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*DEEP ECOLOGY - NOTE-BOOK OF HOPE - HIGH TIME *ECOLOGIA EM DIÁLOGO - DOSSIÊS DO SILÊNCIO - ALTERNATIVAS DE VIDA - ECOLOGIA HUMANA - ECO-ENERGIAS - NOTÍCIAS DA FRENTE ECOLÓGICA - DOCUMENTOS DO MEP

2006-03-15

NUCLEAR 1975

75-03-15-ie-mep> = ideia ecológica = movimento ecológico português

15-3-1975

Segunda-feira, 4 de Novembro de 2002 – Mais uma bela manhã de novembro gasta com o scan deste texto entre o horroroso e o patético: no auge do gonçalvismo, a conversa era esta e nem o afonso foi imune à onda de merda que nos caiu em cima: entrincheirado num movimento ecológico que não me pertencia, a linguagem era mesmo de partir a moca mas que lhe havemos de fazer: fica como documento de um disparate que ainda por cima foi nacional –mesmo assim acho que valeu a pena andar nestas cavalgadas com os guardas do gulag: nem eles mereciam melhor e acho que tiveram o que mereciam – um afonso cautela e debitar revolução conforme os estereotipos e lugares comuns em voga nos anos 75 + ou -

POLÉMICAS COM O MEIO AMBIENTE - À ESTALADA COM OS GUARDAS DO GULAG - QUANDO A ENERGIA NUCLEAR ERA UM BOM PRETEXTO

Quer se trate de centrais nucleares, quer se trate de adubos químicos, o Movimento Ecológico não vive obcecado por uma única luta nem actua numa única frente.
Isso - essa sectorização - é o que muitos desejariam e ficariam tranquilos se nos vissem, imobilizados, numa especialidade, numa técnica qualquer. Estaríamos então no campo deles, no campo tecnocrático da Sofistica parcelarizante, a melhor forma de mistificar os problemas e enganar as populações.
Embora isso desagrade aos nossos adversários, mas a luta anti-nuclear inscreve-se numa estratégia ecológica global, na qual coerentemente se insere toda a nossa acção e todas as nossas reivindicações ou críticas.
Somos contra as centrais nucleares, não por capricho de momento, por comichão epidérmica, por antipatia ao negócio e ódio óbvio ao empório-monopólio que elas até são como espinho cravado na independência dos povos.
Somos contra as centrais, talvez por isso tudo, mas fundamentalmente por questão de princípio, por obediência ao nosso programa, por imperativo do nosso Manifesto, por coerência com o nosso pacto de indissolúvel aliança com todos os homens da Terra e sua sobrevivência, sua "qualidade de vida”.
Somos contra as centrais por estratégia política e por imposição ética. Por devoção e por obrigação. Por uma questão estética ( detestamos a fealdade e a violência) mas por uma questão lúdica também (adoramos trabalhar por causas justas e antecipadamente vitoriosas, somos crianças grandes entusiasmadas a dar pontapés em todos os criminosos, fratricidas e homicidas de profissão).
Somos contra as centrais, porque somos pelo Homem., pela sobrevivência das espécies e do Planeta. Somos contra as centrais porque somos pela Revolução e pela
Democracia Popular.
Somos contra as centrais, porque somos contra tudo o que é obstáculo à humanização e ao desenvolvimento humano, ao verdadeiro progresso e à alegria de viver.
Ser contra as centrais, portanto, implica todo um vasto e ambicioso programa que não se fica por aí mas onde a luta anti-nuclear coerentemente se inscreve entre dezenas, centenas de outras lutas justas, revolucionárias, irreversíveis.

