TECNO-ESTRUTURA 1987
sistema-10> os dossiês do silêncio – o sistema contra os ecossistemas – inédito ac de 1987 – tese de 5 estrelas
NUREMBERGA FECHOU PARA OBRAS - INOCÊNCIA E PILATISMO DA TECNO-ESTRUTURA
21/2/1987 - Um dos mecanismos mais curiosos que o sistema da tecno-estrutura põe a funcionar quando se sente picado nos seus fracos e podres, é o discurso das "duas faces da realidade", o "bem e o mal que há em tudo".
O progresso, por exemplo, seria justificado nas suas partes más pelo facto de ter inevitavelmente, e de acordo com a dialéctica, as partes boas...
À primeira vista parece mesmo perito em dialéctica um sistema que é, todo ele, a institucionalização do dogma monolítico.
Se um zoófilo defensor dos pombos que os atiradores matam por desporto no "tiro ao voo", vier alegar razões humanitárias contra o bárbaro hábito, logo um representante dos atiradores aparece no ecrã do Jornal de Sábado (RTP, Canal 1, 12/Setembro/1987) a proclamar as vantagens económicas que os criadores de pombos têm, quantas divisas entram no País com estes torneios internacionais, o bem que fazem ao turismo de Vila Moura, enfim, será preciso coligir mais benefícios para provar que "matar pombos" é, afinal, uma actividade meritória e patriótica?
A que argumentos estamos nós sujeitos, venham eles de atiradores aos pombos ou de atiradores ao alvo, quando o alvo são populações civis, desde que a moral seja a pura moral do cifrão?
A palavra "hipocrisia" para definir um dos mecanismos habituais no discurso "desculposo" das culpas institucionais, foi proferida em 1973, na República Federal da Alemanha, por médicos especializados em problemas de trânsito e também por automóveis-clube.
Hipocrisia" consideram essas entidades que é o código penal ignorar "até agora a influência do crescente consumo de comprimidos sobre a falta de segurança do trânsito."
A ênfase posta no álcool como responsável por grande percentagem de acidentes rodoviários, terá feito esquecer o papel que nesses acidentes têm, misturados ao álcool, os mais diversos medicamentos.
Uma coisa é certa: a campanha focalizada no álcool não tem dedicado nem um centésimo da atenção e das palavras ao problema dos "cocktails" medicamentosos.
No entanto, só em 1973 as estatísticas falavam: o Automóvel Clube da Alemanha estimava que , em cerca de 15% a 20% das pessoas envolvidas em acidentes de trânsito, se encontravam sob a acção de medicamentos (14/Novembro/1973, in "Diário do Alentejo")
O pilatismo é uma das constantes mais constantes e pitorescas da tecno-estrutura.
As declarações dos chamados responsáveis, perante desastres que envolvem mortos e acidentados graves, reproduzem-se ipsis verbis com uma precisão milimétrica, a mostrar que, de facto, o sistema não é uma invenção de franco-atirador e que se rege por regras de funcionamento não só muito precisas mas pendularmente repetitivas, quer dizer, rítmicas, o que lhe dá um poder imparável.
É assim que, em Lisboa, capital europeia, perante desastres que envolvem mortos e feridos, os responsáveis das respectivas empresas debitam um discurso inviolavelmente igual, seja qual for a circunstância de tempo e de lugar, ou o número de mortos e de feridos (graves).
Em 16 de Setembro de 1987, por exemplo, as declarações ao telejornal das Nove, canal dois da R.T.P., do responsável da Electricidade de Portugal (EDP), a propósito das caixas de electricidade que explodem na cidade, evocam de imediato as declarações de responsáveis da Carris de Ferro de Lisboa, quando os chamados "amarelos", autocarros potentes recém-importados, começaram matando gente na cidade a torto e a direito.
"A técnica é infalível", "A técnica não é infalível", "O nosso sistema é da máxima segurança", " O sistema também pode ter uma falha", "No estrangeiro também acontece", "Todas as companhias têm acidentes, veja a CP...", etc
Por acaso , nos dois casos vertentes, o escândalo dos "amarelos" da Carris e o escândalo das caixas de electricidade, não há notícia de que desastres idênticos tenham sucedido algures na Europa, ponto de referência obrigatório de todos os nossos esforços de modernização, incluindo os de modernização da morte.
O que não quer dizer que nas capitais europeias não haja desastres com outras tecno-estruturas, até com mais mortos e feridos graves .
Mas o vício da tecno-estrutura em reproduzir automaticamente o discurso é tal, que mesmo quando literalmente mente e é desmentido pela realidade ou pelos factos, ele se ouve com a mesma insistência.
