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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-04-11

HIDROTERMAIS 1972

1-1-72-04-12-di = diário de ideias - quinta-feira, 12 de Dezembro de 2002-scan

ÁGUAS MEDICINAIS(*)

[12/Abril/1972, in «Diário do Alentejo»] - Sendo Portugal um dos países mais dotados de águas minero-medicinais, pergunta-se o que já foi feito ou planificado para explorar manancial tão abundante. Apesar das perspectivas tão animadoras que se apresentam, nem o turismo conseguiu, por enquanto, acordar essa bela adormecida que continua renitente a todos os apelos.
A confirmar o que dizemos, sirva de exemplo um estabelecimento termal - Caldas de Monchique - que não parece acompanhar o ritmo de vertigem transformadora que percorre a zona da província algarvia onde se encontra implantado.
Não parece, de facto, que o turismo tenha começado a semear por ali os seus malefícios mas nenhum também dos seus benefícios. Os naturais desta pacata povoação em plena serra de Monchique pensam que a construção de um hotel de luxo, já iniciada, marcará o ponto de arranque para uma nova fase daquela estância, mas outros opinam que a recente construção de um edifício onde funcionam, simultaneamente, balneários, clínica particular e hospital, justificava outro movimento e outra protecção por parte das autoridades e das entidades ligadas à exploração turística.
Há que fomentar, ao mesmo tempo, o sector clínico e o sector turístico, interdependentes, assim como acudir à melhoria das instalações hoteleiras, por enquanto escassas e sem factores de atracção. Aqui deverá perguntar-se o que já foi feito no sentido de divulgar, pelo País, o que já existe, o pouco que já existe e merece visita.
Muito em especial numa estância de cura e repouso, salta à vista que uma culinária adequada, uma alimentação complementar dos tratamentos, deverá constituir não só atributo indispensável ou essencial mas atractivo de primeira ordem. Pois que pode o turista, doente ou não, desejar melhor do que descanso e... sopas?
Mas - pergunta-se - estarão os restaurantes e pensões dos nossos estabelecimentos termais à altura desta exigência? A par dos mais modernos conceitos de dietética e higiene alimentar? Ligados inclusive às possibilidades/ responsabilidades de cura que prestigiam um centro hidrotermal, e lhe trazem clientes de todo o mundo, - já se pensou que "milagres" turísticos poderia operar (ao menos aí, onde um mínimo de condições favoráveis se conjugam) uma alimentação segundo os princípios da higiene e do bom gosto?
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(*) Este texto de Afonso Cautela, bastante para o conjuntural diga-se de passagem, foi publicado no ”Diário do Alentejo", Beja, provavelmente na data que indico acima
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SISTEMA 1987

87-04-12-di> = diário de um investigador - temas a investigar (leh) – artigar - atenção a uma estratégia super-maquiavélica do imperialismo industrial – inéditos ac de 1987 – atenção à «lei das séries» (22/1/1989)

ANÁLISE DO MACRO-SISTEMA

12.Abri1.1987 - Atenção à sequência de factos, após a ocorrência de grandes catástrofes , com escândalo público.
Tem sucedido já várias vezes, em Los Alfaques, em Hamburgo, em Niagara Falls, em Bhopal 86, em Basileia 86: verificaram-se, depois de grandes catástrofes, outras de idêntico produto químico ou em semelhantes circunstâncias, embora de menores dimensões.
Esta ocorrência ou coincidência suscita algumas hipóteses de investigação inédita mas que, a confirmarem-se, provariam que o imperialismo industrial - o sistema que vive de ir matando os ecossistemas - está não só disposto a despejar em cima das pessoas os venenos acumulados, como se aproveita do acidental ou (aparentemente) involuntário para , logo a seguir, aproveitar voluntariamente para provocar acidentes.
Esta estratégia, se de facto já está a ser levada à prática, tem para as multinacionais, autoras das piores catástrofes, variadas e evidentes vantagens:
1 - Depois de um desastre de proporções escandalosas, se sucederem alguns mais pequenos, eles aparecem, à opinião pública, minimizados pelo próprio contexto em que surgem
2 - Dando-se vários acidentes menores, na sequência dos grandes, com produtos congéneres, o imperialismo industrial pode levantar a opinião contra os "verdes", atribuindo a brigadas ecologistas a provocação dos referidos acidentes
3 – Sobrevindo acidentes menores depois do maior, a própria banalização da catástrofe ajuda a minimizá-la no subconsciente colectivo, que assim fica preparado para criar habituação.
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DEEP ECOLOGY 1973

