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2006-05-15

ARTIGO 66

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DELITOS CONTRA O AMBIENTE E A PESSOA HUMANA - O DIREITO ESQUECIDO ÀS INDEMNIZAÇÕES

«É conferido a todos o direito de promover, nos termos da lei, a prevenção ou a cessação dos factores de degradação do ambiente, bem como, em caso de lesão directa, o direito à correspondente indemnização.»
(Nº 3 do Artigo 66º da Constituição da República Portuguesa, subordinado à epígrafe «Ambiente e Qualidade de Vida», inserto no capítulo II - Direitos e Deveres Sociais)

1
15/5/1992 - Segundo o artigo número 66 da Constituição da República Portuguesa, «toda a gente tem o direito para provocar acção de acordo com a lei, na prevenção ou cessação dos factores que degradam o meio ambiente, como nos casos de dano directo, dando direito à correspondente compensação»
O actual eurodeputado Carlos Pimenta, quando foi Secretário de Estado do Ambiente, punha grandes esperanças neste artigo da Constituição, esperando que ele fosse em breve uma realidade na vida quotidiana dos portugueses. Até hoje, também neste capítulo dos ecodireitos fundamentais, o silêncio e os silenciamentos foram moeda corrente. Hoje, não sabemos se ainda existe o artigo 66, se ainda existe Constituição, ou mesmo se ainda existe República Portuguesa.
Até hoje e como já nesse ano (??) Carlos Pimenta se queixava, «a legislação não implementou ainda este princípio consagrado no artigo 66.» Porque, evidentemente, para este direito consignado na Constituição ter efectividade, é preciso, na prática, que o juiz e o advogado possam instruir um processo com base na queixa objectiva de um cidadão A contra um cidadão B, mesmo que o cidadão B seja uma instituição, e mesmo que essa instituição seja o Estado.»
«De acordo com a lei fundamental da Nação, o juiz e o advogado devem «poder declarar o cidadão A como tendo direito a determinada indemnização e compensação.»
Vigente continua a pergunta que Carlos Pimenta fazia nessa altura em que não tinha ainda entrado nessa acrópole de silêncios, silenciamentos e assuntos-tabu que é o Parlamento Europeu:
« Porque é que no direito de Responsabilidade Civil, se eu o prejudicar a si em qualquer dos seus direitos, você tem o direito de instruir um processo de responsabilidade civil contra mim e no caso de eu, exactamente com as mesmas consequências, lhe provocar um dano que tem pelo meio o Ambiente, você já não tem o direito de agir contra mim?».
Boa pergunta, sim senhor, a do ex-Carlos Pimenta.
Mas não será exactamente por ser tão lógico este raciocínio, que sobre ele tem recaído o maior e mais sepulcral dos silêncios, quer dos governos quer de jornais, deputados, partidos, amigos do ambiente, amigos da farra, sindicatos, associações, etc?
2
[inédito] Os delitos do ambiente têm gravidade relativa. Há grandes e pequenos. Há os que lesam direitos fundamentais do homem e os que, digamos, se limitam a causar incómodos ou a provocar pequenos desconfortos e prejuízos menores. A táctica, pouco honesta, de serviços e responsáveis, porém, tem sido baralhar esta hierarquia de valores, esta ordem de prioridades. Enquanto as fraudes de alto gabarito continuarem impunes a rir-se nas nossas barbas, não há hipótese nem moral para atacar os pequenos e médios delitos, os pequenos e médios infractores.
Por mais e melhor legislação que haja, a política de ambiente depende fundamentalmente da ética ou «filosofia» que a inspira. Cumprir a lei já seria bom e respeitar a Constituição (no seu artigo 66, entre outros) ainda melhor. Mas cumpri-la sem critério nem hierarquia de culpas e culpados, será pior que não haver lei. Punir indiscriminadamente os pequenos delitos, continuando os grandes na impunidade, é pior que nada. Se os maiores culpados devem ser chamados a responder em primeiro lugar, é por aí que se deve começar. Se os maiores poluidores, em Portugal, são empresas públicas, é por aí que a justiça deve começar por se exercer. A contingência de serem empresas públicas, no entanto, tem paradoxalmente aumentado a sua impunidade. Face ao artigo 66 da Constituição Portuguesa, as empresas públicas são duplamente culpadas: pela impunidade com que poluem e exploram o utente; pela gravidade dos próprios poluentes e dimensão das empresas.
