INTERLAND 1988
pintasilgo-1> - os dossiês do silêncio – ecologia humana – publicado ac de 1988
PLATAFORMA EUROPEIA PARA O AMBIENTE ECODIREITOS HUMANOS (*)
(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «A Capital» (Crónica do Planeta Terra), 16/7/1988
16/7/1988 - Gerir o inferno que é a vida quotidiana dos cidadãos que trabalham e consomem nos países da Comunidade Económica Europeia, é o máximo que se pode propor fazer qualquer política do Ambiente, mesmo em sentido lato de "qualidade de vida", posta em vigor nesses países.
A menos que à frente do processo surja a personalidade carismática que, por força da sua própria energia criadora, altere as regras do jogo que , à beira do Abismo, a Europa continua a jogar, adiando o Apocalipse, com o ping-pong da chamada Poluição e Anti-Poluíção.
É o que poderá ou não acontecer com a Plataforma Europeia para o Ambiente, liderada em Portugal por Maria de Lurdes Pintasilgo, deputada no Parlamento Europeu.
O facto de ter surgido, em pleno Parlamento Europeu, esta iniciativa, já significa que alguma coisa falta fazer ou não vai bem no âmbito da política oficial europeia para o Ambiente. Se tudo já estivesse contemplado nas comissões oficialmente encarregadas para o efeito, não teria sentido esta Plataforma Europeia para o Ambiente assinada e proposta por quatro personalidades, três das quais são parlamentares europeus.
Trata-se de Brice Lalonde, director do Instituto para uma Política Europeia do Ambiente; François Roelants du Vivier, vice-presidente da Comissão do Ambiente do Parlamento Europeu; Carmen Diez de Rivera, membro do Parlamento Europeu, tal como Maria de Lurdes Pintasilgo.
O PING-PONG
Exemplo acabado das limitações inerentes à política oficial vigente, foi o Ano Europeu do Ambiente que praticamente não saiu do ping-pong da poluição e anti-poluição. Ou saiu, só para dar uma volta turística pela conservação da cegonha branca, da lontra castanha ou do lobo malhado.
Quando a espécie humana fica tão ostensivamente de fora destas estratégias ambientais e conservacionistas, como se as pessoas fossem leprosos irrecuperáveis, é de pensar duas coisas,
a) ou já ninguém dá nada por ela, vai deixar extinguir-se de morte matada e nada há a fazer para que a humanidade seja a primeira espécie em vias de extinção rápida;
b) Ou corre tudo no melhor dos mundos do senhor Pangloss, o homem afinal está de ferro e para durar, nenhuma doença degenerativa o mina, nada o afecta na sua sobrevivência e daí que o pessoal esteja todo contente, ao sol, contraindo cancro da pele por causa do buraco do ozono, em suma, muito mais preocupado com a Cegonha, a Lontra e o Lobo do que consigo próprio.
Mas é a Europa dos Doze que vem anunciar, apocalipticamente, o inverso deste último cenário paradisíaco, quando propôs em Março de 1988 a campanha "Europa contra o Cancro".
Segundo o que nos foi contado em programa que a Rádio Televisão Portuguesa passou, há semanas, o Cancro , afinal, é endémico nos países industrializados, tanto como a malária e a fome nos países do subdesenvolvimento crónico.
O Cancro, afinal, finalmente, mesmo na linguagem oficial europeia é uma Doença do Ambiente como a Malária e a Fome.
Chama-se Epidemiologia à ciência das epidemias. Daí que o referido programa televisivo, fabricado nos centros audio-visuais da Comunidade Europeia, em vez das garraiadas do costume sobre o que a Medicina ignora do Cancro, sempre ignorou e continua a ignorar, graças a Deus, avançou no único caminho lógico e ecológico, o da Epidemiologia. O único caminho que pode informar uma estratégia eficaz de contra-ataque ao referido flagelo do Cancro, diariamente produzido e fabricado, como diria o Senhor de La Palisse, por uma engrenagem de consumos e ambientes cancerígenos.
Se, como é óbvio e sempre o afirmaram as minorias insubmissas de franco-atiradores, o Cancro está no Ambiente, é fabricado pelo Ambiente, nada mais lógico e ecológico do que investigar os factores de ambiente que o provocam.