1-3-73-04-12-ie=ideia ecológica - quarta-feira, 4 de Dezembro de 2002-scan

A CONSCIÊNCIA ORIGINAL DA UNIDADE PERDIDA (*)

["Diário do Alentejo", 12/Abril/1973] - Que o mundo seja, todo ele e em matéria de lucidez crítica, uma imenso deserto , enfim: a gente já conhece, já não liga e passa.
Mas que as minorias, os raríssimos nos quais reside afinal a nossa derradeira esperança de homens ainda humanos, se passem, inopinadamente, para o campo da Abjecção, eis o maior e inominável desespero. Eis o maior motivo de pessimismo. Se as minorias são o sal da Terra, então só nos poetas, nos raros artistas e escritores e em alguns filósofos que tenham ainda um pouco de profetas residiria a nossa única e última esperança.
No meio do fanatismo das ideologias, no meio do obscurantismo que se desculpa de causa política, no meio da estupidez que se vangloria de "combater" tudo quanto seja vivo, se subsiste ainda um resto de esperança seria apenas para acreditar nos poucos e raros e últimos poetas que haja neste tempo e mundo.
Quer dizer: nos últimos que teimam em resistir, em manter a imagem do homem, o rosto humano do homem. "Liberté, couleur d'homme" (André Breton)

CONSCIÊNCIA OU PERSPECTIVA ECOLÓGICA

Ora a condição sine que non desse "rosto humano" e desse rosto vivo da vida, é a consciência ou perspectiva ecológica. É a noção intuitiva e consciente, calma mas exaltante, de que habitamos todos o mesmo planeta e o mesmo universo, de que tão importante é o homem na sua cama, na sua casa, na sua oficina de trabalho, na rua e no seu lugar de ócio, como o sol na sua rota cósmica, a árvore na floresta, o peixe no rio, a ave no céu.
Tão importante é a dor humana como a da ave ou da planta e tão importante o direito à subsistência material como o direito aos imponderáveis afectivos, imaginativos, artísticos, que qualificam a existência.
Poeta, é o que mantém, ainda, apesar de tudo e contra todos, essa consciência original da unidade perdida, o que teima em religar, pela palavra simbólica, esses elementos da mesma unidade e do mesmo esplendor cósmico que uma civilização atomizante, homicida, pulverizou e dilacerou.
Poeta, seria o que ainda não se deixou vencer pelas mitologias estúpidas, pelos alibis, pelos slogans do especialismo, do cientifismo, do tecnicismo, do divisionismo estéril e criminoso (criminoso porque estéril), estes sim, os principais mecanismos ao serviço de todas as ideologias no processo de aviltamento humano e de abjecção.
Ora a forma de colaboracionismo com a Abjecção hoje mais directa é destituir a consciência ecológica do seu lugar prioritário em relação a tudo o que se passa sobre o planeta terráqueo (só há uma maneira de se destituir a ecologia dessa prioridade: é mudar de planeta).
Porque ela (consciência ecológica) unifica onde os outros dividem, pesa e dignifica onde os outros segregam e degradam, porque ela defende a vida onde os outros atulham de química, porque ela respeita a criação onde os outros perpetram sistemático biocídio, porque ela sustenta o amor e a liberdade onde os outros, por um prato de lentilhas, se vendem à escravidão do consumismo e à histeria das violências paternalistas (incluindo a violência das cirurgias, das vacinas ou de outras a quem ninguém alude - porquê?).
Precisamente porque não é a vida de um só homem que me preocupa, mas a vida de todos os homens (incluindo os que morrem na Indochina com desfolhantes) é que me preocupa um metro quadrado de floresta e vice-versa. Porque me preocupa saber, por exemplo, se cada folha de papel em branco que é gasta (que eu gasto) a aproveitei no verdadeiro sentido ou se andei também a desperdiçar, com ela, floresta.
E preocupa-me saber isso, não só pela tal razão do ecossistema (todas as formas de vida são interdependentes, não sou eu que o digo, mas os cientistas); não só pela razão do ecossistema, que é razão mais que suficiente, mas porque só a consciência do Ecocídio é hoje consciência humana do homem, simultaneamente (pre) ocupada a nível universal e a nível individual.