[publicado] A julgar pela severidade com que são perseguidos e punidos alguns profissionais de comércio, por exemplo, obrigados a possuir boletim de sanidade por se encontrarem, na sua ocupação diária, em contacto com géneros alimentícios, a qualidade de vida neste País vai de vento em popa. O caso foi-nos narrado por um comerciante de artigos alimentares da Baixa de Lisboa, mas a julgar pelo que também aconteceu em estabelecimentos vizinhos, é prática frequente pela cidade fóra. A menos que se trate de um caso especial de perseguição selectiva, visando determinadas casas com as quais as autoridades não simpatizam, tudo leva a crer que se quer com a punição de pequenos delitos fazer esquecer os grandes crimes contra a saúde pública.
A lei é para se cumprir, sem dúvida, mas há formas justas e formas injustas de a cumprir. No caso que nos foi narrado, trata-se claramente de um abuso e de uma prepotência da autoridade mas que se esconde atrás de um alegado propósito de fazer cumprir a lei. [O prazo para renovação do já citado boletim de sanidade terminava a 9 de Fevereiro passado (???).
Logo nesse dia a autoridade (Polícia Municipal) apresentou-se no referido estabelecimento requerendo os documentos de sanidade. O comerciante alegou que estavam atrasados porque os serviços de Microradiografia não tinham despachado a tempo esse requisito necessário. Nesse dia 9 , o polícia parece ter-se dado por convencido, considerando a situação legal. No dia seguinte, 10 de Fevereiro, outro polícia exigindo o Boletim.
Novamente o comerciante explicou a situação já conhecida: dia 5 de Fevereiro dirigira-se ao Serviço de Luta Anti-Tuberculosa (Chile), único existente em Lisboa para o efeito, parecendo-lhe tempo mais que suficiente para ter pronta a 9 a microradiografia. Não contou o comerciante com o imponderável. O referido SLAT, assoberbado com tantos boletins de sanidade, só teria a radiografia pronta no dia 13, quatro dias depois de terminado o impreterível e rigoroso prazo tão severamente e rigorosamente respeitado pela Polícia Municipal. E, não atendendo à prova que o comerciante apresentava (a senha do SALT) levantou auto de multa.
Procedimento tão insólito como arrogante da autoridade leva a formular algumas perguntas sobre a sua verdadeira causa: gosto gratuito de multar? Excesso de zelo de um funcionário zeloso? Necessidade de apresentar serviço? Forma cómoda de encher os cofres camarários? Ordens da Municipalidade para «atirar a matar»? Ou ilustração lisboeta da velha e repetida fábula «a catar formigas se vão deixando escapulir os elefantes»?
A técnica, de tão usada nos últimos anos em Portugal, acaba por ser conhecida de toda a gente, que já percebe onde a autoridade, a pretexto de fazer cumprir a lei, procura «bodes expiatórios» ou toma o todo pela parte, ou reprime pequenos delitos e delinquentes e prevaricadores para esquecer os grandes.
Pelos vistos e enquanto as altas autoridades nunca mais conseguem reprimir a Alta Corrupção, contentam-se as baixas em andar pela Baixa de Lisboa à caça da multa, punindo comerciantes que não têm culpa nenhuma das histerias e diarreias camarárias.
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Como provam alguns processos célebres - Kawasaki e Minamata no Japão, Ohio nos Estados Unidos - mais importante do que haver ou não haver um texto legislativo que se aplique a cada situação, é a iniciativa dos cidadãos na sus própria autodefesa e o apoio que a classe dos juristas queira prestar à luta dos cidadãos.
Mais famosos ainda ficaram os casos em que o feitiço se volta contra o feiticeiro e em que a empresa delinquente, num caso evidente de crime contra o ambiente ou contra o integridade das pessoas, pode inverter a situação e incriminar o grupo ecologista ou de autodefesa cidadã por estar a prejudicar o circuito económico, a invadir terreno privado, ou qualquer outro argumento singular.
Quando o petroleiro «Amoco-Cadiz» despejou toneladas de crude nas costas da Bretanha, a Shell mandou processar de imediato a revista «11 milhões de consumidores» que alimentara uma campanha de boicote à grande empresa petrolífera.
