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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-08-17

ALGA ASSASSINA 1988

paz-2> eco-ecos – os dossiês do silêncio – o sistema contra os ecossistemas – as eco-guerras

AMEAÇAS DE PAZ (*)

[(*) Este texto de Afonso Cautela, com este ou outro título, terá sido provavelmente publicado no jornal «A Capital» (Crónica do Planeta Terra), 20/8/1988 ]

20/8/1988 - Sobre o pano de fundo da guerra perpétua - o sistema que vive de ir matando os ecossistemas - bordam as superpotência o ponto de cruz das guerras parciais e particulares. Quando os canhões assinam tréguas, é sinal de que a (outra) grande guerra vai intensificar-se ou já dispensa as pequenas. Quando se move guerra total contra o Planeta, as guerras locais e regionais tornam-se obsoletas.
São matéria de primeira página quando fazem a guerra e voltam a ser manchete quando, anos e anos após, fazem a paz.
São as superpotências.
Sinos badalam de contentamento com as tréguas no Golfo - ou algures em qualquer outro golfo - mas a Comunicação Social nunca deixou, dia após dia, de dar cobertura e aproveitar as guerras e a guerrilha como matéria-prima de notícia. Outra, aliás, não é a sua obrigação.
Para a Euro-visão, que envia imagens ao Telejornal, esta polarização da informação em pontos muito precisos do Globo, tem evidentes vantagens de economia: poupa cuspo e correspondentes. Aliás, ponto do Globo onde não haja enviados especiais da France Press, da Reuter ou da TSF-Rádio Jornal, não "existem" como notícia, logo não existem como realidade.
Guerra é guerra e, pelo menos, dá notícia: quando não há mais nada a alimentar o fluxo contínuo inevitável de telexs que uma agência noticiosa tem que debitar, haja o que houver (dada a voracidade da clientela expectante), ou não haja o que não houver.
Um perigo evidente , no aspecto da inflação noticiosa a que a informação internacional está submetida, têm as pazes que agora começam a ser anunciadas um pouco por todo o lado e por tudo quanto é sítio (anteriormente) em guerra.
A paz vai deixar "brancos" no fluxo do telex, que só podem ser preenchidos com notícias da "outra guerra", na sombra até agora e até agora silenciada, enquanto a dos canhões e mísseis foi gritada , por todos os canais.
A guerra "contra a Humanidade" movida por potências e superpotências termo-nucleares, guerra que alguns designam, um tanto inexactamente, por guerra ecológica, irá finalmente ocupar o espaço das primeiras páginas que lhe tem sido sonegado?
Embora inexacta, e, expressão "guerra ecológica" corresponde a uma realidade bem definida e exacta, mesmo indiscutível. Faz-se de um continuum factual, cuja espectacularidade de vez em quando vem ao de cima, ora no campo dos recursos naturais pilhados e degradados, ora nos desequilíbrios climáticos cada vez mais catastróficos, ora na escalada da morte radioactiva, ora no requiem das florestas pelas chuvas ácidas e pelo "deboisement", ora nos massacres operados pelas chamadas doenças da civilização, etc., etc.
É esta guerra que, no aspecto informativo, raramente aparece como verdadeira guerra total que é.
As notícias surgem avulsas, sem coerência entre si, como acidentes acidentais, quando, na verdade, todas elas correspondem ao modo de funcionamento de um sistema que "vive" de ir matando os ecossistemas.
Esta guerra aparece pulverizada por acidentes soltos e avulsos, quando , na verdade, corresponde a uma estratégia global, coerente e unificada.

A ALGA ASSASSINA

Falam então os jornais, repentinamente, da "alga assassina" no Mar Báltico e de outra "alga assassina" no Mar do Norte, num artifício óbvia de nomenclatura.
Chamar "assassina" a uma alga que cumpre apenas a normal obrigação de responder ao excesso de produtos nitrogenados lançados no oceano pelas escorrências de uma agricultura sobresaturada de adubos, eis o expediente linguístico que merece sublinhado vermelho.
Assassinos , para essa nomenclatura normalizada internacionalmente , não são os que deitaram ao Oceano mercúrio, cádmio, zinco, chumbo, em doses letais; assassina, para essa nomenclatura oportunista, é a alga que , não podendo fazer mais nada, se alimenta de escorrências nitrogenadas e prolifera assim à doida, engrossando um enorme manto vegetal... Mas ainda agora a procissão vai na praça: como a vida destas algas vai ser breve já que , ao respirarem todo o oxigénio, ficarão "asfixiadas", essa massa vegetal irá , por sua vez, desencadear um processo de putrefacção nos fundos, que irá por sua vez suprimir ainda mais o oxigénio, num ciclo vicioso sem fim...
Com fim à vista e sem saída é, de facto, o Mar Báltico e o Mar do Norte, tal como até há pouco se conheciam.
Está -se a ver como a engrenagem assassina cria, fabrica os seus "assassinos" de serviço que a desculpam e ilibam. Tenta assim lavar-se de responsabilidades a tecno-estrutura sistemática - com suas leis de funcionamento irreversíveis - tecno-estrutura que efectivamente promove a tal "guerra" total, tóxica e contínua contra o Ambiente, a Natureza, a Humanidade.
A tal guerra que , enquanto tal, fica saborosamente no silêncio do esquecimento, enquanto as (outras) guerras clássicas vão ocupando o espaço dos jornais e o tempo das antenas de TV e rádio.
A tal guerra que poderá vir à superfície dos jornais, se começarem para aí a assinar tréguas a torto e a direito, a retirar tropas das Namíbias e dos Afganistões, a fazer pazes umas atrás das outras, com direito aos maiores encómios dos cronistas e da opinião pública, sempre pronta a beijar as botas dos seus carrascos.
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(*) Este texto de Afonso Cautela, com este ou outro título, terá sido provavelmente publicado no jornal «A Capital» (Crónica do Planeta Terra), 20/8/1988
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