Vem, depois, a dúvida das indemnizações às vítimas.
"A EDP não tem culpa..."
"A Carris não tem culpa..."
"A CP não tem culpa..."
A "inocência" é assim a constante do sistema que se associa estruturalmente ao "pilatismo”, ao "lava daí as suas mãos", ao 'famoso "neutralismo" da técnica, que nunca tem culpa de nada.
E muito menos culpa têm os técnicos, individualmente considerados ou mesmo como classe tributária da tecno-estrutura.
Aliás, quem beneficia do progresso (o cidadão) é justo que pague com uns mortos e acidentados de vez em quando.
Se não há culpas nem culpados, se são todos "inocentes", é natural também que não haja (e de facto não há) tribunais onde se julguem crimes contra a humanidade. Nuremberga fechou para obras.
POLUIDOR ATRAI POLUIDOR
O efeito "em cascata" das poluições aparece como regra constante no funcionamento do sistema.
No princípio era a pureza do ar e das águas: logo que o primeiro poluidor se instala e cria o primeiro "antecedente", podem vir todos os outros, inspirados no grande princípio, "poluído por um, poluído por mil".
Se há um maior, os mais pequenos dirão que eles são mais perigosos do que ele.
Poluidor atrai poluidor, porcaria atrai porcaria, lixo atrai lixo, excrementos atraem moscas.
A "arrogância" é a forma mais comum assumida pelos porta-vozes do sistema - a classe tecnocrática - para revelar uma sua típica característica: a incapacidade de aprender com a experiência (embora se diga experimental), a incapacidade de aprender com erros e fracassos, a incapacidade de evoluir, portanto.
Em todos os livros que falam de vitaminas, a ciência da nutrição não esquece citar o grande feito que foi a descoberta do escorbuto e suas causas de carências vitamínicas.
O patético da actual ciência médica é que, perante mil e outros casos idênticos ao do escorbuto, de carências vitamínicas, minerais ou proteicas, recusa ver a relação de causa e efeito entre as carências alimentares e as doenças mais diversas.
Esta incapacidade de a ciência aprender com a história da ciência, é uma das mais típicas características e uma constante do sistema ideológico que nos rege.
A arrogância ou "persistência no erro" tem um exemplo flagrante na conduta do sistema estabelecido no campo agrícola (o "agrobusiness") relativamente a um equívoco que se revelou suicida: querer aumentar a produtividade (a pretexto de matar a fome) através de meios tecnológicos que irremediavelmente comprometem o futuro do capital de fertilidade dos "solos aráveis".
No livro "Nous Avons Brulé la Terre", editado em 1954, Michel Remy levantava algumas questões que no tempo eram ainda tabu e que ainda hoje, embora largamente ventiladas por grupos de análise ecologista, se encontram relativamente longe da opinião pública.
O erro levado a cabo por uma ideologia da produtividade agrícola que deliberadamente ignora completamente a qualidade biológica e os limites ecológicos da vida vegetal, ideologia largamente subsidiada por organismos como a F.A.O., é colocado com toda a clareza por Michel Remy, que demonstra no seu livro o absurdo de querer aumentar a produtividade com meios tecnológicos que comprometem o capital de fertilidade dos solos, que é a base indispensável, sine qua non, dessa mesma produtividade.
Este cortar de um dos galhos onde a humanidade se apoia, talvez um dos sete cavaleiros do Apocalipse, não tem, como realidade de fundo que tudo condiciona, merecido do discurso dito ecologista a atenção que merece.
A pilhagem de recursos e a delapidação irreversível do património natural não se faz apenas a granel, de maneira selvagem, atacando a torto e a direito, de maneira anárquica: o que queremos sublinhar , neste apontamento, é o carácter programado, sistemático, regular e de acordo com normas pré-estabelecidas a que essa pilhagem obedece.
Abonada pela ciência do sistema, essa lei da pilhagem tem, no equívoco F.A.O. da produtividade um dos mais monstruosos exemplos, que custarão talvez à humanidade a sua própria capacidade de sobrevivência.
OS BODES EXPIATÓRIOS
Com a trovoada feita pela actualidade noticiosa, a opinião pública treme de medo, susto e pânico, ao saber que a crescente incidência do cancro no estômago no Japão é devido ao consumo de arroz, que o sal é culpado de doenças cardiovasculares (primeira causa de morte em muitos países) e que a soja, no porto de Barcelona, ao ser descarregada, provoca (a maldita) uma onda de doenças asmáticas, com internamentos hospitalares e mesmo mortes.