Igualmente o grupo «Green-Peace» foi notificado em tribunal pelo Centro Holandês de Investigações Nucleares que o príbe de perturbar, atrasar ou impedir o lançamento de lixos radioactivos na fossa atlântica da Galiza.
[Outro exemplo: um médico português acusado por um cidadão de ter concorrido para o aborto da mulher com um estranho medicamento que lhe receitara, disse-me a mim, jornalista que o entrevistava a propósito, ser ele, médico, quem iria processar o doente queixoso, já que este nada podia provar daquilo que o doente o acusava.
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OS TECNODELINQUENTES E O CHARCO DO PLATONISMO
[1982, publicado]
Com certa razão os juristas reprovam a políticos e ecologistas a sua falta de realismo, o idealismo das suas propostas, o platonismo das suas dissidências, o simbolismo dos seus protestos. O campo dos juristas, segundo eles próprios entendem, não seria o das promessas balofas dos políticos, nem os horizontes utópicos dos «hippies» e ecologistas. Daí que os juristas fiquem em maus lençóis quando, no campo dos delitos do ambiente, eles sentem que afinal também os homens de leis trabalham com um material abstracto e vago, fantasista ou irreal. É o que desencoraja muitos jovens advogados bem intencionados de seguir a carreira «heróica» de Ralph Nader...
Este «platonismo» em áreas indefinidas da tecnodelinquência moderna é ironicamente aceite e assumido em casos como o tribunal Internacional Bertrand Russell, de sanções simbólicas, ou o tribunal que EcoRopa promove para julgar crimes como, por exemplo, a poluição do Rio Reno.
Casos como o «genocídio» dos índios brasileiros Yanomani - um dos 45 dossiês apresentados ao Tribunal Russell em 1980 - colocam a jurisprudência em situação embaraçosa. O «etnocídio» está também fora de qualquer controle legal, como aliás todo o biocídio ou delito contra a vida. Ainda espera, aliás, que os teóricos do Direito o classifiquem e incluam na sua nomenclatura. O atraso da jurisprudência em relação à realidade não deixa de conferir a esta ciência - também esta - um certo halo fantasmagórico irreal e um certo odor a mofo.
Neste contexto, é caso para os «hippies» e ecologistas devolverem a bola do «romantismo» de que são acusados aos juristas que lha atiraram, perante o puro carácter simbólico de «comités de defesa de prisioneiros por delito de opinião» e a irrelevância de instituições como a Liga Internacional dos Direitos do Homem e a Amnistia Internacional, a inoperância das acções de resistência passiva, tipo greve da fome, etc. Com manifestações e manifestos, protestos e marchas, bandeiras e autocolantes, mesmo com greves da fome, se poderá dizer que pode bem o sistema. O sistema só acorda quando lhe põem bombas nos centros vitais.
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O SOFISMA DAS DOSES MÍNIMAS
A propósito de delitos contra o ambiente, leis que não existem ou leis que existem mas não se cumprem, é de assinalar a antiguidade em Portugal da legislação em defesa da água... Ela confirma, por um lado, que o problema existe e que é antigo, mas mostra também que não foi a legislação a contribuir em nada para evitar que o problema da água chegasse à situação a que chegou e é de todos conhecida.
Um técnico, Vítor Manuel Alves de Figueiredo, classificou de «radicalismo» medidas legais de 1892 (Dezembro) quanto à poluição das águas por efluentes industriais, «data em que foram promulgados os primeiros regulamentos que, pura e simplesmente, proibem o lançamento nas águas de substâncias nocivas».
«Radicalismo» diz o autor deste trabalho publicado pelo Instituto Nacional de Investigação Industrial e intitulado « Intervenção administrativa no problema da poluição das águas por efluentes industriais e tentativa de avaliação dos custos desta poluição em Portugal».
De facto, em 1892 ainda se estava longe de chegar ao refinamento de 1982, em que o sofisma das «doses admitidas» não tinha sido descoberto pela OMS, pelo PNUD, pelo PNUMA, pela OMM, por todos esses organismos internacionais que recomendam aos povos as «doses mínimas» de poluição que não matam mas moem, adoecem ou adaptam.
Matar, sim, mas devagar - porque ainda é preciso alguma mão de obra para a engrenagem continuar.
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