A REVOLUÇÃO NÃO ADMITE SOLUÇÕES CONFORMISTAS DE PEQUENO-BURGUESES

O que está em causa, quando se contestam centrais ou adubos, medicina química ou escola mnemónica, publicidade e alienações drásticas de toda a ordem, burguesia instalada e imobilismos reaccionários de todos os tipos e procedências, é o tipo de mentalidade que preside à formulação dos problemas.
De um lado, a mentalidade barriguista, aquisitiva, imobilista e do conforto consumista ou pequeno-burguês, crê e obriga-nos a crer que não poderá passar sem adubos, centrais, medicamentos, automóveis, exames, publicidade trabalho em cadeia e demais subprodutos de uma sociedade não revolucionária.
Admitindo mesmo as razões ecológicas que condenam tudo isso e põem tudo isso em causa, dirá a mentalidade barriguista, passiva, anti-dialéctica que "nós precisamos desses males" que "são males necessários”(sic).
Ora uma mentalidade revolucionária parte de zero, no que respeita a compromissos com ordens homicidas anteriores, ou antes, parte do homem para ao homem regressar, gostando de criar sobre uma folha em branco...
Renunciar às centrais e aplicar-se a fundo na pesquisa e no fomento das maravilhosas fontes energéticas que potencialmente se nos apresentam como as energias do futuro, eis o que cativa e polariza as energias revolucionárias do verdadeiro patriota, o que tem o amor das dificuldades, o que as enfrenta com espírito indagador e tem ódio à rotina, ao imposto, ao já feito e ao já dito.
Com vontade, com imaginação, com coragem, o espírito revolucionário não hesita em desbravar o que estiver virgem, se nesse campo virgem é que está o homem e os interesses fundamentais do homem.
Os argumentos pequeno-burgueses e conformistas já os conhecemos, nós, os guerrilheiros do Movimento Ecológico. Não se pode mudar de um dia para o outro um sistema monolítico. Os outros já fizeram - diz-se - disparates e nós temos que fazer disparates iguais, “há que atender a necessidades prioritárias”.
Pois em relação às fontes energéticas revolucionárias, nem sequer é o Movimento Ecológico a proclamar que estamos perante uma prioridade prioritária.
Mobilizem-se homens de senso e acção, de boa vontade e de pronta arte dialéctica, mobilizem-se patriotas para fazer a revolução energética também, e o Movimento Ecológico estará disposto: ou a colaborar de alma e coração se lhe pedirem colaboração; ou a ir dedicar o seu tempo em outras campos igualmente prioritários que reclamam a nossa intervenção se outros e muitos houver, mais abalizados do que nós, capazes de empreender a necessária e iminente revolução energética por que o País e o Mundo anseia.
Estamos prontos, se nos chamarem. Teremos outras tarefas, e muitas, a que nos dedicarmos, se se entender que outros farão e farão certamente melhor do que nós, o que a Revolução Portuguesa exige de todos nós, no campo-chave das alternativas energéticas de Futuro.

II

Vamos agora supor, como lamentava o “Jornal do Comércio” de 7 de Março de 1975, numa nota anónima, que, para lá de todas as nossas boas intenções, do bem fundamentado dos nossos argumentos morais e da real motivação revolucionária daluta anti-nuclear (tudo o “Jornal .da Comércio” reconhece), não tínhamos qualquer noção da realidade objectiva, não dispúnhamos de alternativas limpas para as energias hiper-porcas, nem conhecíamos respostas para o grande impasse em que pretendem atascar-nos e que é " Energia Nuclear ou subdesenvolvimento".
De facto, o que a intensiva propaganda da mentira, da inércia e da rotina nos tem feito crer, através de uma desinformação verdadeiramente metralhante, telecomandada pelos grandes centros produtores de centrais, é de que não existem alternativas, ou de que a sua realização está demorada e improvável..
Vamos supor, pois, que o beco sem saída criado pelos monopólios da Tecnoburocracia não tinha mesmo saída, porque assim o queriam os tecnocratas que conduzem os povos e as nações aos mais incríveis "becos sem saída". (O tecnocrata é mesmo estruturalmente um beco).
A verdade é que, ao verificar a urgência e necessidade de encontrar saídas alternativas, nem sequer era a nós, eco-tácticos e ecomilitantes, que isso competia.
Nunca é demais repetir que não é a nós, os da Ecologia, modestos aprendizes de humanismo no meio da violência desencadeada, no meio da verborreia mais alienante da liberdade e da imaginação humana, que compete resolver os imbróglios que o sistema cria e fomenta, através do seu princípio "complicador" imutável.
Por isso, seria ainda das estritas obrigações do Sistema e seus tecnocratas, "inventar" outras soluções, quando a insolução nuclear e todas as insoluções típicas, se apresenta, por todo a Mundo, como suicida, ecocida, biocida, genocida, anti-económica e anti-ecológica, anti-humana e anti-histórica, anti-ecológica e anti-lógica para supremo absurdo.
No entanto e se nos derem uma sede, se a Imprensa não continuar fazendo a sua conspiração de silêncio aos nossos comunicados, se os nossos compatriotas pensarem um pouco menos na ganância de amealhar mais dinheiro e mais horas extraordinárias e vierem trabalhar connosco, se os sócios pagarem e os assinantes do Boletim não se esquecerem de contribuir com o seu óbulo, se , enfim, todos ajudarem o Movimento ecológico a ser um movimento cívico de influência, uma força política de alternativas racionais e lúcidas, a ter estruturas, a organizar-se, a ser activo nas suas campanhas e bem sucedido nos seus apelos, o Movimento Ecológico responde ao “Jornal do Comércio” que até tem as soluções para os becos sem saída e problemas que o Sistema se encarregou de arranjar.
Porque somos profissionais da qualidade e da Vida, profissionais da Revolução Cultural e das Alternativas, até sabemos as alternativas e conhecemos as saídas para o campo energético como para todos os campos da praxis humana, aparentemente amordaçada no imobilismo criminosa dos monopólios