Aí está como de uma assentada se põe no banco dos réus, como assassinos da vida e da tranquilidade pública, o arroz, o sal, a soja.
Arroz, sal e soja, que, mercê das múltiplas e miraculosas manipulações industriais, de soja, de sal e de arroz, respectivamente, já não têm nada.
O sistema é particularmente hábil (useiro e vezeiro ) em criar estes bodes expiatórios, que culpam um sal, um arroz e uma soja que, por culpa da indústria alimentar, há muito deixaram de ser sal, arroz e soja para serem uma chafurdice químico-tóxica.
De acordo com o mecanismo de "retorno" ou feedback a que obedece sem excepções, o sistema não hesita em anunciar um fracasso ou um crime, desde que já tenha na grelha de partida outro crime ou fracasso comercializável.
ANTIBIÓTICOS
A revista «New Scientist» admitiu, em Fevereiro de 1987, "que o aparecimento de micróbios resistentes aos produtos químicos habitualmente utilizados começa a causar grandes preocupações ao nível da comunidade científica".
Constituindo este fenómeno da crescente resistência microbiana à crescente potência dos produtos químicos exterminadores, um verdadeiro "cavaleiro do Apocalipse", é um dos que têm sido mais habilmente disfarçados pelos mass media, que para isso existem.
Como "lepra" que é do nosso tempo, o segredo impera e a conspiração do silêncio tem funcionado em pleno e a contento.
Silêncio, segredo, censura, ocultamento, sim, até ao momento em que determinados laboratórios anunciam que "estão a produzir substâncias relativamente às quais os micro-organismos não possam desenvolver resistência."
As substâncias mais prometedoras - diz o jornal - são as quinolonas. (In "Diário Popular", 21/Fevereiro/1987).
Perante fenómenos de envergadura apocalíptica como este capítulo da guerra biológica "resistência dos micróbios aos químicos que pretendem destruí-los", o sistema põe a funcionar vários dos seus mecanismos de defesa:
- finge que não vê
- enquanto finge que não vê, dá o salto para uma nova tecnologia mais complicada que venha destronar a anterior
- silencia o fenómeno até que pode, o que não lhe é difícil pois para outra coisa não existem os mass media"
- mete a cabeça na areia como o avestruz.
Moralidade de mais uma história imoral do Apocalipse: a humanidade que se avenha com mais este extraordinário progresso de uma ciência contra a qual, de facto, não há "quinolona" que valha.
***
NUREMBERGA FECHOU PARA OBRAS - INOCÊNCIA E PILATISMO DA TECNO-ESTRUTURA
21/2/1987 - Um dos mecanismos mais curiosos que o sistema da tecno-estrutura põe a funcionar quando se sente picado nos seus fracos e podres, é o discurso das "duas faces da realidade", o "bem e o mal que há em tudo".
O progresso, por exemplo, seria justificado nas suas partes más pelo facto de ter inevitavelmente, e de acordo com a dialéctica, as partes boas...
À primeira vista parece mesmo perito em dialéctica um sistema que é, todo ele, a institucionalização do dogma monolítico.
Se um zoófilo defensor dos pombos que os atiradores matam por desporto no "tiro ao voo", vier alegar razões humanitárias contra o bárbaro hábito, logo um representante dos atiradores aparece no ecrã do Jornal de Sábado (RTP, Canal 1, 12/Setembro/1987) a proclamar as vantagens económicas que os criadores de pombos têm, quantas divisas entram no País com estes torneios internacionais, o bem que fazem ao turismo de Vila Moura, enfim, será preciso coligir mais benefícios para provar que "matar pombos" é, afinal, uma actividade meritória e patriótica?
A que argumentos estamos nós sujeitos, venham eles de atiradores aos pombos ou de atiradores ao alvo, quando o alvo são populações civis, desde que a moral seja a pura moral do cifrão?
A palavra "hipocrisia" para definir um dos mecanismos habituais no discurso "desculposo" das culpas institucionais, foi proferida em 1973, na República Federal da Alemanha, por médicos especializados em problemas de trânsito e também por automóveis-clube.
Hipocrisia" consideram essas entidades que é o código penal ignorar "até agora a influência do crescente consumo de comprimidos sobre a falta de segurança do trânsito."
A ênfase posta no álcool como responsável por grande percentagem de acidentes rodoviários, terá feito esquecer o papel que nesses acidentes têm, misturados ao álcool, os mais diversos medicamentos.
Uma coisa é certa: a campanha focalizada no álcool não tem dedicado nem um centésimo da atenção e das palavras ao problema dos "cocktails" medicamentosos.
