CEE 1979
1-2 - 79-06-28-ie-bd> = ideia ecológica = bibliografia doméstica - scan - domingo, 17 de novembro de 2002 – até parece que adivinhei...
CEE ...PROIBIDO DORMIR A «SESTA»
[28 de Junho de 1979] - Para os que pensam a história em tempos de «materialismo dialéctico», a política é sempre o subproduto da economia (e esta, por sua vez, o reflexo da ecologia).
O 25 de Abril e o chamado «processo revolucionário em curso» pode ver-se, assim, esquematicamente talvez mas clara e rigorosamente, como a superestrutura política necessária para «adaptar» o país a determinantes económicas.
Mais concretamente : tudo se passou e passa como se o vinte e cinco de Abril e suas sequelas tivesse sido feito para integrar Portugal num dos dois mercados comuns: CEE ou COMECON.
Nesta disputa de gatos, parece terem ganho os que advogavam a entrada na CEE, quer dizer, a invasão de Portugal pelas indústrias, inocuidades e monstruosidades dos 9, agora 10, depois da «vitória grega», arquitectada, paulatina e estoicamente, pelo génio de Caramanlis.
Tanto se esforçou, que conseguiu. Argumentos não lhe faltaram: ele jogou, inclusive, quase na chantagem. Ou Mercado Comum, ou (perigo de) retrocesso à ditadura. Mercado Comum ou Dependência nacional. E assim por diante, não hesitando, como nesta última ameaça, em pisar a contradição mais flagrante: toda a gente sabe que a submissão aos interesses do Mercado Comum é a perda (total ou parcial) da independência nacional.
Escaparemos nós ao COMECON, caso um milagre de Nossa Senhora nos livrasse da CEE?
Se o processo não vai tão acelerado como na Grécia, lá chegaremos: toda a «intelligenzia» daqui, desde economistas a financeiros, de políticos a intelectuais, se está empenhando, presentemente, na maior ofensiva ideológico-publicitária a que assistimos desde o 25 de Abril. E não é dizer pouco, num período em que, efectivamente, as jogadas «ideológico-propagandísticas» foram frequentes e bombásticas.
Ir olhando a Grécia, portanto, é antever o que nos irá suceder a nós, portugueses: três em cada quatro, segundo apuramento estatístico, não sabemos o que é o Mercado Comum. Mas também um em dez portugueses não sabe o que é uma central nuclear e, no entanto, democraticamente, quando chegar a hora negra do livro branco posto na Assembleia da República, veremos que os digníssimos representantes do povo português irão eventualmente aprovar aquilo que, necessariamente, o povo português rejeitaria em bloco, se soubesse...
Mas por saber demais tem sido muita gente sacrificada. Convém continuar acreditando que são os senhores Caramanlis de cá quem tem a definitiva verdade na manga: eles nos dirão, como na Grécia ao povo grego, que a CEE «desenvolverá o nosso artesanato» (sic), criará postos de trabalho (a Renault já deu a fórmula), incentivará as nossas exportações (?), e, claríssimo, «desenvolverá, com a varinha mágica do PNB, a economia depauperada deste país», blá, blá, blá...
Caramanlis já avisou os gregos: terão de fazer sacrifícios, em troca destes progressos europeus todos e ajudas financeiras, e desde já deverão «abdicar da sesta tradicional.»
Gregos irão ficar os portugueses quando o Caramanlis de cá os obrigar a dispensar também, no Verão, as doces sestas a que estamos habituados. Teremos, como Caramanlis democraticamente exige do povo grego, que nos «adaptar às normas comunitárias», expressão doce e eufemística que quer dizer outra coisa mais forte: submissão à ditadura europeia dos poderosos e desenvolvidos, que não satisfeitos em estar num poço de trampa, a que chamam alto PNB, querem agora meter os «turcos» como nós que até agora se têm conseguido safar.
Este poço chama-se «desenvolvimento económico» até 1985, com metas muito concretas a atingir. Mesmo que alguns cavalos fiquem na pista, afinal os cavalos, como todos se lembram, também se abatem. Na perspectiva CEE, gregos e portugueses são apenas cavalos de corrida para abater.
Quem de certeza não tem dormido (sesta) nem irá dormir enquanto estes objectivos não forem alcançados, são os diligentes vigilantes do nosso interesse nacional, que desde o 25 de Abril querem meter-nos no areópago europeu.
Governos e desgovernos, crises atrás de crises, a escalada da ruína e da derrocada, não se alarmem os portugueses: tudo isso não desembocará numa tragédia, tudo isso será razão, alibi, motivo, argumento in extremis com que se dirá, automaticamente, sim à ditadura europeia.
Quanto pior melhor. Esta política de terra queimada tanto serve aos que anseiam Portugal no COMECON como na CEE. De tanga, na miséria, paralisado por estranhas greves e manias, propositadamente em crise perpétua, o País que temos é só e apenas para nos lançar, em desespero de causa, em qualquer uma dessas duas redentoras e europeias soluções. Dissoluções.