POLUENTES E ANTI-POLUENTES

Quando falo de consciência ecológica (a tal que o “slogan" da palavra "poluição" tenta reduzir demagogicamente e também a um dilemazinho caseiro entre poluentes e anti-poluentes, a um problema portanto doméstico de lixo que se produz e de lixo que logo a seguir se varre, indo todos p’ra casa satisfeitos) penso em todos os homens que morrem porque o ambiente inumano os assassina, a curto ou longo prazo: ambiente que é a casa, a rua, a oficina, a cidade, o país, a cultura, a ideologia, o partido, todos os círculos concêntricos de que o indivíduo é o centro e dentro dos quais está inserido, envolvido e de que fatalmente é função.
Quando falo de meio inumano penso, por exemplo, num dos múltiplos capítulos que os palradores da "poluição" sistemática e cautelosamente omitem: as doenças de ambiente, que são quase todas, quer as congénitas como o mongolismo, quer as infecto-contagiosas como a tuberculose, quer as endémicas como o paludismo e a cólera, quer as degenerativas como o cancro e as cardíacas, quer as traumáticas como os acidentes de viação e os acidentes de trabalho, etc etc.
A causa das causas é sempre de ambiente; os homens sofrem, porque o ambiente os faz sofrer, porque lhes cria carências - desde a fome ao afecto - , porque os aliena, porque os traumatiza, porque os violenta, porque os intoxica, porque os adoece, porque os tiraniza, porque os escraviza, porque centenas de anos de pseudo-civilização em vez de pura e simplesmente lhes humanizar o ambiente natural apenas lho degradou, sem, em troca, lhes dar um ambiente artificial mas humano.

ATENÇÃO SIMULTÂNEA AO TODO UNIVERSAL E AO LOCAL

O que a consciência ecológica permite (e só ela, especìficamente, permite) é a justa hierarquia de todos os seres viventes e da sua relacionação, sem segregações, sem racismos, sem favoritismos, sem padrões ou cânones paternalistas. Só a consciência ecológica é uma interconjugação de criaturas, é uma atenção simultânea ao todo universal e ao local, ao regional, ao individual.

Má fé é acusar a Ecologia de preferir a árvore ao homem, quando a Ecologia é o esforço sobrehumano de resistência à vaga homicida que precisamente pretende sobrepor (e com que sanha, Deus nosso) ao homem e à árvore (aos seres vivos no seu conjunto) o objecto, o inerte, o inorgânico, o químico, o material, o mecânico, o motorizado, enfim, toda a coisa mecânico-tecnicista. Este o dilema e não, e nunca homem contra árvore.


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(*) Este texto de Afonso Cautela, foi publicado no «Diário do Alentejo», (Beja) , em 12 de Abril de 1973, graças à atenção e hospitalidade do meu querido e inesquecível amigo José António Moedas
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ANIMAIS 1998

8472 caracteres - 3 páginas - animais> para um manifesto

12-4-1998

ANIMAIS NOSSOS AMIGOS por Bento Fernandes(heterónimo de AC)

