto
amianto para romper os pulmões dos operários
antibióticos que são a estrada real para a deficiência imunitária
asbestos
bicloreto de etileno
bilhas de gás butano
carne de vaca
cianeto de potássio
cloro na água do beber,
clorofluorcarbonetos
coca-cola para a juventude sossegar
concentracionário urbano
conservantes
conversores catalíticos
corantes químicas
corantes.
cosméticos
ddt no leito humano
desinfestantes químicos
detergentes
dioxina
escavadoras mecânicas
estrogenos na limentação para bebés
formaldeído
fotocopiadoras
greves contra o cidadão
hormonas na carne de vaca
insecticidas domésticos
instabilidade social
jornais
lâmpadas fluorescentes
micro-ondas
monoglutamato que cria pequenas disfunções nos futuros tetos
nitratos
orobronze sprays
pílula que não provoca o cancro da mama e muito menos o do cérebro
policloreto de vinilo
política
propileno
queijo fresco
radiações
receptor de televisão
refinados
répteis infláveis
ruído
sacarina e ciclamatos
soda cáustica
stress
tampões higiénicos
telejornais
terminais vídeo
terminais vídeo
trabalho
xilofene
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ESTOCOLMO 1972

72-04-21-di> = diário de um idiota feliz - diário de um sobrevivente

ESTOCOLMO 1972 (*)

21/4/1972 - Procurando remendar o pano cada vez mais esburacado da chamada «civilização» - que mete água por todos os lados - sábios eminentes e outros representantes do saber oficial costumam encontrar-se com regularidade para discutir os temas mais prementes e concluir, regra geral, pela impossibilidade de agir a curto prazo e de solucionar os problemas.
Sobre a degradação do meio ambiente - problema que apoquenta, cada vez mais, grandes e pequenos países, governos e cidadãos, homens de ciência e homens práticos, elites e massas - de todos os congressos previstos o mais importante será o de Estocolmo, a realizar durante o corrente ano, com o patrocínio das Nações Unidas e para o qual têm sido divulgadas na, Imprensa, notícias da actividade que representantes portugueses estão a desenvolver no sentido de levar àquele encontro uma presença condigna.
Haverá ainda alguma coisa a fazer para evitar a catástrofe, para impedir que (simplesmente) a humanidade se suicide?
Quando a História confirma (geralmente de maneira trágica) o que fora previsto pelos contemporâneos do futuro, então os homens práticos decidem-se a enfrentar os urgentes problemas com soluções de improviso. Mas já hoje, os que têm por função saber o que irá passar-se em futuro próximo, estão a colocar problemas que igualmente não são ouvidos nem atendidos. Repetir-se-ão os mesmos erros de cálculo e tratar-se-á de resolver num dia o que podia ter sido estudado num ano.
A Prospectiva continuará a ser considerada como uma ocupação de ociosos e de nada servirá alertar, desde já, os responsáveis dos perigos que amanhã recairão sobre a Humanidade. A pretexto do que o presente oferece de urgente e calamitoso, poucos querem olhar o futuro com olhos (prospectivos) de ver.
Os mais cépticos ou prudentes só darão algum crédito e reconhecerão importância ao Congresso Mundial contra a Poluição, que a UNESCO prepara para Junho de 1972, em Estocolmo (1200 delegados de 120 países), se as incoerências e as dissonâncias entre prática e teoria, objectivos e meios de acção, constituírem matéria básica de debate.
Se o Congresso de 1972 pretende, realmente, pôr em evidência a considerável extensão da tarefa perante a qual a Humanidade se encontra, e se pretende, com ela, encorajar os governos nacionais e as organizações internacionais a orientar os esforços no sentido de encontrarem soluções concretas para os problemas do meio humano, nada lhe poderá ser indiferente, até mesmo o que ainda agora se considera quimera de poetas, angústia de filósofos, ou incomodidade existencial de incorrigíveis inadaptados, de incuráveis inadaptados, de incuráveis irreconciliados com a brilhante civilização industrial.
Terá o Congresso de Estocolmo de dar ouvidos, finalmente, aos que de há muito denunciam o pesadelo climatizado em que vivemos.
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(*) Publicado no jornal “Diário de Coimbra”, 21/4/1972, numa rubrica designada “diário de um sobrevivente”
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PARADIGMA 1989