O referido programa televisivo não teve papas na língua e avançou por esse caminho que, evidentemente, desagrada às multinacionais (coitadas) mas é o único para chegarmos a respeitar minimamente os direitos ecológicos do homem, frequentemente reduzido à categoria económica de Consumidor.
Vem a Ecologia humana e fala de direitos à saúde, à segurança e à (qualidade de) vida. Poderá ser eventualmente o escândalo mas escândalo é sempre, em todo e qualquer lugar do Mundo, denunciar a violação dos direitos humanos.
Irá a "Plataforma Europeia para o Ambiente" no caminho lógico e ecológico dos eco-direitos humanos? Alguma vez há-de ser e mais vale tarde do que nunca. Esta "Crónica do Planeta Terra" fez dez anos de publicação regular semanal em 17 de Junho passado e , pelos vistos, ainda não perdeu a esperança. Porque não havemos de esperar mais dez anos para que os mais elementares direitos ecológicos do cidadão sejam respeitados ou sequer considerados?
O progresso, afinal, marcha lento, ao contrário do que nos dizem os emproados defensores da tecnocracia, que avaliam tudo pela bitola deles.
Mas se há que ter esperança na "Plataforma Europeia do Ambiente" porque está lá uma pessoa chamada Maria de Lurdes, não cantemos vitória antes de tempo porque - por exemplo - o discurso oficialmente debitado em Portugal pela comissão aqui encarregada de divulgar a campanha da "Europa contra o Cancro", elegeu como bode expiatório de todos os factores responsáveis pelo Cancro, imagine-se o quê: o Tabaco.
Eis Sua Excelência o Cigarro elevado aqui em Portugal, mercê das campanhas tele-orientadas, o único responsável pelo Cancro.
O Dr. Pádua mandou mesmo imprimir cartazes a cores para a sua campanha cardíaca com o dilema tão expressivo como simbólico: "O Tabaco ou a Saúde". Quer dizer, a gente corta o Tabaco e fica a gozar de saúde para o resto da vida. Nem mais nem menos.
Tantas vezes já nesta crónica tentámos desmistificar esta real mistificação dos problemas da chamada Saúde Pública, que nos abstemos por agora. Resumindo, apenas repetimos: a ideologia dominante continua a ser a pior de todas as toxicodependências.
O Tabaco serve de símbolo a todos os restantes mitos que bloqueiam a investigação de Ecologia Humana, mas não esgota evidentemente os factores epidemiológicos da Doença na sociedade industrial .
Em Ecologia Humana, tudo está por fazer, tudo está por investigar. Por exemplo: está por fazer o inventário dos produtos químicos disseminados no ambiente que provocam não só o Cancro, mas muitas outras doenças degenerativas e nem só.
DOENÇAS PROFISSIONAIS
Mesmo limitando o estudo às doenças profissionais, contraídas no local de Trabalho, área onde apesar de tudo a Ecologia Humana ainda tem progredido alguma coisa, que mais não seja por força de pressões sindicalistas, mesmo considerando apenas essa área de estudo, é patente a falta de vontade política em levar até ao fim e ao fundo as investigações: há três centenas de substâncias suspeitas mas a investigação - deliberada e voluntariamente lenta - só quis tirar a limpo, até agora, como comprovadamente cancerígenas, meia dúzia dessas substâncias.
É outro exemplo de que alguma coisa tem de mudar na investigação epidemiológica da Doença, que permanece área tabu numa sociedade industrial aparentemente tão liberal e libertina, mas só no que lhe interessa e no que não toca os seus fundamentos homicidas e biocidas.
Se uma "Plataforma Europeia do Ambiente" se ficar (só) pelas áreas da Poluição e da Anti-Poluição, de acordo com as regras impostas pelas multinacionais e pelo princípio social-democrata do Poluidor-Pagador, quem irá, entre alegados socialistas, ocupar-se do que no Ambiente afecta o metabolismo do consumidor, intoxica o seu organismo, altera as suas funções fisiológicas vitais, determina o seu comportamento aberrante e patogénico, etc.?
Se se teimar numa divisão de campos, dizendo que isso é matéria de Saúde Pública, a gente vai bater aos institutos (ditos) de Saúde Pública e dizem-nos que isso são problemas do Ambiente, nada tendo os médicos a ver com isso.