Antes que, na Assembleia da República, seja agendada a discussão do projecto-lei sobre direitos dos animais, é o momento de lançar algumas achas para a fogueira, algumas sugestões, ideias e críticas que animem o debate e atiçem os excelentíssimos senhores deputados.
Em direitos de animais, estamos ainda mais atrasados do que em direitos humanos. O que quer dizer que, em nível cultural e civilizacional, nos aproximamos das cavernas.
Há cem anos que a campanha naturovegetariana, privilegiando os aspectos moralistas do problema, não tem conseguido mobilizar as consciências e as vontades. É preciso passar dos sermões moralistas para a exigência ética e esse salto está longe de ter sido dado.
No que à Ética ecológica respeita, a passividade impera e a revolta silencia-se. Os próprios ambientalistas têm ajudado a silenciar os aspectos mais gritantes de ecologia humana e animal. As organizações particulares de protecção e defesa dos animais têm uma vida difícil e algumas acabam por desaparecer. É preciso, no entanto, que proliferem como cogumelos. Quantas mais, melhor.
A moda dos «animais de estimação», em boa hora incentivada pelas grandes marcas de alimentos enlatados, é apenas uma moda. Mas é melhor que nada.
Fazendo contra-vapor a todas as boas intenções e boas vontades em favor dos animais nossos irmãos - como S. Francisco de Assis cantou - há os poderosos interesses corporativos, as poderosas classes daqueles que, na caça e na pesca, encontram o seu desporto favorito. Mas não é a pena de morte para humanos moeda corrente ainda hoje em muitos países que se dizem civilizados?
Há os interesses das indústrias que utilizam em laboratório os animais como cobaia de experiências, sempre atrozes. Mas no campo da medicina humana, por exemplo, não são os diagnósticos cruentos, por vezes, também de uma enorme crueldade, com a desculpa da utilidade necessária? E não se experimentam medicamentos em humanos?
Em matéria de agitação mediática, a opinião pública é aturdida com a doença das vacas loucas, com a peste dos aviários, com a brucelose, com a peste suína, com os mil e um vírus que decidem, de uma hora para a outra, infestar o mundo dos humanos coitadinhos.
Já que não há consciência e se mantêm durante dez anos cabras com brucelose para empochar os subsídios de um governo sempre manso e sempre benemérito, haja ao menos vergonha: e reconheça-se que todo esse holocausto a que estamos a assistir - com abates que evocam os grandes genocídios da História - é da pura e simples responsabilidade do nosso comportamento para com os animais nossos companheiros de viagem no planeta Terra. Do nosso carnivorismo devorador. A famosa fome do 3º Mundo, em grande parte, deriva também daí: o abismo entre pobres e ricos, mantido pelos blocos hegemónicos que disputam os recursos da Terra, é agravado pelos absurdos hábitos alimentares que colocam a carne no topo da alimentação proteica, quando ela devia e podia estar apenas como um complemento a ser usado em último recurso e em condições especiais de necessidade de sobrevivência (o caso tão conhecido dos esquimós). Nem só de hamburgers morre o homem.
Os naturo-vegetarianos já provaram , pelas ideias e pelo comportamento, que as alternativas vegetais, nomeadamente a Soja, à proteína cárnea são simultâneamente mais saudáveis e mais económicas. Bastava desperdiçar menos recursos e haveria proteína para todos. Mas como o desperdício acciona os mecanismos do lucro, o busílís reside aí e os animais continuarão a ser sacrificados assim como a Amazónia, o tal pulmão verde da terra que está no centro desta problemática «proteica», com os hamburgers à espreita.

Curiosa e inesperadamente, o Notícias Magazine (12/4/1998) inseria um artigo de Fernanda Câncio, a vários títulos insólito no panorama mediático deste país sempre mais virado para as tagarelices habituais do futebol, fado e circo. Fernanda Câncio - a quem endereçamos daqui a nossa homenagem - inventariava em termos apaixonados, mandando às malvas a famosa objectividade jornalística, as atrocidades e barbaridades cometidas secularmente contra os animais mas principalmente aquelas que se praticam em nome do PROGRESSO.
É um panorama aterrador, o do progresso, que coloca o bípede dito humano no fim da escala dos seres vivos. No entanto, todos os sistemas ideológico-filosóficos, colocam-no no topo: inversão de valores caricata.