89-04-21- notícias da frente - demanda de um novo paradigma

O RADICALISMO EM ECOLOGIA

O radicalismo em ecologia é, mais uma vez, o tema deste texto inédito, que por isso mesmo - por ser apologista do radical - foi e será inédito. Deste texto emerge também o tema dos «dossiês malditos» e da ecologia como ciência maldita. Nele se fala também de um ecorealismo que nunca consegui explicar muito bem e que foi o último refúgio para continuar pensando aquilo que mais ninguém, dos ecologistas e ambientalistas, pensava.(15/9/1999)

21/Abril/1989 - As teses mais iconoclastas e heréticas que as edições «Frente Ecológica» têm apresentado - no meio, é claro, de total indiferença e silêncio - são, na maior parte, discordâncias frontais com outras correntes ambientalistas.
O que só tem ajudado a definir o realismo ecológico como corrente autónoma.
Quer dizer: a definição de ecologismo como realismo (mais) radical leva necessariamente - e não por coincidência - a tomar posição crítica em relação a correntes do ambientalismo consideradas menos radicais.
Ao dizer «mais radicais» não se pretende com isso fazer um juízo de valor: pretende-se apenas dar o seu a seu dono.
À medida que se radicaliza - como têm feito os ensaios da «Frente Ecológica» - um realismo ecológico cada vez mais exigente, o confronto é cada vez mais entre ecologistas de diversas formações, e a polémica é mais interna que externa.
Feliz ou infelizmente, é esta a realidade dos factos. É este o dado objectivo.
O que, por exemplo, o realismo ecológico pensa do ordenamento do território e das campanhas conservacionistas, é demonstrativo de uma posição que se isola à medida que tenta radicalizar a análise. Não terá o realismo ecológico que pedir desculpa às outras correntes pelas posições que sustenta e pela teses «impopulares» que propõe: poderá , sim, fazer questão de separar as ideias das pessoas. E quando critico o conservacionismo ou o ordenamento do território , é evidente que até sou - e quero continuar a ser - amigo de muitos conservacionistas e defensores do ordenamento.
Posso, quanto muito, pedir desculpa de alguma fraseologia mais virulenta e prometer que a evitarei. Não vou é garantir que desista de aprofundar a análise e a definição de um ideário.
Que o resultado desta démarche seja a solidão - paciência.
Como dizia o Platão, sou muito amigo dos meus amigos ambientalistas de todas as cores e tendências, mas sou mais amigo da verdade.
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AMEAÇAS E ALARMES 

Entre os temas típicos do eco-realismo , cita-se o das «ameaças e alarmes com que se pretende
esmagar  a liberdade humana .
Sendo eles os principais autores do Apocalipse, eis que nos ameaçam com falsos apocalipses para nos obrigarem a esquecer os reais. Com as ameaças para amanha , querem fazer-nos esquecer as mentiras de hoje.
Para dar aos nossos amigos uma ideia das interferências abrangidas por essa verdadeira guerra de nervos - na qual fundamentalmente se apoia a guerra ecológica - vamos citar títulos com que os jornais, veículo de ideologias e propagandas, tentam convencer-nos.
Repete-se: Ecologia é um esforço para ver a verdade, no meio do nevoeiro das propagandas e demagogias.
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ANIMAIS 1998