O jogo social-democrata tem sido este: os do Ambiente excluem a Saúde Pública e os da Saúde Pública excluem o Ambiente.
Em que ficamos, senhores socialistas?
Não será exactamente a Ecologia Humana, como ciência angular das ciências humanas em 1988, que fica nessa zona de fronteira, nessa "terra de ninguém", nesse "interland" que ninguém dos cientistas e dos políticos quer?
Mas quem, entre os ecólogos de serviço, assume, investiga, arrisca e programa as matérias terríveis que lhe cabem: e digo terríveis porque não há outra palavra para adjectivar o terror que é a vida quotidiana dos cidadãos, nos países do Mercado, em matéria de segurança, saúde e silêncio.
Quem acode aos cidadãos e aos direitos ecológicos dos cidadãos nos países deste Mercado?
Que "Plataforma” irá pegar no assunto tabu dessa ciência oculta e por enquanto esotérica que se chama Ecologia Humana?
Dinamizada por Maria de Lurdes Pintasilgo, a "Plataforma Europeia para o Ambiente" tem hoje, em Lisboa, a primeira "reunião de reflexão conjunta" para apreciar o dossier, alargar a Plataforma e preconizar "acções viáveis" dentro dos "pontos considerados na Plataforma."
A minha esperança de cidadão português na cidadã do Mundo que é Maria de Lurdes Pintasilgo residiu sempre neste ponto: é que a sua personalidade carismática, a sua criatividade transbordante, seja a energia necessária e possível para que possamos ir sempre além dos "pontos considerados nas diversas plataformas...".
É sempre necessário ir "além dos pontos agendados" para que uma verdadeira política humana (antropolítica, diria Edgar Morin), uma política de respeito pelos direitos ecológicos do cidadão, uma política da "qualidade de vida" e da recriação da vida quotidiana seja, um dia, ainda possível neste recanto ocidental da Europa, vocacionado para seu depósito de detritos.
Nesta terra onde a violação dos mais elementares direitos humanos (incluindo os ecológicos) continua a ser o pão nosso de cada dia.
- - - -
(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «A Capital» (Crónica do Planeta Terra), 16/7/1988
***
PLATAFORMA EUROPEIA PARA O AMBIENTE ECODIREITOS HUMANOS (*)
(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «A Capital» (Crónica do Planeta Terra), 16/7/1988
16/7/1988 - Gerir o inferno que é a vida quotidiana dos cidadãos que trabalham e consomem nos países da Comunidade Económica Europeia, é o máximo que se pode propor fazer qualquer política do Ambiente, mesmo em sentido lato de "qualidade de vida", posta em vigor nesses países.
A menos que à frente do processo surja a personalidade carismática que, por força da sua própria energia criadora, altere as regras do jogo que , à beira do Abismo, a Europa continua a jogar, adiando o Apocalipse, com o ping-pong da chamada Poluição e Anti-Poluíção.
É o que poderá ou não acontecer com a Plataforma Europeia para o Ambiente, liderada em Portugal por Maria de Lurdes Pintasilgo, deputada no Parlamento Europeu.
O facto de ter surgido, em pleno Parlamento Europeu, esta iniciativa, já significa que alguma coisa falta fazer ou não vai bem no âmbito da política oficial europeia para o Ambiente. Se tudo já estivesse contemplado nas comissões oficialmente encarregadas para o efeito, não teria sentido esta Plataforma Europeia para o Ambiente assinada e proposta por quatro personalidades, três das quais são parlamentares europeus.
Trata-se de Brice Lalonde, director do Instituto para uma Política Europeia do Ambiente; François Roelants du Vivier, vice-presidente da Comissão do Ambiente do Parlamento Europeu; Carmen Diez de Rivera, membro do Parlamento Europeu, tal como Maria de Lurdes Pintasilgo.
O PING-PONG
Exemplo acabado das limitações inerentes à política oficial vigente, foi o Ano Europeu do Ambiente que praticamente não saiu do ping-pong da poluição e anti-poluição. Ou saiu, só para dar uma volta turística pela conservação da cegonha branca, da lontra castanha ou do lobo malhado.
