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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-09-21

PETRÓLEO 1979

petróleo-8> os dossiês do silêncio – texto de 5 estrelas

PETRÓLEO OU OCEANO? (*)

21/9/1979 - Poço de petróleo arde no Golfo do México desde 3 de Junho. O oceano é parte integrante da bioesfera da Terra. Entretanto, dizem todos que não podemos passar sem petróleo. E sem oceano, iremos poder?
Pesava 750 quilos a tartaruga-gigante que apareceu viva, no passado dia 4 de Julho, junto da Apúlia (Esposende). Foi capturada pelo pescador Manuel Torres Sá, que teve de a matar primeiro para conseguir dominar os seus poderosos movimentos.
Dias antes, aparecera em Vila Chã (Vila do Conde) outra tartaruga que se presume pertença ao mesmo cardume. Muitas outras apareceram depois.
Sinais dos tempos? Sintoma de que algo se passa de grave no equilíbrio dos ecossistemas marinhos?
Ninguém se atreve a tirar ilações. Mas há factos:
1 - Tartarugas não são fauna própria destas paragens e de longínquos habitats vieram;
2 - Desde 3 de Junho que o Mar das Caraíbas, rico em crustáceos, está a ser inundado de petróleo, à razão de 30 mil barris por dia, por ali se ter declarado incêndio numa plataforma submarina sem que haja possibilidades humanas de o apagar e, portanto, estancar a saída de petróleo para o oceano.
Centenas de pescadores mexicanos viviam da apanha de crustáceos na área marinha adjacente à plataforma de «offshore» incendiada. Aí nada se salvará.
Mas o problema que três meses depois se levanta já não é local. E as tartarugas que, quais transatlânticas, percorrem tão enorme distância (para fugir do petróleo) deixam entrever todos os outros animais de menor porte que não tiveram fôlego nem barbatanas para tão grande percurso.
Exiladas do seu meio ecológico, atordoadas e cansadas, as tartarugas logo foram alvo, na costa portuguesa, das atenções. E da caça, evidentemente. A que se destinava ao jardim Zoológico deixaram-na morrer por asfixia. Além de uma certa angústia, este episódio do mundo oceânico deixa-nos algumas reflexões:
- O desastre com o petroleiro «Amoco-Cadiz» que o ano passado poluiu totalmente a Costa da Bretanha, desencadeou uma onda de notícias e primeiras páginas na Informação Mundial. É estranho que um poço, a debitar 30 mil barris por dia, tão poucos telexs provoque. E mesmo esses, ignorados da Imprensa.
Há perguntas:
No âmbito dos derrames petrolíferos, não será este incomensuravelmente maior do que os outros duzentos sucedidos com cargueiros?
A que se deve a ausência de relevo dada ao facto?
Por ser o primeiro (e inesperado) acidente do género?
Por suceder num País do Terceiro Mundo que pode «bem» sofrer tudo em silêncio?
Por não haver solução técnica que combata o incêndio e estanque o derrame?
Assumirá o facto tais dimensões que os próprios especialistas foram os primeiros a entrar em pânico, constatando que nada havia a fazer, optando por não dizer nada?
Para lá dos prejuízos materiais que o México sofre (3 milhões de dólares por dia), no ponto de vista ecológico a catástrofe será tão circunscrita e localizada como as escassas notícias querem fazer ver?
Que silêncio é este no mundo do silêncio?
E o Plano das Nações Unidas para o Meio Ambiente, com sede em Nairobi?
E a Rede internacional Amigos da Terra?
E tantas organizações de Protecção à Vida Animal?
Como é possível que 3 meses após este espantoso desastre, não haja uma palavra, um aviso, um alerta? Mais: um apelo a que todas as forças do Mundo se conjuguem para tentar, in extremis, evitar o pior? Vai deixar-se correr o poço até à eternidade? Vai encher-se todo o oceano de petróleo? Entre milhões de técnicos e especialistas, não haverá um que indique a solução?
Ligar tudo a tudo - máxima da Ecologia como do yoga - não será uma perpétua angústia que esmaga as forças humanas? Quem apaga o poço, quem nos socorre?
Técnicos de todo o mundo, uni-vos ! É a 26ª hora. Digam-nos, ao menos, que não há perigo nem motivo de angústia. Garantam-nos que as tartarugas não percorreram o Atlântico. Assegurem-nos que o poço do Golfo do México será apagado. Mobilizem o mundo inteiro, se for preciso, para apagar este incêndio. Exigimos explicações técnicas que evitem o pânico.
Queremos uma esperança que acalme o desespero de alguns, como Cousteau, mais conscientes do que se está passando no abismo dos abismos submarinos, onde a Moby Dick de Herman Melville - Jeová dos Tempos Difíceis, Bíblia dos Ecologistas, símbolo da Natureza eterna contra a efemeridade humana - será a última e única a resistir.
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(*) Publicado no jornal semanário «Madeira Hoje», 21/9/1979
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