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21/abril/1998

PARA UM MANIFESTO DO SER HUMANO - ANIMAIS NOSSOS AMIGOS

21/Abril/1998 - Antes que, na Assembleia da República, seja agendada a discussão do projecto-lei sobre direitos dos animais, é o momento de lançar algumas achas para a fogueira, algumas sugestões, ideias e críticas que animem o debate e atiçem os excelentíssimos senhores deputados.
Em direitos de animais, estamos ainda mais atrasados do que em direitos humanos. O que quer dizer que, em nível cultural e civilizacional, nos aproximamos das cavernas.
Há cem anos que a campanha naturovegetariana, privilegiando os aspectos moralistas do problema, não tem conseguido mobilizar as consciências e as vontades. É preciso passar dos sermões moralistas para a exigência ética e esse salto está longe de ter sido dado.
No que à Ética ecológica respeita, a passividade impera e a revolta silencia-se. Os próprios ambientalistas têm ajudado a silenciar os aspectos mais gritantes de ecologia humana e animal. As organizações particulares de protecção e defesa dos animais têm uma vida difícil e algumas acabam por desaparecer. É preciso, no entanto, que proliferem como cogumelos. Quantas mais, melhor.
A moda dos «animais de estimação», em boa hora incentivada pelas grandes marcas de alimentos enlatados, é apenas uma moda. Mas é melhor que nada.
Fazendo contra-vapor a todas as boas intenções e boas vontades em favor dos animais nossos irmãos - como S. Francisco de Assis cantou - há os poderosos interesses corporativos, as poderosas classes daqueles que, na caça e na pesca, encontram o seu desporto favorito. Mas não é a pena de morte para humanos moeda corrente ainda hoje em muitos países que se dizem civilizados?
Há os interesses das indústrias que utilizam em laboratório os animais como cobaia de experiências, sempre atrozes. Mas no campo da medicina humana, por exemplo, não são os diagnósticos cruentos, por vezes, também de uma enorme crueldade, com a desculpa da utilidade necessária? E não se experimentam medicamentos em humanos?
Em matéria de agitação mediática, a opinião pública é aturdida com a doença das vacas loucas, com a peste dos aviários, com a brucelose, com a peste suína, com os mil e um vírus que decidem, de uma hora para a outra, infestar o mundo dos humanos coitadinhos.
Já que não há consciência e se mantêm durante dez anos cabras com brucelose para empochar os subsídios de um governo sempre manso e sempre benemérito, haja ao menos vergonha: e reconheça-se que todo esse holocausto a que estamos a assistir - com abates que evocam os grandes genocídios da História - é da pura e simples responsabilidade do nosso comportamento para com os animais nossos companheiros de viagem no planeta Terra. Do nosso carnivorismo devorador. A famosa fome do 3º Mundo, em grande parte, deriva também daí: o abismo entre pobres e ricos, mantido pelos blocos hegemónicos que disputam os recursos da Terra, é agravado pelos absurdos hábitos alimentares que colocam a carne no topo da alimentação proteica, quando ela devia e podia estar apenas como um complemento a ser usado em último recurso e em condições especiais de necessidade de sobrevivência (o caso tão conhecido dos esquimós). Nem só de hamburgers morre o homem.
Os naturo-vegetarianos já provaram , pelas ideias e pelo comportamento, que as alternativas vegetais, nomeadamente a Soja, à proteína cárnea são simultaneamente mais saudáveis e mais económicas. Bastava desperdiçar menos recursos e haveria proteína para todos. Mas como o desperdício acciona os mecanismos do lucro, o busílis reside aí e os animais continuarão a ser sacrificados assim como a Amazónia, o tal pulmão verde da terra que está no centro desta problemática «proteica», com os hamburgers à espreita.

Curiosa e inesperadamente, o Notícias Magazine (12/4/1998) inseria um artigo de Fernanda Câncio, a vários títulos insólito no panorama mediático deste país sempre mais virado para as tagarelices habituais do futebol, fado e circo. Fernanda Câncio - a quem endereçamos daqui a nossa homenagem - inventariava em termos apaixonados, mandando às malvas a famosa objectividade jornalística, as atrocidades e barbaridades cometidas secularmente contra os animais mas principalmente aquelas que se praticam em nome do progresso.
É um panorama aterrador, o do progresso, que coloca o bípede dito humano no fim da escala dos seres vivos. No entanto, todos os sistemas ideológico-filosóficos, colocam-no no topo: inversão de valores caricata.