Quando a espécie humana fica tão ostensivamente de fora destas estratégias ambientais e conservacionistas, como se as pessoas fossem leprosos irrecuperáveis, é de pensar duas coisas,
a) ou já ninguém dá nada por ela, vai deixar extinguir-se de morte matada e nada há a fazer para que a humanidade seja a primeira espécie em vias de extinção rápida;
b) Ou corre tudo no melhor dos mundos do senhor Pangloss, o homem afinal está de ferro e para durar, nenhuma doença degenerativa o mina, nada o afecta na sua sobrevivência e daí que o pessoal esteja todo contente, ao sol, contraindo cancro da pele por causa do buraco do ozono, em suma, muito mais preocupado com a Cegonha, a Lontra e o Lobo do que consigo próprio.
Mas é a Europa dos Doze que vem anunciar, apocalipticamente, o inverso deste último cenário paradisíaco, quando propôs em Março de 1988 a campanha "Europa contra o Cancro".
Segundo o que nos foi contado em programa que a Rádio Televisão Portuguesa passou, há semanas, o Cancro , afinal, é endémico nos países industrializados, tanto como a malária e a fome nos países do subdesenvolvimento crónico.
O Cancro, afinal, finalmente, mesmo na linguagem oficial europeia é uma Doença do Ambiente como a Malária e a Fome.
Chama-se Epidemiologia à ciência das epidemias. Daí que o referido programa televisivo, fabricado nos centros audio-visuais da Comunidade Europeia, em vez das garraiadas do costume sobre o que a Medicina ignora do Cancro, sempre ignorou e continua a ignorar, graças a Deus, avançou no único caminho lógico e ecológico, o da Epidemiologia. O único caminho que pode informar uma estratégia eficaz de contra-ataque ao referido flagelo do Cancro, diariamente produzido e fabricado, como diria o Senhor de La Palisse, por uma engrenagem de consumos e ambientes cancerígenos.
Se, como é óbvio e sempre o afirmaram as minorias insubmissas de franco-atiradores, o Cancro está no Ambiente, é fabricado pelo Ambiente, nada mais lógico e ecológico do que investigar os factores de ambiente que o provocam.
O referido programa televisivo não teve papas na língua e avançou por esse caminho que, evidentemente, desagrada às multinacionais (coitadas) mas é o único para chegarmos a respeitar minimamente os direitos ecológicos do homem, frequentemente reduzido à categoria económica de Consumidor.
Vem a Ecologia humana e fala de direitos à saúde, à segurança e à (qualidade de) vida. Poderá ser eventualmente o escândalo mas escândalo é sempre, em todo e qualquer lugar do Mundo, denunciar a violação dos direitos humanos.
Irá a "Plataforma Europeia para o Ambiente" no caminho lógico e ecológico dos eco-direitos humanos? Alguma vez há-de ser e mais vale tarde do que nunca. Esta "Crónica do Planeta Terra" fez dez anos de publicação regular semanal em 17 de Junho passado e , pelos vistos, ainda não perdeu a esperança. Porque não havemos de esperar mais dez anos para que os mais elementares direitos ecológicos do cidadão sejam respeitados ou sequer considerados?
O progresso, afinal, marcha lento, ao contrário do que nos dizem os emproados defensores da tecnocracia, que avaliam tudo pela bitola deles.
Mas se há que ter esperança na "Plataforma Europeia do Ambiente" porque está lá uma pessoa chamada Maria de Lurdes, não cantemos vitória antes de tempo porque - por exemplo - o discurso oficialmente debitado em Portugal pela comissão aqui encarregada de divulgar a campanha da "Europa contra o Cancro", elegeu como bode expiatório de todos os factores responsáveis pelo Cancro, imagine-se o quê: o Tabaco.
Eis Sua Excelência o Cigarro elevado aqui em Portugal, mercê das campanhas tele-orientadas, o único responsável pelo Cancro.
O Dr. Pádua mandou mesmo imprimir cartazes a cores para a sua campanha cardíaca com o dilema tão expressivo como simbólico: "O Tabaco ou a Saúde". Quer dizer, a gente corta o Tabaco e fica a gozar de saúde para o resto da vida. Nem mais nem menos.
Tantas vezes já nesta crónica tentámos desmistificar esta real mistificação dos problemas da chamada Saúde Pública, que nos abstemos por agora. Resumindo, apenas repetimos: a ideologia dominante continua a ser a pior de todas as toxicodependências.