No entanto, só em 1973 as estatísticas falavam: o Automóvel Clube da Alemanha estimava que , em cerca de 15% a 20% das pessoas envolvidas em acidentes de trânsito, se encontravam sob a acção de medicamentos (14/Novembro/1973, in "Diário do Alentejo")
O pilatismo é uma das constantes mais constantes e pitorescas da tecno-estrutura.
As declarações dos chamados responsáveis, perante desastres que envolvem mortos e acidentados graves, reproduzem-se ipsis verbis com uma precisão milimétrica, a mostrar que, de facto, o sistema não é uma invenção de franco-atirador e que se rege por regras de funcionamento não só muito precisas mas pendularmente repetitivas, quer dizer, rítmicas, o que lhe dá um poder imparável.
É assim que, em Lisboa, capital europeia, perante desastres que envolvem mortos e feridos, os responsáveis das respectivas empresas debitam um discurso inviolavelmente igual, seja qual for a circunstância de tempo e de lugar, ou o número de mortos e de feridos (graves).
Em 16 de Setembro de 1987, por exemplo, as declarações ao telejornal das Nove, canal dois da R.T.P., do responsável da Electricidade de Portugal (EDP), a propósito das caixas de electricidade que explodem na cidade, evocam de imediato as declarações de responsáveis da Carris de Ferro de Lisboa, quando os chamados "amarelos", autocarros potentes recém-importados, começaram matando gente na cidade a torto e a direito.
"A técnica é infalível", "A técnica não é infalível", "O nosso sistema é da máxima segurança", " O sistema também pode ter uma falha", "No estrangeiro também acontece", "Todas as companhias têm acidentes, veja a CP...", etc
Por acaso , nos dois casos vertentes, o escândalo dos "amarelos" da Carris e o escândalo das caixas de electricidade, não há notícia de que desastres idênticos tenham sucedido algures na Europa, ponto de referência obrigatório de todos os nossos esforços de modernização, incluindo os de modernização da morte.
O que não quer dizer que nas capitais europeias não haja desastres com outras tecno-estruturas, até com mais mortos e feridos graves .
Mas o vício da tecno-estrutura em reproduzir automaticamente o discurso é tal, que mesmo quando literalmente mente e é desmentido pela realidade ou pelos factos, ele se ouve com a mesma insistência.
Vem, depois, a dúvida das indemnizações às vítimas.
"A EDP não tem culpa..."
"A Carris não tem culpa..."
"A CP não tem culpa..."
A "inocência" é assim a constante do sistema que se associa estruturalmente ao "pilatismo”, ao "lava daí as suas mãos", ao 'famoso "neutralismo" da técnica, que nunca tem culpa de nada.
E muito menos culpa têm os técnicos, individualmente considerados ou mesmo como classe tributária da tecno-estrutura.
Aliás, quem beneficia do progresso (o cidadão) é justo que pague com uns mortos e acidentados de vez em quando.
Se não há culpas nem culpados, se são todos "inocentes", é natural também que não haja (e de facto não há) tribunais onde se julguem crimes contra a humanidade. Nuremberga fechou para obras.
POLUIDOR ATRAI POLUIDOR
O efeito "em cascata" das poluições aparece como regra constante no funcionamento do sistema.
No princípio era a pureza do ar e das águas: logo que o primeiro poluidor se instala e cria o primeiro "antecedente", podem vir todos os outros, inspirados no grande princípio, "poluído por um, poluído por mil".
Se há um maior, os mais pequenos dirão que eles são mais perigosos do que ele.
Poluidor atrai poluidor, porcaria atrai porcaria, lixo atrai lixo, excrementos atraem moscas.
A "arrogância" é a forma mais comum assumida pelos porta-vozes do sistema - a classe tecnocrática - para revelar uma sua típica característica: a incapacidade de aprender com a experiência (embora se diga experimental), a incapacidade de aprender com erros e fracassos, a incapacidade de evoluir, portanto.
Em todos os livros que falam de vitaminas, a ciência da nutrição não esquece citar o grande feito que foi a descoberta do escorbuto e suas causas de carências vitamínicas.
O patético da actual ciência médica é que, perante mil e outros casos idênticos ao do escorbuto, de carências vitamínicas, minerais ou proteicas, recusa ver a relação de causa e efeito entre as carências alimentares e as doenças mais diversas.
Esta incapacidade de a ciência aprender com a história da ciência, é uma das mais típicas características e uma constante do sistema ideológico que nos rege.