A Natureza acaba por responder aos atentados ecológicos contra as espécies - esperam alguns - mas responde devagar e mansamente. Vacas loucas, peste de aviário, brucelose, peste suína, não são epidemias suficientes que travem a perversidade humana relativamente às espécies que neste Planeta são seus companheiros de eleição. Um mundo sem animais seria mais aterrador ainda do que é. Mas nunca deixará de ser aterrador enquanto não houver uma viragem de 180 graus nos hábitos de relacionamento inter-espécies, a começar nos hábitos alimentares. Viragem que é o famoso Novo Paradigma que alguns hoje propõem como única saída para o holocausto.
A sociedade de consumo está cheia de «necessidades» artificialmente criadas ou de coisas supérfluas que se institucionalizam como necessárias. O desperdício do luxo e do lixo é o que está matando o Planeta e tudo o que nele vive.
As razões invocadas para justificar a violência e tortura de animais são tudo apriorismos e sofismas do velho paradigma, hábil malabarista em justificar o crime. E nem sequer deveria haver discussão entre gente que se considere adulta e vacinada. Razões dos fortes contra o fraco são razões ignóbeis. Como Fernanda Câncio referia no já citado artigo do «Notícias Magazine», a experiência científica e laboratorial pretende ser uma forma «útil» de tortura. Esta hipocrisia liofilizada da liofilizada ciência (sempre com as mãos limpas porque usa luvas de borracha) é uma falsidade sem nome.
O curioso é que o referido «Notícias Magazine» nunca perde ocasião de exaltar o Velho paradigma (com artigos comprados à revista «Science et Vie») . Caso para dizer que Fernanda Câncio conseguiu meter uma lança em África, ou seja, publicar um artigo onde a ciência não sai tão limpa e ilesa como se costuma ler no magazine da D. Isabel Stilwell. Não esquecemos a campanha que ali tem sido movida contra a medicina natural e os produtos naturais. Mais uma vez, o forte batendo no fraco, cena triste , ignóbil e abjecta.

Depois da lei 92/95 de 12 de Setembro, de iniciativa do deputado do PSD António Maria Pereira, ter sofrido tratos de polé e ficado sujeita às risadas e troças das esquerdistas bancadas, é o Partido Socialista que em Setembro do ano passado, perdendo a vergonha e já sem medo de ser apelidado de direitista, apresenta na AR um projecto-lei, por iniciativa da deputada Rosa Maria Albernàs.
É pouco mas que sirva, ao menos, para atanazar os fortalhaços pais da pátria para quem os animais não são assunto prioritário. Os tais que, falando em direitos dos animais, perguntam sempre se as pulgas e as moscas também vão ficar abrangidas.
Este tipo de piada talvez não se ouça, mas como alertava a Maria do Céu Sampaio, presidente da Liga Portuguesa dos Direitos do Animal, precisamos de começar a ridicularizar os que ridicularizam os animais e os seus direitos.
É urgente instituir penas (e penas duras) de multa e prisão para os que desrespeitam os direitos dos animais . E embora, quando sair, já esteja desactualizada, é urgente aprovar a lei que reequilibre, neste campo, a correlação de forças entre opressores e oprimido.
Os direitos do animal só serão total e absolutamente respeitados quando os seres humanos tiverem uma concepção ética , quer dizer religiosa e espiritual, da vida e decidirem ser humanos começando por se respeitar a si próprios. A evolução que se exige e espera, portanto, é espiritual. Obviamente. E só com os animais, com a sua presença, ajuda e cooperação, o ser humano conseguirá dar o salto para a tão cantada Era do Aquário, tão inevitável a nível cósmico como a lei da gravidade a nível terráqueo e do sistema solar.
Um lei, por moderada que ainda seja à luz desta ética exigente, é apenas um pequeno passo. Não tardem em dar esse passinho, senhores deputados. Só lhes fica bem. E vão ganhar votos. Porque se há unanimidade absoluta é nisto: todos os portugueses amam os animais... nem que seja de churrasco.
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UNIDEOLOGIA 1992

