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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-08-17

MEGA-PLANOS 1983

sistema-5- os dossiês do silêncio – o sistema contra os ecossistemas – a engrenagem –tese de 5 estrelas – o desenvolvimento do subdesenvolvimento

O GRANDE PRINCÍPIO DA RECICLAGEM
O APERTAR DO CINTO EM 1983(*)

20/8/1983 - Se um dia o sol nascesse a poente ou, vice-versa, se pusesse a nascente, havia um levantamento geral da espécie humana. O povo revoltava-se e possivelmente fazia greve se, um dia, qualquer das leis da Natureza fosse violada.
Se, por exemplo, os objectos voassem em vez de caírem por força da gravidade, toda a gente urrava de justa revolta.
Mas toda a gente viola diária e naturalmente as leis naturais, e depois dizem que a culpa é do macaco quando em vez de chover seca, e em vez de Verão temos cacimba.
A economia que temos, por exemplo, a Leste e a Oeste, promete farturas-dá-misérias, garante-desenvolvimento-promove-subdesenvolvimento. Mas todos acham bem e chamam-lhe austeridade quando o mexilhão é que se lixa.
Ambientalistas e amigos da Natureza, agora acusados de apalpar seios a secretárias capitosas, foram metidos várias vezes em tribunal plenário por "travarem o progresso". Verdade seja que algumas leis da nossa política oficial do Ambiente parecem feitas (mais) para indignar o público contra essa política do que outra coisa.
A sanha de proibir a construção em defesa do ambiente num país que precisa de casas como de pão para a boca, é exemplo de leis em prol do Ambiente que impopularizam os do Ambiente. Mas a luta contra os clandestinos, apesar de super-impopular, foi encetada por alguns municípios, falou-se até em "grande coragem política" e coisa que ninguém se atreveria a dizer é que esses municípios, ao defender a lei e o Ambiente, estavam a travar o progresso.
Mas culpam os ecologistas de sub-desenvolvimento e da miséria a que chegámos.
Só que a Austeridade, agora como um raio em cima de nos, uma das medidas que tomará é travar o desenvolvimento.
Aí está mais uma cena de travesti em que a metafísica chamada Economia nos coloca. Mesmo com a espada do FMI em cima das nossas tolas, sabe-se que ainda há ministros desenvolvimentistas a estrebuchar, querendo à viva força que o país se empenhe em planos megalómanos como o que de Sines herdámos de antigas megalomanias.
Mas o Damocles do FMI é mais forte do que estes derradeiros estrebuchos que, aliás, também se estendem a certa Oposição da Terra Queimada que continua a acusar de não desenvolvimentista um Governo onde os ministros que advogam a energia nuclear, por exemplo, nunca foram tantos.
Coisas da vida: logo o sol, desta feita, vai nascer a poente. E vice-versa: pôr-se a nascente.

FORMIGAS NO COMPUTADOR

Mas o povo acredita e está sereno. Embora seja tudo só "fumaça", o povo pratica a austeridade na abundância, aperta o cinto rodeado de quilos de pudim flã, alumia-se à luz da vela com três centrais nucleares em cima dos costados fronteiriços. Prometem-lhe a lua de foguetão mas nem as carripanas da Carris nesta Lisboa de cães funciona: Lisboa inteira mesmo não funciona, basta que uma formiga se meta no computador central dos semáforos.

O travão posto pelo acordo com o F.M.I. aos planos de desenvolvimento algo megalómanos e ditos de envergadura nacional, poderá afectar alguns que implicam maiores investimentos mas acelerar outros que, com impacto ambiental igualmente violento, exigem menores investimentos.
Se os planos chamados de capital-intensivo - Siderúrgico, Barragem de Alqueva, Petroquímico, Electro-Nuclear, Exploração de Urânio, Auto-Estradas e Vias Rápidas, - significam investimentos avultados e vão provavelmente ficar em stand by, já o mesmo não vai acontecer com outros, financiados por organismos internacionais ou por eles incentivados, mau grado o impacto negativo sobre o Ambiente: culturas agrícolas esgotantes (tabaco, cártamo, girassol, eucalipto), fibras sintéticas, Clorofenol de Estarreja (Sal-Cloro-Dioxina), Celulósico-Florestal, Prospecções Petrolíferas, Gasoduto soviético, Oleoduto da Nato, Aproveitamento de Pirites ; planos em que o capital estrangeiro proverá quando o capital português falhar.

