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2006-08-24

VACINAS 1973

dm-1- leituras morais - antologia para as escolas

VANTAGENS SÓCIO-CULTURAIS DAS VACINAS

[Um texto com 30 anos!]

Itens de arrumação com afinidades:
Textos arriscados nos anos 70 - Intuições de Ecologia Humana - Carta à OMS - Crónicas do Planeta terra que me foram censuradas - Inventários do tecnoterror - Grelhas abertas -Memórias de um jornalista  - O quotidiano sempre vivo - Meditação de um alentejano que ama a humanidade

30/8/1973 - ( in «Diário do Alentejo») - Vendo as vantagens sócio-culturais da vacina contra o sarampo, vantagens que me são anunciadas no folheto copiografado concedido à imprensa no decorrer da reunião em que se anunciava a campanha de vacinação em massa contra o sarampo, lendo atentamente, meticulosamente todo esse folheto, fico a pensar, melancólico e pesabundo, porque não haverá também vacinas para tanta outra coisa terrível que nos ataca: vacina contra o ruído, vacina contra o medo, vacina contra o desespero, vacina contra a estupidez, vacina contra a maldade, vacina contra a exploração, vacina contra as experiências nucleares, vacina contra o vazio das nossas vidas, vacina contra a tristeza, vacina contra os aditivos nos alimentos (cancerígenos),  vacina contra a guerra, vacina contra a fome, vacina contra o congestionamento urbano, vacina contra o surménage-o-cansaço-e-o-stress, vacina contra os óleos queimados e o fumo de Lisboa, vacina contra o retinir dos telefones, vacina contra a insalubridade de habitações e locais de trabalho, vacina contra a opressão, a poluição, os engarrafamentos, a asfixia urbana, vacina contra os mitos e sub-mitos que nos envenenam a alma, contra os pesticidas e herbicidas, contra desfolhantes e napalm,  contra a publicidade e os mitos da violência, as técnicas de aviltamento e os recordes, os gigantismos, as maratonas (espacial, atómica, supersónica), vacina contra a moda e a ditadura da moda, vacina contra o experimentalismo e o concretismo, os testes psicotécnicos e as técnicas de violação da vida privada, vacina contra o desemprego, o desconforto, o enervamento dos transportes e telefones públicos, uma vacina (até) contra a falta de trocos e a falta de dinheiro mais grado

[ espaço para o leitor escrever o que falta das muitas coisas que faltam e mereciam uma vacina preventiva].

Nos últimos tempos, várias campanhas de prevenção têm sido anunciadas: prevenção rodoviária para não deixar morrer os que se querem matar e matar os outros, prevenção contra os mortos nas praias, prevenção contra o sarampo para uma campanha de vacinação em massa (5000 contos num ano), prevenção contra o mau estado dos olhos, prevenção contra os acidentes de trabalho e as doenças profissionais (o Congresso do Porto reuniu 600 participantes), prevenção contra o ruído (que nunca mais fez ruído, o que significa ter sido um êxito)

[ espaço para o leitor escrever todas as campanhas de prevenção que ainda falta implementar]

Perante tanta campanha boa, humanitária, filantrópica, o meu coração que de humanitário, lírico, filantrópico e romântico tem muito (ah! sim, esta severidade é só aparência, no fundo sou um sentimental e um chorão), treme de fervor fransciscano à ideia de contribuir com o meu óbulo de jornalista de serviço das grandes causas contra os acidentes de trabalho, contra os mortos nas praias, contra o sarampo e o sarampelo, contra a cárie, contra a miopia, contra tudo o que é mau e feio, torto e zarolho, suicida e homicida.
[ espaço para o leitor deitar outros itens adequados ]

«Não tens vergonha de não fazer nada para evitar tanta morte, tanta doença, tanto sofrimento?»
Injustas más línguas insinuam para aí que eu, jornalista insigne. estaria contra a vacina. Que ideia, eu podia lá estar contra a indústria da vacina - se sou pelo progresso e até sou progressista.


[ espaço para o leitor colocar os consumos que quiser ]

contra os aditivos e os pesticidas, contra os media e os jornalistas que tão bem os servem, etc

[ espaço para o leitor escrever todos os produtos da toxicologia moderna ]


todas as pestes, todas as Doenças desta doença chamada ambiente (subdesenvolvido ou hiperdesenvolvido) que deve fazer a minha humildade? Resignar-se também? Aceitar? Não apelar?

(Não haver instância suprema para a qual apelar, quando o terror nos afoga, não será um dos factos decisivos dessa opressão organizada?).
Não digo que a falta de uma teoria geral do Ambiente, de uma síntese das sínteses seja culpa da OMS e que haja da parte da OMS má fé voluntária em ainda a não ter escrito: simplesmente ainda não teve tempo ou funcionários à altura de escrever essa teoria, essa síntese.
Pois bem: daqui, de Lisboa, voluntário ,  isolado e desconfiado, muito metido comigo e tímido, sempre com medo de ofender seja quem for, daqui ofereço os meus fracos préstimos à prestimosa organização, a bem da saúde mundial, do Ambiente e das campanhas filantrópicas que, sem a Imprensa, nada são no dizer grato dos que as conduzem a bem do Povo e do País.
Daqui ofereço uma síntese das sínteses, uma teoria geral do ambiente que escrevi nas horas vagas de fugir à morte na cidade de Lisboa e nos intervalos de dois minutos que as motorizadas, os jactos, a construção civil me deixam silêncio para raciocinar, meditar, reflectir, ser útil ao  próximo.
Totalmente só no universo, remando contra a maré e lutando minuto a minuto contra a peste do Ruído (entre outras pestes), foi no meio da refrega diária, da «batalha da educação» que é o jornalismo diário, que consegui uma teoria geral do ambiente que está por fazer e a OMS bem precisa.
De duas, uma: ou se vacina tudo, ou não se vacina nada. Porque enquanto se erradica ou julga erradicar a varíola ( os sintomas que formam o sindroma designado varíola) recrudesce a cólera e quando se julga ter liquidado a cólera está recrudescendo a raiva e quando se julga ter combatido  a raiva está recrudescendo a varíola e quando...
AC, in «Diário de Alentejo», 30/8/1973
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