FERREL 1998
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19/1/1998
O testemunho pedido pelo jornal «Gazeta das Caldas»:
19/1/1998- Outros, com mais memória, poderão recordar em pormenor o que foi, há vinte anos, a jornada de Ferrel, no contexto das actividades antinucleares em Portugal. Eu aproveitaria este convite da «Gazeta das Caldas» para sublinhar alguns dos silêncios e silenciamentos que na área das movimentações ecologistas e eco-alternativas se têm verificado desde essa época.
Deste ponto de vista foram, de facto, tempos heróicos e, utopia ou não, a verdade é que a ecologia servia de bandeira para questionar radicalmente a sociedade de consumo e do tecno-terror. Tudo isso foi ficando nas gavetas dos militantes e dos ministérios, no silêncio dos que desistiram de levantar a voz, na demissão dos mais impacientes.
A revista «Ar Livre» e a teimosia do José Carlos Marques são, neste panorama, a única excepção.
Os reformistas do ambiente venceram em toda a linha.
E nem vale a pena perguntar, para só falar de projectos oficiais, onde estão os seis ou sete projectos-piloto de energias renováveis que, primeiro na então Direcção Geral de Energia, transitaram para o LNETI, onde dormem desde então, desde o Veiga Simão que agora está na defesa antiaérea, o sono dos justos.
Para só referir a área energética e porque não basta lutar contra o nuclear, se não forem apontadas alternativas credíveis, lembremos a campanha dos ecologistas para a reciclagem sistemática de materiais que depois algumas autarquias recuperaram, por aí, na municipalização se ficando.
Sem sair da questão energética, deveremos perguntar para que foi afinal tanto esforço de alguns militantes como o Ribeiro Telles, na luta contra a megalomania da barragem de Alqueva que a CE agora ajuda a concretizar em vez de incentivar um plano de pequenas barragens. A loucura irá por diante, apenas com o protesto, que eu saiba, de dois ecologistas: o arquitecto Fernando Pessoa e o Carlos Filipe Marreiros da Luz que sobre a aldeia da Luz elaborou o estudo mais sério e completo.
Interrogado sobre o que pensava do tesouro megalítico alentejano que vai ser engolido pela barragem, o célebre arqueólogo Cláudio Torres disse que as razões de ordem política e partidária falavam mais alto do que o amor à arqueologia. E, digo eu, que o respeito pelo sagrado que o tesouro megalítico representa, no Alentejo como em Foz Coa. Este episódio ilustra até que ponto a luta ecologista perdeu a grande e decisiva guerra, se é que ganhou algumas batalhas.
Os sismos provocados pelos testes subterrâneos com bombas termonucleares, em países como ex-URSS, EUA, França, são outro aspecto do terror nuclear que, omisso das preocupações ecologistas já no tempo de Ferrel, omisso continuará a ser até à consumação dos séculos (tratando-se de radiações, é essa a escala de tempo...).
Sem sair do nuclear, onde estão as campanhas sobre o perigo das radiações ionizantes que nos cercam por todos os lados? As mil e uma fontes de radiações deixaram de ser perigosas ou deixaram de existir? Quem silenciou o assunto e porquê? Por ser um dos dossiês mais sensíveis de Ecologia Humana? Bom, mas ecologia humana é, por si só, toda uma área que, dentro do ecologismo tout court, foi sempre tabu, como tabu foi a ecologia do trabalho ou a ecologia alimentar, por mais esforços que os das terapias doces tenham posto para denunciar o «cancro que está no ambiente» (nomeadamente o ambiente químico).
E como as poluições (químicas ou radioactivas) são como as cerejas, falando de química teremos de falar na iatrogénese que, desde Ivan Illich e seu livro «Limites para a medicina», caiu num sepulcral olvido como se não dissesse respeito ao dia a dia de todos nós.
A campanha contra os pesticidas, onde está? A florescente agricultura biológica foi talvez, em saldo final, a primeira e única grande vitória dos ecologistas. Todas as outras alternativas de vida - as tão proclamadas tecnologias leves - ficaram esquecidas.
