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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-08-15

MACROSISTEMA 1993

restos-2 > restos reteclados - definição política do realismo ecologista - notícias da frente

O MACROSISTEMA

17/8/1993 - O tema da «sintomatologia» foi uma das constantes sistematicamente analisadas, desde 1972, pelos textos da oficina «Frente Ecológica». Começando, em 1967, pelo caso exemplar do mercado médico, onde o doente funciona de consumidor de uma poderosa indústria multinacional, longo tem sido o caminho para traçar, com clareza, uma dialéctica generalizada onde o homem se tornou consumidor e mercadoria de um colossal mercado chamado sociedade tecno-industrial. A identidade entre economia de Mercado e ecocídio têm vindo a surgir com toda a evidência. Ir às causas ou raiz de todas as doenças (no sentido mais lato da palavra sinónimo de sintoma) tem-se mostrado, assim, a démarche fundamental do ecologismo entendido como causalismo, sinónimo de radicalismo face aos reformistas ambientalistas e ambioentocratas. Com base nas edições da oficina «Frente Ecológica» será possível elaborar uma lista bibliográfica de referências sobre uma zona do chamado ecologismo que temos verificado encontrar-se totalmente ausente dos tratados de ecologia e outros ecólogos à venda no mercado. Comum. Radicalismo causal contra reformismo sintomatológico - uma constante temática na oficina de ideias «Frente Ecológica».
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«Segundo calculou Goldwin, se a sociedade dividisse o trabalho por igual entre os seus membros, todas as necessidades de uma vida civilizada poderiam produzir-se trabalhando cada pessoa apenas duas horas por dia.»
Foi o romântico Shelley quem escreveu estas palavras, 50 anos antes de Marx. Confirma-se assim que «a libertação do trabalhador» é uma reivindicação dos movimentos românticos que o «Elogio da Preguiça», de Paul Lafargue, glosou em termos que ficaram clássicos. A campanha para as «30 horas de trabalho semanais» proposta na actualidade por algumas organizações sindicais europeias, continua no entanto a ser surdamente combatida pelos partidos de todas as tendências. Eles bem sabem que a «alienação do trabalho» por um lado e o «desemprego» por outro - expresso ou latente como espada de Damocles - são ingredientes necessários para que os partidos continuem a desenvolver, cada qual à sua maneira, as suas lógicas de submissão e opressão, já que todas se fundam na ideologia do trabalho, sem que ninguém tenha a coragem de vir defender o descanso. Manter o desemprego é, no fundo, manter a preponderância dos partidos e sindicatos satélites. Redistribuir as horas de trabalho seria caminho andado para a revolução que, evidentemente, não interessa a nenhum dois partidos que vampirizam e parasitam a energia chamada pessoa humana, reduzida na nomenclatura dos políticos a seus ideólogos à categoria de «trabalhador». Virar do avesso a ideologia do trabalho - raiz de toda a opressão -é o que raros têm tido a coragem de fazer. É, no entanto, a opção do realismo ecologista, relativamente bem acompanhado. Lembro, de 1934, o célebre ensaio da escritora mística Simone Weil, intitulado «reflexões sobre as causas da liberdade e da opressão social»; mais recentemente, os ensaios de Michel Bosquet/André Gorz «Quando os Desempregados forem felizes».

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Penso que não tem sido suficientemente explorado por ecologistas um campo fascinante da investigação: procurar, através dos nossos consumos mais frequentes - de preferência os mais provocantes, supérfluos ou de luxo - descobrir até que ponto e de que maneira esses consumos são produtos em cujo fabrico entram matérias-primas obtidas partir de recursos naturais, cuja intensiva exploração conduz a alguns dos desastres e desequilíbrios ecológicos mais trágicos.
É nessa perspectiva e nesse espírito - descobrir as contradições no seio da sociedade industrial e descobrir até que ponto essa sociedade faz de nós, pavlovianamente, enquanto consumidores, cúmplices e réus de crimes contra a Natureza - quase tudo o que escrevi sobre o consumo de papel, carnes, café e bebidas alcoólicas. Não conheço livro nem autor que tenha investigado esta linha e por isso me parece de alguma utilidade reunir, num conjunto mais coerente, pistas e apontamentos dispersos, publicados ou inéditos, que relacionam os nossos consumos mais frequentes - às vezes mais inocentes - com os desastres ecológicos. Para responsabilizar destes desastres os consumidores? Também e talvez mas nem só. Evidentemente que o inimigo principal não é o consumidor. Mas deve o consumidor saber - tomar consciência - de que o inimigo o instrumentaliza («Pela boca morre a natureza»). De que maneira o sistema condiciona, prende, aliena, escraviza o consumidor para afinal o responsabilizar, in extremis, dos crimes que ele próprio, sistema, pratica?
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Seria assustador o livro de Guillofrey, se não fosse pura e simples ficção. O que suaviza esse cenário de horror descrito pelo escritor checo é sabê-lo de antemão impossível, quer dizer, impraticável, quer dizer, completamente fora da História e do real. Hilary Guillofrey, escritor checo de origem latino-americana, recentemente falecido em plena celebridade, imagina um país numa zona temperada do globo terrestre, recém-saído de uma longa ditadura. Sem se deter em descrições de paisagem - o que na época da imagem seria ocioso - ele ocupa-se mais da vida social desse povo, com uma antiga vocação do Mar mas modernamente esquecido dessas e outras antigas glórias ou conquistas.
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