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2006-03-20

SISTEMA 1974

74-03-08-ie> = ideia ecológica - quinta-feira, 5 de Dezembro de 2002-scan

A GRANDE DIFERENÇA ENTRE CRÍTICA E CONTESTAÇÃO(*)

8/Março/1974 - Toda a crítica parcial ao Sistema é recuperável, exactamente porque parcial.
Quando lemos, por exemplo, que uma marca de colchão é "resistente à chama, não inflamável e auto-extinguível'', é a indústria de colchoaria que responde às criticas feitas sobre a inflamabilidade de muitas marcas de colchão; o sistema não só recupera as críticas a esse nível como delas se serve para slogans publicitários.
Foi patente no caso do talco Hexaclorofene; depois de 30 bebés mortos, todas as marcas se apressaram a fazer propaganda alegando a suprema virtude de não matarem.
Tenho debaixo do olho um inefável anúncio de desodorizante, que fala por si e cujo texto vale a pena reproduzir na íntegra, até para lembrar à posteridade o papel relevante que neste processo de "limpeza", de "lavagem", tiveram as agências publicitárias que imaginavam tais textos. Reclamando as inigualáveis virtudes desodorizantes da nova marca, é evidente como o anúncio utiliza (voltando-as do avesso) as críticas feitas a um produto que provocava doenças e até mortes.
Ralph Nader ajudou a promover um capitalismo (uma publicidade) "de qualidade". As suas críticas parciais a isso deveriam conduzir.

Mas eis o texto:
"A desodorização inofensiva. Finalmente:
Inofensiva porquê?
Porque, pela primeira vez, o odor corporal pode ser combatido sem perigo.
De facto, o desodorizante tem como base a vitamina E, que investigações recentes descobriram ter uma imediata e eficientíssima acção preventiva do odor corporal.
A vitamina E substitui, assim, no desodorizante --- os produtos químicos tóxicos, até aqui utilizados, com a significativa vantagem de não provocar qualquer desequilíbrio biológico, devido a reacções nocivas.
Desodorizante - a primeira desodorização inofensivamente eficiente".

Outro aspecto da recuperação é o vasto campo dos antipoluentes.
A propaganda de lugares paradisíacos, por exemplo, em contraste com os infernos urbanos. Claro que os infernos urbanos foram não só cuidadosamente fabricados como propositadamente continuam a "melhorar" para que as agências de viagens e de turismo tenham o negocio do "tubo de escape" garantido
Os elogios ao Sol, ao ar puro, à água limpa e potável (roubados dos melhores textos de luta ecológica ou de prática naturista) não faltam então, quer se trate de publicitar os bairros residenciais ao estilo europeu, quer se trate de anunciar o "seu lugar para férias", quer se trate de elogiar "a calma, a paz, o silêncio que Vossa Excelência gozará" neste cruzeiro pelo Mediterrâneo (poluído e moribundo).
Roubadas à melhor talassoterapia( e helioterapia), podemos ler palavras radiosas como assim:
"É o sol que o convida a um encontro com o prazer!"
As casas de produtos dietéticos que têm proliferado nos últimos anos são outro exemplo de recuperação. O biológico é hoje a arma que uma propaganda atira contra a propaganda contrária - a de adubos, ureia, fosfatos, nitratos, pesticidas, insecticidas, herbicidas e fungicidas.

ESCÂNDALOS DA INDÚSTRIA ALIMENTAR

Foram tantos e tão sonoros os escândalos da indústria alimentar e o seu trabalho de biocídio, a sua razia e a sua indiferença, que o próprio sistema gritou "escândalo'' quando viu aí um outro filão a explorar industrialmente: os produtos ditos biológicos, não quimificados, não sintéticos, etc. O Sistema, sem hesitar, recupera para vender mais e mais caro. Voilá.
O que já em 1960 Vance Packard contava no seu livro The Waste Makers é sempre de recordar nestas emergências. Saturado o mercado com produtos de determinada linha homicida, há que saturá-lo de novo alegando que se fornece desta vez produto não homicida nem biocida. O.k.. Soma e segue.
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(*) Este texto de Afonso Cautela, a que não retiro hoje uma vírgula, foi publicado no livro edição do autor, «Contributo à Revolução Ecológica», Paço de Arcos, 1976
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