MISÉRIA É NÃO ASSUMIR A POBREZA

Irá a imposta austeridade limitar os previstos planos de "crescimento industrial" a que se tem também chamado "desenvolvimento"? Saber-se-á quando, também aí, chegar o minuto da verdade. O que se pode afirmar, desde já, é que os planos caros de obras públicas para resolver problemas e satisfazer necessidades, podem ser substituídos por pequenas e médias soluções de "tecnologia intermédia" ou "apropriada" aos países pobres (!), pequenas grandes soluções que é costume receitar aos sub-desenvolvidos do Terceiro Mundo.
Se a austeridade imposta nos cortar os sonhos ambiciosos de desenvolvimento à moda da Europa, será que mesmo assim as pequenas grandes soluções das ta' s (tecnologias apropriadas) não encontrarão ainda aqui eco e apoio?
Será que a mais negra miséria não nos faz ao menos assumir a grandeza da nossa pobreza, abrindo olhos, ouvidos e coração às ta's?
Os grandes planos de crescimento têm acima de tudo um grande defeito: se não podem e quando não podem realizar-se - por falta de dinheiro, técnicos ou até de envergadura administrativa - constituem o maior travão ao ...desenvolvimento. Deixam-nos no vazio. Se por exemplo , o Plano Siderúrgico Nacional - o maior investimento jamais concebido em Portugal - não for viável devido à crise-austeridade-FMI, será que nos vamos todos precipitar no Atlântico?
Afinal que tipo de mentalidades e que modelos de desenvolvimento nos mergulham no niilismo cataclísmico?
As pequenas grandes soluções das ta's são sempre viáveis, sejam quais forem as oscilações da crise, as subidas do dólar e os sacões do ouro.
Se após 6 anos de seca, segundo o grupo inter-municipal do Alentejo, se reclama 150 mil contos para uma situação em que 100 mil pessoas têm faltas de agua graves, é caso para perguntar se as portas triunfais do Aeroporto decoradas por 150 mil contos valem mais que a sede de 100 mil pessoas nas duas maiores províncias do País.
Isto implica pelo menos uma pergunta: Será mesmo a economia uma questão moral?

SECOU E AGORA?

Prevenir fica mais barato do que remediar.
Exemplo: é mais económico conservar a saúde do que combater a doença. É mais económico evitar o acidente rodoviário do que manter as despesas (hospitalares e nem só) inerentes à sinistralidade.
É mais económico evitar indústrias hiperpoluentes, energívoras e devoradoras de água, do que, depois de instaladas, despoluir.
As soluções ecológicas são as mais económicas. Por definição e quando a lógica não é uma batata. A análise energética demonstra-o. Não significa que a racionalidade e a lógica sejam, entretanto, o que mais apetece aos responsáveis, enquanto o desperdício, a doença e a insegurança derem lucros a alguns.
As pequenas grandes soluções - desde as pequenas barragens às técnicas de auto-suficiência e de auto-terapêutica - significam uma austeridade mais aceite do que imposta.
O quadro que nos continuam traçando da austeridade é tanto mais negro e negativo quanto mais for desenhado no fundo de uma mentalidade e de uma ordem económico-cultural de aberrante desperdício.
Fizeram-nos crer que estávamos aqui para consumir e mamar da teta da Natureza até rebentar, para depois nos dizerem que temos de apertar o cinto até ao osso. Pagar-se-á por atacado o que não se quis pagar a prestações. A média e pequena tecnologia acaba por ser imposta quando podia já ter sido livremente escolhida.
Quando o sistema macro-económico restringe e reprime, consegue-se notar melhor o valor das alternativas de auto-suficiência , das tecnologias apropriadas aos países pobres (coisa que nunca aqui se quis assumir, a pretexto de que seria “ albanizar o País".)
Ou seja: quando sobem preços até ao delírio, era necessário que o consumidor pudesse dispensar o sistema, recorrendo ao "faça você mesmo" e ao "desenrasque-se" sozinho. Este princípio de autarcia evitaria que, no auge das crises, as pessoas fossem enforcadas nela, quando as estatizadas nos comem pelas pernas. Se as pessoas pudessem "desligar da rede geral" e ligar ao "gerador próprio" sempre que o quisessem e necessitassem, havia liberdade, pluralismo , democracia. Assim ha miséria, delinquência, criminalidade e suicídios em cadeia.

A RECICLAGEM

A Reciclagem aparece como um grande principio em relação ao qual o sistema sempre manifestou má vontade. Fechar o circuito , reciclando materiais, significa dispensar, total ou parcialmente, o recurso ao sistema geral. Quanto mais à mercê do "estrangeiro" estiver o cidadão- consumidor-contribuinte, menos se poderá defender quando os preços sobem , a inflação nos come pelas pernas e o sistema de consumos estabelecido nos enforca.
Ideia tão óbvia e lógica como é a Reciclagem, razões fortes de inércia têm contribuído para que não surja como o sol que efectivamente pode ser nesta infindável noite desta infindável crise.
Sol, esse, que como todo o Sol que se preza, nasce naturalmente a nascente e naturalmente se põe a poente. Amen.
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(*) Não me lembro com que título, este texto foi publicado no jornal «A Capital» (Crónica do Planeta Terra), 20/8/1983
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