A Natureza acaba por responder aos atentados ecológicos contra as espécies - esperam alguns - mas responde devagar e mansamente. Vacas loucas, peste de aviário, brucelose, peste suína, não são epidemias suficientes que travem a perversidade humana relativamente às espécies que neste Planeta são seus companheiros de eleição. Um mundo sem animais seria mais aterrador ainda do que é. Mas nunca deixará de ser aterrador enquanto não houver uma viragem de 180 graus nos hábitos de relacionamento inter-espécies, a começar nos hábitos alimentares. Viragem que é o famoso Novo Paradigma que alguns hoje propõem como única saída para o holocausto.
A sociedade de consumo está cheia de «necessidades» artificialmente criadas ou de coisas supérfluas que se institucionalizam como necessárias. O desperdício do luxo e do lixo é o que está matando o Planeta e tudo o que nele vive.
As razões invocadas para justificar a violência e tortura de animais são tudo apriorismos e sofismas do velho paradigma, hábil malabarista em justificar o crime. E nem sequer deveria haver discussão entre gente que se considere adulta e vacinada. Razões dos fortes contra o fraco são razões ignóbeis. Como Fernanda Câncio referia no já citado artigo do «Notícias Magazine», a experiência científica e laboratorial pretende ser uma forma «útil» de tortura. Esta hipocrisia liofilizada da liofilizada ciência (sempre com as mãos limpas porque usa luvas de borracha) é uma falsidade sem nome.
O curioso é que o referido «Notícias Magazine» nunca perde ocasião de exaltar o Velho paradigma (com artigos comprados à revista «Science et Vie») . Caso para dizer que Fernanda Câncio conseguiu meter uma lança em África, ou seja, publicar um artigo onde a ciência não sai tão limpa e ilesa como se costuma ler no magazine da D. Isabel Stilwell. Não esquecemos a campanha que ali tem sido movida contra a medicina natural e os produtos naturais. Mais uma vez, o forte batendo no fraco, cena triste , ignóbil e abjecta.

Depois da lei 92/95 de 12 de Setembro, de iniciativa do deputado do PSD António Maria Pereira, ter sofrido tratos de polé e ficado sujeita às risadas e troças das esquerdistas bancadas, é o Partido Socialista que em Setembro do ano passao, perdendo a vergonha e já sem medo de ser apelidado de direitista, apresenta na AR um projecto-lei, por iniciativa da deputada Rosa Maria Albernàs.
É pouco mas que sirva, ao menos, para atanazar os fortalhaços pais da pátria para quem os animais não são assunto prioritário. Os tais que, falando em direitos dos animais, perguntam sempre se as pulgas e as moscas também vão ficar abrangidas.
Este tipo de piada talvez não se ouça, mas como alertava a Maria do Céu Sampaio, presidente da Liga Portuguesa dos Direitos do Animal, precisamos de começar a ridicularizar os que ridicularizam os animais e os seus direitos.
É urgente instituir penas (e penas duras) de multa e prisão para os que desrespeitam os direitos dos animais . E embora, quando sair, já esteja desactualizada, é urgente aprovar a lei que reequilibre, neste campo, a correlação de forças entre opressores e oprimido.
Os direitos do animal só serão total e absolutamente respeitados quando os seres humanos tiverem uma concepção ética , quer dizer religiosa e espiritual, da vida e decidirem ser humanos começando por se respeitar a si próprios. A evolução que se exige e espera, portanto, é espiritual. Obviamente. E só com os animais, com a sua presença, ajuda e cooperação, o ser humano conseguirá dar o salto para a tão cantada Era do Aquário, tão inevitável a nível cósmico como a lei da gravidade a nível do sistema solar.
Um lei, por moderada que ainda seja à luz desta ética exigente, é apenas um pequeno passo. Não tardem em dar esse passinho, senhores deputados. Só lhes fica bem. E vão ganhar votos. Porque se há unanimidade absoluta é nisto: todos os portugueses amam os animais... nem que seja de churrasco.
BENTO FERNANDES
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DEEP ECOLOGY 1973

marcuse-1> - inédito ac de 1973 (parcialmente publicado?) – os anos cruciais - os dossiês do silêncio – polémicas ac com o meio ambiente – mein kampf – os guardas do gulag – da esquerda à esquerda

A CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA E A ESQUERDA DISTRAÍDA

12/4/1973 - No debate que, em 13 de Junho de 1972, o semanário Le Nouvel Observateur promoveu sobre Ecologia e Revolução, Herbert Marcuse salientou, muito a propósito, a capacidade que o Sistema tem para recuperar o que o critica. Daí a actualidade que a contestação tomou em todo o mundo, e daí que não haja hoje praticamente parte alguma em que não se fale e pratique o reformismo, que é precisamente a resposta do Sistema às críticas recebidas.
Se a crítica ao Sistema, efectuada por uma certa esquerda, alguma vez foi relevante, em relação às metamorfoses, regra geral subtis, que o Sistema e seus mecanismos de opressão vai tomando, essa crítica encontra-se hoje desactualizada e em adiantado estado de esclerose o comportamento político (que lhe fica) contíguo.
Esquece uma certa esquerda necrófila (entregue às glórias do passado), imobilista (incapaz de acertar o passo prospectivo com os acontecimentos), dogmática ( cristalizada em fórmulas feitas e em lugares comuns), esquece que o Sistema depressa cria imunidade aos ataques vindos do espaço exterior, tal como os insectos saem mais fortes quanto mais fortes são as doses de DDT que lhes aplicam. E os ratos.
Esquece uma certa esquerda, distraída e ultrapassada, que o Sistema para sobreviver lança mão de mecanismos repressivos e opressivos, muito menos claros do que outrora, mais subtis, muito mais enganadores porque se disfarçam sob as formas do proteccionismo, do paternalismo e do reformismo. Mecanismos capazes de enganar, portanto, os próprios esquerdistas, que, mal informados da evolução e das mutações verificadas nos processos contra-ofensivos do Sistema, sem o sentido crítico da História e sem consciência total da Abjecção totalitária (sem consciência ecológica) se deixam enredar neles, deles sendo os primeiros sequazes.

PERDEU VIRULÊNCIA

Se a crítica de certa esquerda teve alguma relevância, há anos, perdeu essa virulência quando perdeu a consciência e a noção do conjunto totalitário em que o Sistema se define e age.
Até, que mais não fosse, por contra-ofensiva à pressão das esquerdas, à existência de um Bloco Socialista, à descolonização do Terceiro Mundo e a todos os fenómenos “esquerdizantes", as direitas tomaram providências e, é evidente, deixaram de querer apanhar moscas com vinagre; começaram a usurpar a terminologia democrática; falam de salários e de justiça social; falam de reivindicações e do direito à greve; a direita chega a fingir que esquece o seu gosto pelo autoritarismo e até fala de diálogo, preconiza formas demoparlamentares, fala de um "partido monárquico' ou de um deputado maurrasiano; enfim, a fome do Mundo liofilizou-se através dos organismos internacionais encarregados disso e, de ajuda com as encíclicas sociais, a direita pode manifestar-se condoída pela sorte dos subdesenvolvidos; inventou-se a democracia cristã, houve mesmo bispos e padres propostos para o Prémio Nobel (que nunca falta nestas manobras recuperadoras do Sistema) que se tornaram famosos pela sua irreverência e, soi disant, inconformismo; celebram-se contratos de trabalho entre classe operária e classe patronal, reconhece-se que a "luta de classes" deve ser adoçada pela convivência das classes; a burguesia, mesmo, gosta de novelistas neo-realistas, lê a obra completa de Jorge Amado e Alves Redol, compra e põe nas estantes, vai ver os filmes inconformistas de Joseph Losey e, de propósito, é capaz de voar a Paris para ver "Decamerone" ou outra estreia aconselhada não pelo Le Figaro mas pelo Le Nouvel Observateur; raro é o dia em que as maiores personalidades mundiais não aludem à reforma educativa, no âmbito da OCDE, da UNESCO, do Conselho da Europa em Estrasburgo, etc; à reforma hospitalar, à reforma assistencial; já se "assiste" o trabalhador, de contrário ele emigra; já não se consente no desemprego, antes pelo contrário, há organismos especializados para garantir o pleno emprego e a procura excede a oferta no mercado do trabalho; a direita vai aprendendo, recuperando, assimilando o que antes fora a crítica feita por certa esquerda ; a tortura bárbara e crua evita-se e só em casos especiais se pratica, mesmo os "progroms" começam a ser mais raros, ninguém quer ver-se comparado a Hitler ou a Estaline, dois nomes que se impopularizaram através das conjunturas; a direita sabe que as formas indirectas, infiltrantes, difusas, são mais eficazes: duram mais tempo, atingem mais fundo, depositam-se no inconsciente colectivo que é a melhor reserva humana de conformismo, não suscitam ódios dos partidos inimigos, nem sequer são notados porque imponderáveis e invisíveis; preconiza-se mesmo, em discursos não menos humanitários e de não menor sentido social, o estímulo ao cooperativismo (agropecuário) e à organização sindical dos trabalhadores.