O negócio que se instalou à sombra da energia solar poderá considerar-se meia vitória. Mas derrota parece ter sido o que em certa altura foi uma alternativa tão promissora: o biogás em explorações agrícolas. E a energia das ondas, de que havia protótipos portugueses tão interessantes?
Falando dos livros e autores que as novas gerações deixaram de ler, quantos nomes teríamos de lembrar? Alguma vez o movimento ecologista se pensou a sério a si mesmo? A análise energética, revelada pelo Prof. Delgado Domingos, quem mais se ocupou dessa disciplina fundamental? E sobre a Entropia, quem, além do Prof. Gomes Guerreiro, voltou a pensar nisso?
Falando de Bionergia, perguntem ao sr Afonso Cautela que conversa de surdos, na travessa-do-fala-só, têm sido os milhares de páginas escritas sobre o assunto: e o que irá ser dessa aventura que, depois da ecologia e da holística, se configura agora como a física ou energética do espírito: a Noologia, ciência das 12 ciências sagradas?
Relativamente vitoriosa saiu a bioenergética chinesa do yin-yang, não só pela sua vetusta antiguidade mas porque o sistema taoísta pode constituir, só por si, uma autêntica alternativa de vida aos becos sem saída ocidentais.
Por mais que, a propósito de bioenergia, se fale de uma «ecologia alargada» - onde o factor cósmico e vibratório entre como protagonista de toda a evolução humana - os ouvidos permanecem surdos, tal como há vinte anos os que intransigentemente se entricheiravam no absurdo das centrais nucleares em geral e na de Ferrel em particular.
Se um dia a «Gazeta das Caldas» quiser lembrar alguns dossiês que, malditos, foram ficando pelo caminho, pode ser que, nos papéis que restam aqui por casa, ainda vamos a tempo de encontrar os registos e documentos para inventariar tantos silêncios, tantos silenciamentos, tantos tabus.
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19/1/1998
HOJE COMO HÁ VINTE ANOS
DA ENERGIA À BIOENERGIA:
OS DOSSIÊS QUE FAZEM DA ECOLOGIA UMA CIÊNCIA ESQUECIDA
O testemunho pedido pelo jornal «Gazeta das Caldas»:
19/1/1998- Outros, com mais memória, poderão recordar em pormenor o que foi, há vinte anos, a jornada de Ferrel, no contexto das actividades antinucleares em Portugal. Eu aproveitaria este convite da «Gazeta das Caldas» para sublinhar alguns dos silêncios e silenciamentos que na área das movimentações ecologistas e eco-alternativas se têm verificado desde essa época.
Deste ponto de vista foram, de facto, tempos heróicos e, utopia ou não, a verdade é que a ecologia servia de bandeira para questionar radicalmente a sociedade de consumo e do tecno-terror. Tudo isso foi ficando nas gavetas dos militantes e dos ministérios, no silêncio dos que desistiram de levantar a voz, na demissão dos mais impacientes.
A revista «Ar Livre» e a teimosia do José Carlos Marques são, neste panorama, a única excepção.
Os reformistas do ambiente venceram em toda a linha.
E nem vale a pena perguntar, para só falar de projectos oficiais, onde estão os seis ou sete projectos-piloto de energias renováveis que, primeiro na então Direcção Geral de Energia, transitaram para o LNETI, onde dormem desde então, desde o Veiga Simão que agora está na defesa antiaérea, o sono dos justos.
Para só referir a área energética e porque não basta lutar contra o nuclear, se não forem apontadas alternativas credíveis, lembremos a campanha dos ecologistas para a reciclagem sistemática de materiais que depois algumas autarquias recuperaram, por aí, na municipalização se ficando.
Sem sair da questão energética, deveremos perguntar para que foi afinal tanto esforço de alguns militantes como o Ribeiro Telles, na luta contra a megalomania da barragem de Alqueva que a CE agora ajuda a concretizar em vez de incentivar um plano de pequenas barragens. A loucura irá por diante, apenas com o protesto, que eu saiba, de dois ecologistas: o arquitecto Fernando Pessoa e o Carlos Filipe Marreiros da Luz que sobre a aldeia da Luz elaborou o estudo mais sério e completo.
