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2006-09-18

ECOCÍDIO 1979

1-2 - ecocídio-2-ie> ideia ecológica do ac – notícias do apocalipse - os retrocessos do progresso

AS CONTRADIÇÕES DA SOCIEDADE INDUSTRIAL(*)

(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «O Correio da Manhã», 18/9/1979 e no jornal «A Capital», 18-9-1979


18/9/1979 - Carter proclamando um vasto e ambicioso programa de exploração da energia solar e outras energias alternativas.
Giscard d'Estaing anunciando aos franceses que a sociedade de consumo terminou, e apelando para que se modere o produtivismo, ao mesmo tempo que insinua, também, a necessidade de enveredar rapidamente pelo desenvolvimento, como os ecologistas o têm vindo a preconizar, moderado e harmonioso.
Olof Palmer, na Suécia, chefe dos sociais democratas e recentemente «convertido» à estratégia antinuclear, por força das circunstâncias que o teriam desalojado de um Governo que cegamente teimava em promover a escalada electronuclear.
O ayatollah Khomeiny discursando, insistentemente, contra a cultura ocidental, a pseudo-liberdade das sociedades de consumo, a corrupção e a imoralidade inerentes aos costumes ocidentais e, principalmente, a sua incurável irreligiosidade, o seu ateísmo suicida.
Eis quatro exemplos confirmativos de que efectivamente os tempos estão mudando.
E por mais que se acuse de contraditório um chefe de Estado como Giscard d'Estaing anunciando o «fim da sociedade de consumo» quando foi ele, em França, um dos principais obreiros da Sociedade do Plutónio.
Por mais incompreensível que se apresente, efectivamente, um chefe do Estado como Carter a defender teses e alternativas energéticas que ainda há pouco tempo seriam consideradas «utopias de loucos e tontos ecologistas».
Por mais que alguns possam considerar «hipócritas» as afirmações de Olof Palmer de marchar para uma sociedade «pósindustrial» e as classifiquem de simples «bluff» eleitoral, pretendendo com a isca verde pescar os votos da mesma cor que na Suécia já poderão ser a maioria.
Por mais que se classifique de retrógado e tirano o «leader» da revolução islâmica, por mais que as agências noticiosas europeias lhe deformem as palavras e as retransmitam sempre em contextos que, por insólitos, as tornam risíveis.
Por mais que a «reacção» a todas estas (aparentes) contradições seja naturalmente a de hostilidade, riso, indiferença ou ataque, eis que se multiplicam as posições de políticos que necessariamente contradizem o poder, e muitas das acções que eles em outros campos são levados a assumir.
Por outro lado, os ecologistas começam a ser olhadas com desconfiança pelos seus simpatizantes.
É mesmo a altura de se acusar o ecologista de «complot» com o Poder. De traição. De inspirar afinal os oportunismos políticos e as «pontualismos» eleitorais. E os que nunca tiveram palavra de aplauso para defender as teses «revolucionárias» do ecologismo, são agora os que, em altos gritos, talvez venham acusá-los de servis, ou, na melhor das hipóteses, de ideólogos que alimentam a demagogia de presidentes à procura de assunto e popularidade.
De facto, o ecologismo começa a ser o ponto de confluência necessária para onde convergem todos os que tomam consciência dos «becos sem saída» a que o desenvolvimento conduz as sociedades e do próprio «beco sem saída» que é a sociedade de consumo ou da produção pela produção. Do desperdício pelo desperdício. Do crescimento pelo crescimento.
Daí a «aparente» contradição: mas nem os governantes são tão hipócritas e demagogos como parecem, defendendo a Natureza e os recursos dos quais tudo, mesmo a Economia, depende, nem os ecologistas se fizeram, repentinamente, lacaios do Poder.
O que une pessoas e posições tão dispares - Carter, d'Estaing, Palmer, Khomeiny e os ecologistas - é não já a ideologia mas a realista necessidade de sobreviver.
Nesta plataforma, começam a ter que se encontrar no «ponto central» ou centro de gravidade da História: Salvar a Pele.
Muitos dos mais sinceros defensores da Natureza foram antigos vendedores de pesticidas ou medicamentos.
Nem mesmo o maior tecnocrata da Europa, Sicco Mansholt, quando fez «mea culpa» do seu passado Plano Verde, verdadeiro suicídio da agricultura dos «Nove», se contradizia.
Reconhecia a soberania da realidade que dissolve fantasmas, ideologias e pré-conceitos, sejam eles quais forem, e fazia questão de o proclamar publicamente, de maneira dramática.
Acusado de ter constituído em França um das maiores «gangs» do Mundo Nuclear - facto que ninguém discute nem desmente - Giscard d'Estaing parece que teve também a sua Hora da Verdade: e as suas declarações, mesmo à luz das explosões no atol da Muroroa (perímetro das experiências termonucleares da França no Pacífico) soam-nos como um «comovente» grito de consciência.
Exemplos que nos fazem, à beira do Abismo e da Catástrofe, acreditar. Ter alguma Fé. E não desesperar totalmente deste sombrio Fim dos Tempos.
É imediatamente antes da madrugada que a noite se faz mais negra.
E tal como os profetas sempre anunciaram, até os Demónios (do Plutónio), na Madrugada da Nova-Era, serão postos ao serviço de Deus.
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(*) Este texto de Afonso Cautela foi publicado no jornal «O Correio da Manhã», 18/9/1979 e no jornal «A Capital» , 18-9-1979