TRIBUNAIS DO POVO

Mas há uma certa esquerda que ignora toda esta estratégia de recuperação e continua criticando nos termos em que o fazia há muitos anos atrás. E é essa esquerda, (necrófila, saudosista, cristalizada em determinada fase histórica) que entende meter o franco-atirador no gueto, acusando-o de traição e reacção; é essa esquerda paralítica que ameaça de "tribunal sumário" e do povo o homem lúcido e consciente, atento aos factos e às realidades não iludido por mitos e fantasmas, é essa esquerda pequeno-burguesa e revisionista, liberalesca e parlamentar, reformista e pró-sindical, que nada fez para evoluir e actualizar-se (nem sequer ter ideias, que é a única faina patriótica num mundo de tarados e de imbecis), mas que, provocatoriamente, com um desaforo de desvergonha, quer obrigar os outros a ficar tão imóvel e cristalizada como eles.

OLÍMPIO DA DIREITA BAIXA

Eduardo Olímpio surge-me inopinamente dessa outra ala esquerda; ele que escreveu um livro de poemas intitulado O Franco-Atirador , ele que eu supunha perto das minhas preocupações e solidário na mesma segregação sofrida de sacristas e doutores pequeno burgueses, únicos com direito a levantar cabeça, opressores deste lumpen proletariado intelectual a que ele Olímpio e eu Afonso nos orgulhamos de pertencer; ele que eu julgava tão longe da esquerda necrófila, eis que se apresenta, pela direita baixa, acintoso, verrinoso, a querer-me processar (também!) , julgar e condenar. Tudo em processo (muito) sumário.
Só é pena que o Olímpio, ao fim e ao resto, recente foragido para esse campo de mortos, seja tão mau representante dessa outra e certa esquerda necrófila. Mas, ao fim e ao resto, foi ele que se me atirou desta feita às canelas e é a seu pretexto que deverei formular a minha própria defesa.

OS MECANISMOS DE OPRESSÃO

Esquecem os necrófilos passadistas, que os mecanismos de opressão, hoje, passam pelo conforto, como ontem passavam pela fome, pelo desemprego, pelo chicote ou pela violência; ainda se gasta muito disto (à esquerda e à direita) , mas os mecanismos de opressão que conseguem hoje alienar mais profunda e definitivamente os homens, embrutecê-1os e neutralizá-los, não são tão claros, tão evidentes, tão tradicionais.
E é disso, de ignorar as novas e terríveis armas da opressão doce, que se pode acusar, em absoluta consciência, uma certa esquerda distraída. Ela é que será, em tempo próximo, passível de tribunal da história e julgada; não os poucos que se limitam a ser testemunhas de acusação e de defesa do seu tempo, a estar lúcidos no meio do ecocídio generalizado.
Veremos, afinal, quem é que a humanidade vai julgar. Diga-se, aliás, que é esse o único julgamento que espero e desejo. Esse o juízo que estimo e respeito, não as histéricas convulsões da esquerda necrófila dos Eduardos em transe, acusando-me de mirabolâncias que são afinal, apenas, os fantasmas das suas próprias e ensandecidas cabecinhas, contaminadas também pela doença geral, lavadas pelos subtis processos de manipulação intensiva.
Ignora a esquerda distraída que dos próprios instrumentos de prosperidade, do próprio desenvolvimento económico, do próprio crescimento tecnológico e da própria explosão industrial (instrumentos em princípio muito solicitados pela esquerda necrófila) faz a direita (disfarçada de esquerda coexistente e progressista) os seus instrumentos de ataque, a sua arma de guerra.
A grande descoberta das direitas( que a esquerda ainda não conseguiu assimilar, provando a tese de Marcuse que a direita tem uma capacidade de encaixe e recuperação muito maior e mais veloz) foi utilizar o desafio das críticas, dizer que ia fazer e, fazendo ou fingindo, conseguir objectivos precisamente opostos aos , em princípio, preconizados pela esquerda.
É isso que a esquerda míope nunca mais vê, miopia que neste caso se pode ir classificando de crime.