III

Mas atenção: neste campo nuclear como nos outros, o mais importante não é, neste momento, atirar com soluções e expedientes de propaganda.
O mais importante, para a solução de todos os nossos problemas nacionais e nem só o energético, é reformulá-los a partir de premissas verdadeiramente causais e revolucionárias, a partir de uma base imaginativa e alternativa, inscritos numa estratégia de lucidez crítica, de imaginação criadora, de revolução cultural como os nossos primeiros responsáveis tantas vezes têm indicado e aconselhado.
Nenhuma solução haverá para nenhum problema sem uma reformulação revolucionária de todos eles. Sem um breve recuo de um passo que nos permita avançar dois.
É preciso travar as anti-soluções, reflectindo sobre as soluções verdadeiras metermo-nos todos ao trabalho fascinante de inventar o nosso próprio futuro.
O que está em jogo, quando se projectam metros ridículos como o de Lisboa, ou centrais nucleares na região de Peniche, é a incapacidade prospectiva e revolucionária de técnicos e engenheiros ditos responsáveis, neste País, mas que efectivamente acoitam a irresponsabilidade na áurea mitológica da infalibilidade papal, com que se vão abençoando uns aos outros e amaldiçoando o País.
Com os avanças na exploração da energia solar, a energia nuclear tornou-se tecnica e economicamente obsoleta e, por força das suas mortais contradições internas, tornar-se-á dentro em breve uma peça de Museu.
Ora é essa peça de Museu que a CPE quer oferecer ao País, como nos bons tempos em que tínhamos de receber de braços abertos todas as velharias que os americanos não queriam.
É isso - esse anacronismo - que os empedernidos técnicos teimam em não ver, porque apenas olham às conveniências e compromissos em que se envolveram para maior provento pessoal, porque apenas olham ao momento e às conveniências de uma empresa (e às vê vezes nem isso) sem atentarem, como nunca atentaram, nos verdadeiros e superiores interesses nacionais.
O que se deve formular neste momento como prioridade prioritária é o problema da aceleração tecnológica, a que tão pouca atenção se dedica entre nós e que tão depressa tem criado empedernidos reaccionários em técnicos que se julgam o último grito da técnica moderna.
A ignorância desta antecipação prospectiva, pode levar-nos a fazer investimentos catastróficos e astronómicos em indústrias que parecem hoje prósperas e que daqui a meia dúzia de anos estão ultrapassadas, pode levar-nos a erros tão abissais como o do Metro lisboeta mas de repercussões mais graves e profundas do que ele.

Todos sabemos que a energia nuclear - um erro que dura há 25 anos e que está em vias de ser enterrado para sempre, antes que para todo sempre nos enterre a todos - face às novas fontes de energia não poluentes e de rendibilidade económica praticamente infinita, deixou de ter interesse, a não ser para brincar às bombas no Pacífico e na Sibéria, em Lop Nor ou no Alasca.
Perante esta evidência, porém, qual a posição dos técnicos a respeito da "velharia" nuclear?
As últimas opiniões vindas a lume não deixam esperanças nenhumas.