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UNIDEOLOGIA: UM TEXTO PRETENSAMENTE EXPLICATIVO

Lisboa, 28/Abril/1992 - J.C.M.: Vais talvez receber um texto pretensamente explicativo do que é unideologia: mas desde já com um aviso prévio. Em nenhuma circunstância seria para publicar, pelo menos sem que seja expurgado de muitos parágrafos.
Só um pedido teu me faria regressar a montes de papel que já prometera a mim próprio nunca mais desatar, pois atados já estavam e metidos em caixotes, a caminho não sei muito bem de onde. De parte nenhuma, provavelmente. É matéria, além do mais, bastante inflamável e, como verás, pouco ou nada tem a ver com os ecologismos que se têm consumido por aqui. O nome de «unideologia» que dei à Sofística que se exala de todo esse conjunto de factos e datas da abjecção contemporânea, foi circunstancial e o mais moderado que encontrei, pois sei que não gostas de nomenclaturas muito escatológicas. O tecnofascismo, por exemplo, costumava indispor o nosso bom amigo Prof. Gomes Guerreiro e, em geral, sempre fui admoestado pela minha linguagem desbragada. Já o Michel Bosquet, o nosso amigo André Gorz, chamou-lhe «ecofascismo» com todas as letras e como ele era um homem delicado! A propósito, que é feito de Bosquet? Sei tão pouco, mesmo daqueles poucos que não queria ignorar nem esquecer!
Definir Unideologia, portanto e como calculas, não é só ter que meter as mãos na merda e perder mais horas a pesquisar os arquivos que cautelosamente fui mantendo, apesar de terem ido toneladas de papel pró lixo. Não é só esse desgosto de voltar a tantas horas e energias desperdiçadas: é reconfirmar o que de perigoso tem a ecologia, quando vista por esse lado ...humano.
Por exemplo: o ciclo do terror tecno-industrial fecha-se quando os bancos e grandes multinacionais de Seguros se aperceberam de que vivemos em um mundo de permanente e crescente insegurança, em uma engrenagem de tecnoterror, em um Gulag sob a forma aparente de uma democracia; trataram então de explorar, por via transversa, esta Mina, este mercado inesgotável. (Creio que já lhe chamei o Mercado da Morte). Os «media» têm o grande papel de amplificadores do Medo, de manter esse estado de sítio psicológico que permite às Seguradoras prosperar. Quem se sente cada vez mais inseguro, tende a procurar refúgio em uma apólice - palavra-chave da Abjecção contemporânea. Quando o semanário «Tal & Qual» vai descobrir (coligindo opiniões de abalizados engenheiros...sempre prontos a estruturar pânico e pontes) que a Ponte sobre o Tejo tem graves fissuras e que, um dia destes, pode cair, está a criar um «estado de sítio» psicológico, desde logo agravado quando se sabe que o Governo decidiu somar ao tabuleiro rodoviário um outro tabuleiro para comboios... Quando as seguradoras descobriram que o pânico sísmico é um dos mais susceptíveis de encolher a população, não cessam de surgir, nos «media», especialmente nos media mais espertos, artigos sobre previsão, prevenção, descrição sísmica, etc.
Os cargueiros afundados servem dois (pelo menos) objectivos:
- lançar no fundo do oceano detritos tóxicos e perigosos que tanto embaraço causam em terra firme;
- a notícia de cargueiros desaparecidos vai intensificar a consciência do medo do consumidor, que se segura bem segurado quando tem mesmo que mandar despachos por mar...
Durante anos, a ponte de S. Luís (?) no Porto - cai, não cai - foi matéria de ameaça para milhares de utilizadores do comboio. Aí, tratava-se de motivar politicamente qualquer governo para empreender a construção de uma nova ponte que logo, na inauguração, se viu rodeada de incidentes «ameaçadores», com esse louco do engenheiro que se julga génio a presidir à encenação . Além de espevitar os dinheiros do Governo para a construção da nova ponte, a periclitante ponte antiga naturalmente estava e está de tão boa saúde como sempre esteve. Mas não faltarão engenheiros abalizados a confirmar o estado «periclitante» da dita...
Uma indústria subsidiária, além dos Seguros, que também ganha com o Medo é a dos Tranquilizantes e a dos Estupefacientes. Etc.
José Carlos: Aqui tens um exemplo, entre outros, de um tema de ecologia humana que, portanto, interfere (faz interface) com outros temas e que por isso é bem um subproduto da tal Unideologia. Mas são hipóteses que eu próprio tenho medo de pensar e é por isso que o teu desafio para escrever sobre unideologia - um texto didáctico... - me deixa em pânico. Cá está. Estamos num mundo onde há que ter medo de tudo - assim convém ao sistema, mas principalmente medo de dizer o interesse que o sistema tem em que a gente tenha medo... «O medo é o que o medo quer» - dizia Alexandre O'Neil. Já viste que grande confusão? Já viste o que era um repositório destas teses loucas? Para que servem, afinal, os internamentos psiquiátricos (vide Gulags) senão para internar os autores de teses assim?
Ideias há que a gente sente medo de pensar. A escrevê-las, um dia, só sob a forma de ficção, de contrário oferecem risco para quem as pense e escreva. Sequer sonhe. Por isso o texto que aí for sobre Unideologia não será didáctico nem publicável, porque no mínimo terá de ser polémico.
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