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(*) Este texto de Afonso Cautela, com este título, foi publicado no jornal diário «Correio da Manhã» (Lisboa), em 28 de Junho de 1979
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CEE ...PROIBIDO DORMIR A «SESTA»
[28 de Junho de 1979] - Para os que pensam a história em tempos de «materialismo dialéctico», a política é sempre o subproduto da economia (e esta, por sua vez, o reflexo da ecologia).
O 25 de Abril e o chamado «processo revolucionário em curso» pode ver-se, assim, esquematicamente talvez mas clara e rigorosamente, como a superestrutura política necessária para «adaptar» o país a determinantes económicas.
Mais concretamente : tudo se passou e passa como se o vinte e cinco de Abril e suas sequelas tivesse sido feito para integrar Portugal num dos dois mercados comuns: CEE ou COMECON.
Nesta disputa de gatos, parece terem ganho os que advogavam a entrada na CEE, quer dizer, a invasão de Portugal pelas indústrias, inocuidades e monstruosidades dos 9, agora 10, depois da «vitória grega», arquitectada, paulatina e estoicamente, pelo génio de Caramanlis.
Tanto se esforçou, que conseguiu. Argumentos não lhe faltaram: ele jogou, inclusive, quase na chantagem. Ou Mercado Comum, ou (perigo de) retrocesso à ditadura. Mercado Comum ou Dependência nacional. E assim por diante, não hesitando, como nesta última ameaça, em pisar a contradição mais flagrante: toda a gente sabe que a submissão aos interesses do Mercado Comum é a perda (total ou parcial) da independência nacional.
Escaparemos nós ao COMECON, caso um milagre de Nossa Senhora nos livrasse da CEE?
Se o processo não vai tão acelerado como na Grécia, lá chegaremos: toda a «intelligenzia» daqui, desde economistas a financeiros, de políticos a intelectuais, se está empenhando, presentemente, na maior ofensiva ideológico-publicitária a que assistimos desde o 25 de Abril. E não é dizer pouco, num período em que, efectivamente, as jogadas «ideológico-propagandísticas» foram frequentes e bombásticas.
Ir olhando a Grécia, portanto, é antever o que nos irá suceder a nós, portugueses: três em cada quatro, segundo apuramento estatístico, não sabemos o que é o Mercado Comum. Mas também um em dez portugueses não sabe o que é uma central nuclear e, no entanto, democraticamente, quando chegar a hora negra do livro branco posto na Assembleia da República, veremos que os digníssimos representantes do povo português irão eventualmente aprovar aquilo que, necessariamente, o povo português rejeitaria em bloco, se soubesse...
Mas por saber demais tem sido muita gente sacrificada. Convém continuar acreditando que são os senhores Caramanlis de cá quem tem a definitiva verdade na manga: eles nos dirão, como na Grécia ao povo grego, que a CEE «desenvolverá o nosso artesanato» (sic), criará postos de trabalho (a Renault já deu a fórmula), incentivará as nossas exportações (?), e, claríssimo, «desenvolverá, com a varinha mágica do PNB, a economia depauperada deste país», blá, blá, blá...
Caramanlis já avisou os gregos: terão de fazer sacrifícios, em troca destes progressos europeus todos e ajudas financeiras, e desde já deverão «abdicar da sesta tradicional.»
Gregos irão ficar os portugueses quando o Caramanlis de cá os obrigar a dispensar também, no Verão, as doces sestas a que estamos habituados. Teremos, como Caramanlis democraticamente exige do povo grego, que nos «adaptar às normas comunitárias», expressão doce e eufemística que quer dizer outra coisa mais forte: submissão à ditadura europeia dos poderosos e desenvolvidos, que não satisfeitos em estar num poço de trampa, a que chamam alto PNB, querem agora meter os «turcos» como nós que até agora se têm conseguido safar.
Este poço chama-se «desenvolvimento económico» até 1985, com metas muito concretas a atingir. Mesmo que alguns cavalos fiquem na pista, afinal os cavalos, como todos se lembram, também se abatem. Na perspectiva CEE, gregos e portugueses são apenas cavalos de corrida para abater.
Quem de certeza não tem dormido (sesta) nem irá dormir enquanto estes objectivos não forem alcançados, são os diligentes vigilantes do nosso interesse nacional, que desde o 25 de Abril querem meter-nos no areópago europeu.
Governos e desgovernos, crises atrás de crises, a escalada da ruína e da derrocada, não se alarmem os portugueses: tudo isso não desembocará numa tragédia, tudo isso será razão, alibi, motivo, argumento in extremis com que se dirá, automaticamente, sim à ditadura europeia.
Quanto pior melhor. Esta política de terra queimada tanto serve aos que anseiam Portugal no COMECON como na CEE. De tanga, na miséria, paralisado por estranhas greves e manias, propositadamente em crise perpétua, o País que temos é só e apenas para nos lançar, em desespero de causa, em qualquer uma dessas duas redentoras e europeias soluções. Dissoluções.
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(*) Este texto de Afonso Cautela, com este título, foi publicado no jornal diário «Correio da Manhã» (Lisboa), em 28 de Junho de 1979
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