IV

Ou o povo deste País e os homens deste Mundo têm mão nos desmandos tecnocratas, ou o poder popular controla o poder tecnológico, ou os interesses vitais (saúde, segurança, sobrevivência, vida e qualidade de vida) da população se sobrepõem aos mitos e mitómanos, sofismas e negócios da mafia internacional que, rechaçada já em vários países, pretende implantar agora no nosso o reinado da inevitabilidade e da indiscutibilidade nuclear, ou a Revolução de Abril ganha na frente da Revolução Cultural , ou estará seriamente comprometida nos seus fundamentos humanistas, tão clara e repetidamente reafirmados pelos responsáveis mais qualificados do M.F.A..
O que um bom cidadão e um patriota deve pensar do Programa de Política Económica e Social, na sua generalidade, é que nele se infiltraram, como sempre se infiltram, as influências tecnocráticas que, em vários departamentos de Estado, se têm verificado existir e coexistir, depois do 25 de Abril, com algumas tendências humanistas.
Algumas dessas tendências tecnocráticas vieram mesmo do anterior regime, em directo, como aconteceu ao secretário de Estado da Energia, que foi próximo colaborador de Kaulza de Arriaga, na Junta de Energia Nuclear em que este era o imperador.
Por isso as tendências humanistas têm, a breve trecho, inclinação para ficar submersas pela avassaladora capacidade reprodutiva, de manobra e absorção que caracteriza o camaleão tecnocrático.
Sem ideologia, como ele se pretende, a verdade é que o tecnocrata se adapta às circunstâncias políticas mais opostas, ficando sempre onde as conveniências e conivências o chamam.
Podia pensar-se que, com a orientação política verificada no nosso País após o 28 de Setembro e o 11 de Março, o tecnocrata amainaria um pouco da sua arrogância típica e da sua chata verborreia . Mas tal não tem acontecido. Ele continua a cantar de galo e várias ocorrências públicas dão disso testemunho.
Fingindo ignorar o Movimento Ecológico Português, a mafia tecnocrática manda , no entanto, espiões aos nossos colóquios, para registarem os militantes mais activistas da Ecologia.
No nosso II Encontro, várias sabotagens de última hora comprovam-nos de que elementos da reacção tecnocrática quase iam conseguindo anulá-lo e ao êxito que, apesar de tudo, esse Encontro conseguiu, na mobilização de vontades e de capacidades.
Durante um colóquio no Laboratório Nacional de Engenharia Civil, dia 1 de Março à tarde, o espectáculo foi, como se previa, comovente e edificante e terno.
Os engenheiros da C.P.E (Emílio Rosa e Abílio Fernandes) fizeram calmamente a propaganda da firma, à mistura com alguma água pé, no que foram mais ou menos coadjuvados por engenheiros restantes, que , mesmo quando comentavam, o faziam
reticentes, timidamente, como se a vitória já estivesse no papo da C.P.E. e seus papistas.
Nunca falando claro (está quieto...) estes mostraram-se na sua habitual prudência, nunca explicitando em que ponto do país já estão fazendo escavações para os alicerces da primeira central e se a central vai ou não vai por diante.
Pedi a palavra, apenas para saber factos, mas é claro que nunca ma deram, havia sempre um engenheiro mais na bicha e onde há engenheiros não cantam jornalistas. A não ser que o jornalista esteja presente para fazer o frete informativo-propagandístico aos engenheiros, pois nessa altura até o recebem com drinks e bolinhos de bacalhau.
Entretanto, de alguns engenheirais mais politizados, foram-se ouvindo críticas violentas à central americana que a C.P.E quer instalar: É claro, a conclusão que um observador neutro , quer dizer, lúcido, com o cérebro por lavar, retirou, era de que o problema estava portanto e apenas em se o País irá comprar (empenhar-se até aos cabelos) por cerca de 10 milhões de contos, uma central de fabrico norte-americano, de fabrico francês ou (eventualmente) de fabrico soviético