A TOTALIDADE UNIDIMENSIONAL DA ABJECÇÃO

Além da característica enunciada por Marcuse - o chamado poder de encaixe, capacidade de recuperação e rapidez de resposta que tem o Sistema para aquilo que o critica - têm de comum ainda os mecanismos de opressão as circunstâncias seguintes:

1 - atingem, indiscriminadamente todas as classes, todos os seres humanos, todos os que se encontram economicamente mais débeis e numa dependência maior do meio ambiente e que, portanto, são os mais sensíveis: a água dos oceanos envenenada, o ar poluído, a hecatombe automóvel, o biocídio químico dos solos, a violência da alopatia e da cirurgia, todos os sectores do ambiente, em suma, levam de comum terem abolido as classes... Ou melhor, instaurado uma nova luta de classes entre sensíveis e insensíveis. De facto, a matança é indiscriminada, independente de raça, classe, idade, sexo ou crença religiosa; como soe dizer-se;

2 - a não espectacularidade do homicídio ambiente, é outro factor típico, específico desta opressão que certa critica ainda não atingiu: a infiltração lenta e insidiosa ( e nem só da radioactividade, a mais insidiosa de todas), a contaminação subterrânea e clandestina, característica típica e específica do homicídio ambiente, explica que não se torne visível ao observador de rotina que é sempre o observador prejudicado por pré conceitos e pré-juízos de grupo, partido, tertúlia ou escola de pensamento e ideologia; como é insidiosa e lenta, ninguém dá pela invasão, pela infiltração, pela contaminação (palavra que, por isso, se prefere à marota palavra "poluição");

3 - Absoluta generalidade, para lá de blocos, ideologias, regimes;

4 - Economia absoluta deste tipo de opressão: a opressão ambiente, com efeito, não precisa de burocracias, serviços, dactilógrafas, funcionários, policiamento ou cacetete; está estabelecida e age por si, a qualquer hora, sempre, em todas as circunstâncias; a opressão pelo ruído, por exemplo, que é só por si um programa que nem o mais requintado arquitecto de concentracionários poderia inventar, não precisa de nada nem de ninguém para se exercer; melhor, são as próprias vítimas da opressão pelo ruído que o produzem, ficando assim completamente gratuitos estes belos servidos prestados à comunidade...


5 - A opressão ambiente acirra a guerra civil entre os homens porque, sendo a fonte da opressão ambiente, abstracta (embora manifestada a níveis concretos, locais) e o carrasco um alvo invisível, ou tão vasto que se torna inalcançável, que deixa de ser alvo, a revolta dos indivíduos ainda não completamente condicionados dentro da jaula vira-se contra os próprios, que se entredevoram na mesma jaula, num canibalismo ecológico que foi a grande invenção dos concentracionários nazis: como se sabe, bastava deixar que, nos campas de morte, os prisioneiros se esfacelassem uns aos outros, sem suplementares despesas com a exterminação.

6 - A principal característica da opressão ambiente, porém, além das cinco enunciadas, é passar despercebida ao pretensamente mais evoluído, mais crítico e mais lúcido, mas que no entanto continua condicionado, até certo ponto, pela totalidade “unidimensional" da Abjecção.
Resulta daqui que essa totalidade unidimensional pode continuar a usar o crítico, sem qualquer oposição da esquerda necrófila (anterior à consciência ecológica), que dorme a sono solto e repetindo a espaços, com um olho aberto e outro fechado, os slogans da mitologia tecnocrática, já repetidos há vinte anos, no alvor da matança, quando começou o ecocídio acelerado e a opressão/repressão ambiente em escala planetária.
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