A arrogância ou "persistência no erro" tem um exemplo flagrante na conduta do sistema estabelecido no campo agrícola (o "agrobusiness") relativamente a um equívoco que se revelou suicida: querer aumentar a produtividade (a pretexto de matar a fome) através de meios tecnológicos que irremediavelmente comprometem o futuro do capital de fertilidade dos "solos aráveis".
No livro "Nous Avons Brulé la Terre", editado em 1954, Michel Remy levantava algumas questões que no tempo eram ainda tabu e que ainda hoje, embora largamente ventiladas por grupos de análise ecologista, se encontram relativamente longe da opinião pública.
O erro levado a cabo por uma ideologia da produtividade agrícola que deliberadamente ignora completamente a qualidade biológica e os limites ecológicos da vida vegetal, ideologia largamente subsidiada por organismos como a F.A.O., é colocado com toda a clareza por Michel Remy, que demonstra no seu livro o absurdo de querer aumentar a produtividade com meios tecnológicos que comprometem o capital de fertilidade dos solos, que é a base indispensável, sine qua non, dessa mesma produtividade.
Este cortar de um dos galhos onde a humanidade se apoia, talvez um dos sete cavaleiros do Apocalipse, não tem, como realidade de fundo que tudo condiciona, merecido do discurso dito ecologista a atenção que merece.
A pilhagem de recursos e a delapidação irreversível do património natural não se faz apenas a granel, de maneira selvagem, atacando a torto e a direito, de maneira anárquica: o que queremos sublinhar , neste apontamento, é o carácter programado, sistemático, regular e de acordo com normas pré-estabelecidas a que essa pilhagem obedece.
Abonada pela ciência do sistema, essa lei da pilhagem tem, no equívoco F.A.O. da produtividade um dos mais monstruosos exemplos, que custarão talvez à humanidade a sua própria capacidade de sobrevivência.
OS BODES EXPIATÓRIOS
Com a trovoada feita pela actualidade noticiosa, a opinião pública treme de medo, susto e pânico, ao saber que a crescente incidência do cancro no estômago no Japão é devido ao consumo de arroz, que o sal é culpado de doenças cardiovasculares (primeira causa de morte em muitos países) e que a soja, no porto de Barcelona, ao ser descarregada, provoca (a maldita) uma onda de doenças asmáticas, com internamentos hospitalares e mesmo mortes.
Aí está como de uma assentada se põe no banco dos réus, como assassinos da vida e da tranquilidade pública, o arroz, o sal, a soja.
Arroz, sal e soja, que, mercê das múltiplas e miraculosas manipulações industriais, de soja, de sal e de arroz, respectivamente, já não têm nada.
O sistema é particularmente hábil (useiro e vezeiro ) em criar estes bodes expiatórios, que culpam um sal, um arroz e uma soja que, por culpa da indústria alimentar, há muito deixaram de ser sal, arroz e soja para serem uma chafurdice químico-tóxica.
De acordo com o mecanismo de "retorno" ou feedback a que obedece sem excepções, o sistema não hesita em anunciar um fracasso ou um crime, desde que já tenha na grelha de partida outro crime ou fracasso comercializável.
ANTIBIÓTICOS
A revista «New Scientist» admitiu, em Fevereiro de 1987, "que o aparecimento de micróbios resistentes aos produtos químicos habitualmente utilizados começa a causar grandes preocupações ao nível da comunidade científica".
Constituindo este fenómeno da crescente resistência microbiana à crescente potência dos produtos químicos exterminadores, um verdadeiro "cavaleiro do Apocalipse", é um dos que têm sido mais habilmente disfarçados pelos mass media, que para isso existem.
Como "lepra" que é do nosso tempo, o segredo impera e a conspiração do silêncio tem funcionado em pleno e a contento.
Silêncio, segredo, censura, ocultamento, sim, até ao momento em que determinados laboratórios anunciam que "estão a produzir substâncias relativamente às quais os micro-organismos não possam desenvolver resistência."
As substâncias mais prometedoras - diz o jornal - são as quinolonas. (In "Diário Popular", 21/Fevereiro/1987).
Perante fenómenos de envergadura apocalíptica como este capítulo da guerra biológica "resistência dos micróbios aos químicos que pretendem destruí-los", o sistema põe a funcionar vários dos seus mecanismos de defesa:
- finge que não vê
- enquanto finge que não vê, dá o salto para uma nova tecnologia mais complicada que venha destronar a anterior
- silencia o fenómeno até que pode, o que não lhe é difícil pois para outra coisa não existem os mass media"
- mete a cabeça na areia como o avestruz.
Moralidade de mais uma história imoral do Apocalipse: a humanidade que se avenha com mais este extraordinário progresso de uma ciência contra a qual, de facto, não há "quinolona" que valha.
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