A luta, nessa tarde, mesmo quando tomou a palavra outro funcionário da C.P.E, o eng. Gaspar Teixeira para criticar os seus colegas Abílio e Rosa, - foi nitidamente entre quais fornecedores de centrais teriam a dita de nos meter cá uma, não propriamente contra as centrais, seu carácter de ruína económica, seu anacronismo como fonte energética, ecologicamente e humanamente suicida, homicida, biocida e fratricida.
Pelo departamento dos Reactores - o CRNI, da Avenida da República - afirmou alguém que o País não dispunha de avanço tecnológico para se meter numa embrulhada-alhada dessas - e que iria colonizar-se tecnologicamente ainda mais a uma potência tecnologicamente avançada, mas logo da C.P.E. ripostaram electricamente que tudo estava superado pela magia da importação.
Momentos depois, no intervalo da contenda e em conversa com engenheiros amigos (um homem até pode ter amigos entre os engenheiros!) tive ocasião de saber que a construção de centrais não levanta (sic) qualquer problema tecnológico aos nossos bem apetrechados quadros, porque os americanos, especialistas no pré-fabricado, fazem-nos isso já pronto a (in) vestir, com a chave na mão e tudo.
"A França e a Itália tiveram que rever todo o programa energético" - ouviu-se a certa altura, no solene anfiteatro todo forrado de microfones e altifalantes e quem o disse certamente acabava de ler Le Nouvel Observateur (1) onde 1000 cientistas explicam de que maneira drástica e espectacular todos os programas nucleares, mesmo os de carácter mais duramente fascista como o francês, estão fazendo marcha atrás, por força dos próprios argumentos económicos.
O engenheiro Rui Neves, do CRNI, foi o único que durante aquelas longas e aborridas horas de remastigação, teve a coragem de pronunciar, uma única vez, a palavra "Ecológico", tendo pedido como condição prévia a estes debates técnicos e a qualquer aventura de nuclearização, o que ele designou - e muito bem - por "debates fundamentais", "as relações entre a estrutura política e a Economia do País e a Produção de energia.”
E a pergunta ficou no ar: "A Economia segrega a Energia ou a Energia segrega a Economia?"
Claro que nem uma coisa nem outra; de uma perspectiva humanista e anti-fascista, quer dizer, ecológica, tudo terá de subordinar-se ao desideratum ultimo e único -"a progressiva mas acelerada qualidade de vida de todos os portugueses" .» e, portanto, quer a Economia quer a Energia têm de ser mandatárias das condições ecológicas básicas a que bem-estar, segurança, sobrevivência, saúde, vida e qualidade de vida do Povo Português automaticamente obrigam toda e qualquer política, seja ela económica, energética, do Ambiente, das Pescas ou do Turismo.
Note-se, no entanto, que mesmo nestes simpósios de engenheiros - mais interessados nos respectivos sectores e negócios do que no futuro do País e da população portuguesa - não deixam de se fazer ouvir sensatas observações que, evidentemente, o militante ecológico já perfilhava e regista mas de cuja demagogia tem sérias razões para desconfiar: " grandes dúvidas levanta a Energia Nuclear: não virá criar mais problemas do que resolver?"
A verdade é que logo a conversa, segundos depois, mergulhou de novo no charco do pormenor, pressupondo, portanto, que as centrais são inevitáveis, necessárias, urgentes, mesmo indiscutíveis.
O debate fundamental reclamado pelo Eng. Rui Neves e por todo o português que seja digno desse nome, logo se esqueceu a seguir, no mar das coisinhas de pormenor,das especialidades, das matérias sectorizadas, nas marcas de reactores a utilizar ou não, - maré magnum de lama e sofismas que é a fina e firme especialidade de todo o especialista que se preza mestre em especialismo.
Quem paga, no entanto, todos estes luxos e masturbações?