O Tabaco serve de símbolo a todos os restantes mitos que bloqueiam a investigação de Ecologia Humana, mas não esgota evidentemente os factores epidemiológicos da Doença na sociedade industrial .
Em Ecologia Humana, tudo está por fazer, tudo está por investigar. Por exemplo: está por fazer o inventário dos produtos químicos disseminados no ambiente que provocam não só o Cancro, mas muitas outras doenças degenerativas e nem só.
DOENÇAS PROFISSIONAIS
Mesmo limitando o estudo às doenças profissionais, contraídas no local de Trabalho, área onde apesar de tudo a Ecologia Humana ainda tem progredido alguma coisa, que mais não seja por força de pressões sindicalistas, mesmo considerando apenas essa área de estudo, é patente a falta de vontade política em levar até ao fim e ao fundo as investigações: há três centenas de substâncias suspeitas mas a investigação - deliberada e voluntariamente lenta - só quis tirar a limpo, até agora, como comprovadamente cancerígenas, meia dúzia dessas substâncias.
É outro exemplo de que alguma coisa tem de mudar na investigação epidemiológica da Doença, que permanece área tabu numa sociedade industrial aparentemente tão liberal e libertina, mas só no que lhe interessa e no que não toca os seus fundamentos homicidas e biocidas.
Se uma "Plataforma Europeia do Ambiente" se ficar (só) pelas áreas da Poluição e da Anti-Poluição, de acordo com as regras impostas pelas multinacionais e pelo princípio social-democrata do Poluidor-Pagador, quem irá, entre alegados socialistas, ocupar-se do que no Ambiente afecta o metabolismo do consumidor, intoxica o seu organismo, altera as suas funções fisiológicas vitais, determina o seu comportamento aberrante e patogénico, etc.?
Se se teimar numa divisão de campos, dizendo que isso é matéria de Saúde Pública, a gente vai bater aos institutos (ditos) de Saúde Pública e dizem-nos que isso são problemas do Ambiente, nada tendo os médicos a ver com isso.
O jogo social-democrata tem sido este: os do Ambiente excluem a Saúde Pública e os da Saúde Pública excluem o Ambiente.
Em que ficamos, senhores socialistas?
Não será exactamente a Ecologia Humana, como ciência angular das ciências humanas em 1988, que fica nessa zona de fronteira, nessa "terra de ninguém", nesse "interland" que ninguém dos cientistas e dos políticos quer?
Mas quem, entre os ecólogos de serviço, assume, investiga, arrisca e programa as matérias terríveis que lhe cabem: e digo terríveis porque não há outra palavra para adjectivar o terror que é a vida quotidiana dos cidadãos, nos países do Mercado, em matéria de segurança, saúde e silêncio.
Quem acode aos cidadãos e aos direitos ecológicos dos cidadãos nos países deste Mercado?
Que "Plataforma” irá pegar no assunto tabu dessa ciência oculta e por enquanto esotérica que se chama Ecologia Humana?
Dinamizada por Maria de Lurdes Pintasilgo, a "Plataforma Europeia para o Ambiente" tem hoje, em Lisboa, a primeira "reunião de reflexão conjunta" para apreciar o dossier, alargar a Plataforma e preconizar "acções viáveis" dentro dos "pontos considerados na Plataforma."
A minha esperança de cidadão português na cidadã do Mundo que é Maria de Lurdes Pintasilgo residiu sempre neste ponto: é que a sua personalidade carismática, a sua criatividade transbordante, seja a energia necessária e possível para que possamos ir sempre além dos "pontos considerados nas diversas plataformas...".
É sempre necessário ir "além dos pontos agendados" para que uma verdadeira política humana (antropolítica, diria Edgar Morin), uma política de respeito pelos direitos ecológicos do cidadão, uma política da "qualidade de vida" e da recriação da vida quotidiana seja, um dia, ainda possível neste recanto ocidental da Europa, vocacionado para seu depósito de detritos.
Nesta terra onde a violação dos mais elementares direitos humanos (incluindo os ecológicos) continua a ser o pão nosso de cada dia.
- - - -
(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «A Capital» (Crónica do Planeta Terra), 16/7/1988
***
<< Home