Interrogado sobre o que pensava do tesouro megalítico alentejano que vai ser engolido pela barragem, o célebre arqueólogo Cláudio Torres disse que as razões de ordem política e partidária falavam mais alto do que o amor à arqueologia. E, digo eu, que o respeito pelo sagrado que o tesouro megalítico representa, no Alentejo como em Foz Coa. Este episódio ilustra até que ponto a luta ecologista perdeu a grande e decisiva guerra, se é que ganhou algumas batalhas.
Os sismos provocados pelos testes subterrâneos com bombas termonucleares, em países como ex-URSS, EUA, França, são outro aspecto do terror nuclear que, omisso das preocupações ecologistas já no tempo de Ferrel, omisso continuará a ser até à consumação dos séculos (tratando-se de radiações, é essa a escala de tempo...).
Sem sair do nuclear, onde estão as campanhas sobre o perigo das radiações ionizantes que nos cercam por todos os lados? As mil e uma fontes de radiações deixaram de ser perigosas ou deixaram de existir? Quem silenciou o assunto e porquê? Por ser um dos dossiês mais sensíveis de Ecologia Humana? Bom, mas ecologia humana é, por si só, toda uma área que, dentro do ecologismo tout court, foi sempre tabu, como tabu foi a ecologia do trabalho ou a ecologia alimentar, por mais esforços que os das terapias doces tenham posto para denunciar o «cancro que está no ambiente» (nomeadamente o ambiente químico).
E como as poluições (químicas ou radioactivas) são como as cerejas, falando de química teremos de falar na iatrogénese que, desde Ivan Illich e seu livro «Limites para a medicina», caiu num sepulcral olvido como se não dissesse respeito ao dia a dia de todos nós.
A campanha contra os pesticidas, onde está? A florescente agricultura biológica foi talvez, em saldo final, a primeira e única grande vitória dos ecologistas. Todas as outras alternativas de vida - as tão proclamadas tecnologias leves - ficaram esquecidas.
O negócio que se instalou à sombra da energia solar poderá considerar-se meia vitória. Mas derrota parece ter sido o que em certa altura foi uma alternativa tão promissora: o biogás em explorações agrícolas. E a energia das ondas, de que havia protótipos portugueses tão interessantes?
Falando dos livros e autores que as novas gerações deixaram de ler, quantos nomes teríamos de lembrar? Alguma vez o movimento ecologista se pensou a sério a si mesmo? A análise energética, revelada pelo Prof. Delgado Domingos, quem mais se ocupou dessa disciplina fundamental? E sobre a Entropia, quem, além do Prof. Gomes Guerreiro, voltou a pensar nisso?
Falando de Bionergia, perguntem ao sr Afonso Cautela que conversa de surdos, na travessa-do-fala-só, têm sido os milhares de páginas escritas sobre o assunto: e o que irá ser dessa aventura que, depois da ecologia e da holística, se configura agora como a física ou energética do espírito: a Noologia, ciência das 12 ciências sagradas?
Relativamente vitoriosa saiu a bioenergética chinesa do yin-yang, não só pela sua vetusta antiguidade mas porque o sistema taoísta pode constituir, só por si, uma autêntica alternativa de vida aos becos sem saída ocidentais.
Por mais que, a propósito de bioenergia, se fale de uma «ecologia alargada» - onde o factor cósmico e vibratório entre como protagonista de toda a evolução humana - os ouvidos permanecem surdos, tal como há vinte anos os que intransigentemente se entricheiravam no absurdo das centrais nucleares em geral e na de Ferrel em particular.
Se um dia a «Gazeta das Caldas» quiser lembrar alguns dossiês que, malditos, foram ficando pelo caminho, pode ser que, nos papéis que restam aqui por casa, ainda vamos a tempo de encontrar os registos e documentos para inventariar tantos silêncios, tantos silenciamentos, tantos tabus.
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Etiquetas: práticas 2013