V

OS CRÓLOGOS E OS NECRÓLOGOS

Em outra altura, já tive ocasião de sublinhar como o debate dito liberal e aparentemente democrático é um pilar da Sofistica Tecnocrática, uma das suas cedências tácticas quando se vê apertada por homens que, não tendo perdida a lucidez, teimam em fazer as perguntas fundamentais e em pedir contas aos responsáveis pela ruína ecológica, tão ligada necessariamente a uma ruína económica a que queremos todos obviar.
Admitir, por exemplo, que as centrais nucleares estão sujeitas a debate, ou que a bomba , os pesticidas e os medicamentos estão sujeitos a controvérsia, eis a manha, eis o truque.
Aqui e mais uma vez há que ultrapassar este engodo liberalesco com uma afirmação básica de princípios: a Democracia não pode sobrepor-se à Revolução e o conceito que tem de prevalecer, para saber se um assunto ou problema é controvertível, é o de “Revolução”.
Avançar na Democracia jamais pode significar recuar na Revolução, porque esta é que é prioritária e, no caso do Terror Nuclear, o que está fundamentalmente em causa
é o carácter intrinsecamente reaccionário, contra-revolucionário da estratégia nuclear
Ora é precisamente a coberto desse "direito à opinião" - que acaba por ser um direito à Asneira, ao dislate e ao livre envenenamento da opinião publica - que ultimamente têm aparecido na nossa Imprensa (sempre tão afobada com grandiosas problemáticas extra-ecológicas) artigos sobre centrais nucleares que oscilam entre a meia crítica das meias tintas (caso "Diário de Lisboa", artigo de Rui Rosa, em 3 de Março de 1975); a pancadinha nas costas ao Movimento Ecológico a recomendar-nos juizinho, a nós, rapazes "líricos e bem intencionados" que queremos acima de tudo a “Qualidade de vida de todos os portugueses " - oram vejam lá o despautério das nossas ambições! - mas que não temos noção nenhuma "realista" (sic) dos imperativos económicos! etc., como foi o caso de uma amável e anónima nota paternalista do "Jornal do Comércio"; ou o delírio hiperbólico de um senhor S.L., anónimo como convém nestes casos (dar a fronha não é com eles), que só diz isto e nem sequer deve ser para irritar os rapazes do M.E.P. :
" Nesta linha de privilegiar a energia eléctrica, o Programa é particularmente feliz ao apontar a construção de uma central nuclear que entrará na rede no princípio do próximo decénio "- diz o anónimo S.L. referindo-se ao Programa de Política Económica e Social, para acrescentar logo o seguir:
"A energia nuclear é, hoje em dia, e sê-lo-á nos anos mais próximos, na generalidade dos casos, a fonte de energia mais barata e menos poluente, isto apesar das opiniões contrárias de alguns crólogos (sic), desde que sejam tomadas por parte das entidades públicas as medidas necessárias para obrigar à utilização de critérios e dispositivos de segurança convenientes."
Nota-se, nesta prosa anónima, alem da bajulação ao Programa de Política Económica e Social, além da gralha giríssima do "crólogos" - eles serão os "necrólogos"? - a terrivelmente grave reincidência no sofisma de que "o nuclear é a fonte de energia mais barata e menos poluente"
Afirmação passível de tribunal, só não é possível fazê-lo, porque, como é da praxe em afirmações tais, a fonte é anónima e de Irresponsabilidade Ilimitada. Por isso dá bem a medida do crédito a dar-lhe, da honestidade mental e moral que lhe preside e da franqueza, da coragem, da isenção com que estes necrólogos argumentam com seus podres argumentos a favor daquilo que não tem defesa nem justificação possível, sob qualquer prisma que se veja.
O que leva, no entanto, certos anónimos a continuar fazendo afirmações dessas? O que os leva a esconder a cara? Porque não comparecem para discutir? A quem servem tais infiltrações?
As respostas a estas perguntas é que o Movimento Ecológico gostaria de saber. Porque responder a tão absurdos argumentos, é o que nem vale a pena e temos todos mais que fazer.

