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2006-09-11

MEP 1982

1-2 - 82-09-11-je = jornal expresso - mep-10


PARTIDO «VERDE»: PEDRADA NO CHARCO OU MANOBRA POLÍTICA? (*)

(*) Este texto, não assinado mas que deve pertencer ao jornalista José Manuel Lopes, foi publicado no semanário «Expresso», 11-9-1982

A legalização, a meio desta semana, do «Movimento Ecológico Português» - Partido «Os Verdes» colheu de surpresa os meios ecologistas da capital. Organizações como os «Amigos da Terra» ou figuras marcantes como Afonso Cautela são totalmente alheias à iniciativa e ao esforço de recolha das poucas mais de cinco mil assinaturas que foram entregues no Supremo Tribunal de Justiça.
Pelo que conseguimos apurar junto dos promotores da nova formação política - que se autodefinem como «defensores da causa ecológica e amigos da Natureza» - a sua base assenta em vários grupos de activistas locais ligados, sobretudo, a protestos em defesa do meio ambiente.
Assim, entre os signatários encontrar-se-iam activistas da Comissão de Defesa do Rio Almonda e dos movimentos contra a Central Térmica a carvão de Viana do Castelo, a eucaliptação da serra de Ossa, a Central Nuclear de Ferrel-Peniche, a poluição dos rios Ave, Jamor e Alviela e das ribeiras de Odivelas e Barcarena, a eucaliptação selvagem da serra de Portel ou em defesa dos areinhos do Douro, das serras de Sintra e da Malcata e do sapal de Castro Marim.
Por outro lado, entre os seus principais dinamizadores, o novo partido parece contar com elementos mais ligados a Comissões de Defesa do Património Cultural que a agrupamentos ecológicos típicos. Para alguns observadores a entrega das assinaturas só foi possível porque se fugiu a certos ambientes ecologistas muito fechados e virados sobre si próprios. Recorde-se, de facto, que já em várias ocasiões activistas do movimento «verde» haviam proposto a criação de um partido, «à europeia», mas que todas as diligências nesse sentido ficavam bloqueadas por sectarizadas discussões internas.

PARTIDO: UM PROJECTO ANTIGO

Ainda recentemente, no Centro Nacional de Cultura, uma reunião de representantes de várias associações lisboetas terminaria sem resultados palpáveis devido ao «complexo de inércia», como no-lo designou um dos promotores da reunião, arquitecto Fernando Pessoa. Aquele técnico, que durante vários anos dirigiu o Serviço Nacional de Parques e Reservas, havia dias antes publicado na página de opinião do «Diário de Notícias» um quase apelo à constituição de um partido ecológico. Na sua opinião havia que, sobretudo, aproveitar as prerrogativas legais concedidas pelo «direito de antena» para ir divulgando o ideário ecologista mesmo que, por enquanto, se não pensasse numa intervenção política mais profunda e organizada.
Na ocasião, os restantes participantes na reunião, nomeadamente os elementos dos «Amigos da Terra», combateriam a ideia quer por falta de uniformidade ideológica, quer por advogarem uma intervenção mais individualizada no momento presente.
Posteriormente, os azedos debates que tiveram por palco Miranda do Douro durante o recente encontro de protesto contra a construção da central nuclear de Sayago pareciam afastar ainda mais a perspectiva de criação de um movimento organizado com âmbito nacional.
Foi assim natural a relativa surpresa sentida nos meios ecologistas e pela própria comunicação social. Elementos conhecedores do meio referiram-nos, no entanto, que o MEP-PV poderá corresponder a um esforço no sentido de, criando um facto consumado, romper um certo isolamento e imobilismo sentido entre os vários grupos. Por outro lado, poderá permitir ultrapassar a inércia sectarizada que, para muitos, constituiu a herança de traumas políticos passados.
Outros sectores, mais próximos das posições oficiais dos principais grupos ecologistas, sugerem em contrapartida que o novo partido teria sido lançado por forças próximas da APU e poderia vir a integrar-se na estratégia geral daquela força política. Em abono desta tese referem que o novo partido parece dispor de fortes núcleos de apoio na margem sul do Tejo - Barreiro, Moita e Montijo - e que em certos locais do país militantes do MDP teriam sido vistos a recolher assinaturas. Por outro lado, perguntam, «que outra máquina que não a ligada à APU teria podido reunir, à margem dos nossos grupos, cinco mil assinaturas sem que se desse por isso?».
Entretanto, os promotores do novo partido que, a curto prazo, tencionam abrir sedes em Lisboa, Porto e Coimbra, manifestaram-nos o seu maior interesse em dialogar com todos os movimentos ecológicos existentes. Isto mesmo quando elementos dos «Amigos da Terra» voltaram a repetir esta semana a sua intenção de se manterem à margem dos processos de institucionalização de uma corrente de opinião ecológica.
Mais: tudo indica que a reacção oficial de alguns dos movimentos ecológicos mais antigos poderá vir a ser muito violenta e de aberta oposição ao novo partido.

E AS AUTÁRQUICAS?

O MEP-PV , cujo arranque decisivo só deverá ocorrer lá para fins de Setembro e coincidir com uma conferência de imprensa a anunciar, poderá no entanto, vir a candidatar-se a algumas autarquias já nas próximas eleições. Esta hipótese tem vindo a ser discutida internamente, não se tendo ainda obtido qualquer consenso, mas a intenção confessa de criar em Portugal um movimento semelhante aos existentes em França e
na Alemanha dá-lhe consistência. Recorde-se que nesses dois países os ecologistas constituem uma força eleitoral de peso, sobretudo quando se disputam eleições locais. Na Alemanha, por exemplo, uma sondagem divulgada nos últimos dias indica que «os verdes» poderiam cativar nas próximas eleições qualquer coisa como 8 por
cento do eleitorado.
Os promotores do MEP-PV mostraram-se porém muito prudentes pois, como nos disse um seu porta-voz, «já tenho visto morrer projectos lindos porque se quer fazer tudo a correr. Iremos, mas iremos com calma, com tempo, com os pés bem assentes na terra».
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