VI

Entre os episódios mais recentes da ofensiva pró-nuclear entre nós, deve notar-se o comunicado que a Secretaria de Estado da Indústria e Energia enviou aos órgãos da Informação, em resposta ao abaixo-assinado de 512 assinaturas contra as centrais e onde, entre outras coisas de somenos, se deve antologiar o seguinte:
- Reconhece-se, em 4 de Março de 1975, o direito da população portuguesa ao debate, quando em 13 de Novembro de 1974 se reconhecia e anunciava ao País o facto consumado das centrais;
- Reconhece-se a vantagem da discussão, quando o Programa de Política Económica e Social, a páginas 102 e 103 da sua edição em livro, textualmente afirma:
"Quanto à Energia Nuclear, é indiscutível a necessidade de dispor de uma primeira central no inicio da próxima década, o que exige que a respectiva decisão seja tomada até meados de 1975”.
" Esta necessidade é determinada pela aproximação do total aproveitamento dos recursos hidráulicos e pela necessidade de uma alternativa face às centrais térmicas clássicas com base no petróleo. Também do ponto de vista da progressiva apropriação de novas tecnologias, é importante a construção da primeira central nuclear. O País dispõe de reservas de urânio que estão a ser directamente exploradas pelo Estado, havendo que estabelecer contratos para o respectivo "processo de enriquecimento", de preferência não limitados a uma única fonte de fornecimento."

Com o comunicado acima referido e a seguir transcrito, a secretaria de Estado da Indústria e Energia contraria, afinal, o Programa de Política Económica e Social, e não compreendemos porque o faz.
Só porque recebeu um abaixo-assinado de 512 pessoas?
Será que a opinião pública tem peso e que a voz do povo português é algo que começa a ter direito de interferência nas decisões e posições de cúpula?
Seriamos nós, os do Movimento Ecológico, os primeiras a regozijar-nos com isso.
Ainda sobre este célebre comunicado, logo se revelaram mais papistas do que o Papa os dois jornais que são a vanguarda da Democracia Portuguesa;
"República" dizia em título:
"A ENERGIA NUCLEAR É INDISPENSÁVEL EM 1980"
e o "Jornal do Comércio" acompanhava:
"NÃO SERÁ POSSÍVEL DISPENSAR-SE O RECURSO À ENERGIA NUCLEAR
NO PRINCÍPIO DA DATA DE OITENTA”
É caso para dizer que, nisto de centrais, a radiosa Imprensa vai de oito a oitenta.

VII

Transcreve-se agora o comunicado enviado pelo Ministério da Comunicação Social aos órgãos de Informação , em 4 de Março de 1975 :

«Foi recebido no Gabinete do Secretário de Estado da Indústria e Energia uma carta acompanhada .de algumas centenas de assinaturas com o objectivo de protestar contra a instalação de centrais nucleares em Portugal e solicitando que, sobre esta matéria, seja aberto debate público. Como não consta da carta recebida neste Gabinete qualquer indicação de morada, tem a resposta de fazer-se através dos órgãos de informação.
«Ela é, aliás, muito simples; a Secretaria de Estado da Indústria e Energia deseja que sobre este, como sobre outros assuntos de grande importância, se estabeleça efectivo debate público e de crítica às decisões que a eles respeitam. Entende ainda que sobre a matéria das centrais nucleares há uma grande necessidade de informação geral, tendo já nesse sentido encarregado a Junta de Energia Nuclear de preparar um conjunto de acções que permitam um efectivo esclarecimento. Considera-se essencial não partir para uma discussão com base em ideias pré-concebidas, sejam de que natureza forem.
«As necessidades energéticas do nosso país vão aumentar significativamente nos próximos anos, inclusive pela circunstância de a actual capitação energética se situar nos escalões mais baixos quando comparada com a generalidade dos países europeus, tanto ocidentais, como do Leste. Já depois do 25 de Abril, o Governo Provisório decidiu antecipar a construção de um aproveitamento hidro-eléctrico (o do Pocinho, no Rio Douro ) e estão em curso os estudos necessários à definição de novos aproveitamentos hidro-eléctricos que ainda seja possível realizar economicamente, bem como o aproveitamento das lenhites de Rio Maior e formas novas de produção de energia utilizável a partir de fontes não convencionais como a energia solar e geotérmica. Os estudos já realizados e o conhecimento das futuras necessidades energéticas, indicam claramente não poder dispensar-se o recurso à energia nuclear no princípio da década de 80. Tal não impede, porém, que se realize uma ampla discussão sobre o problema. O debate está, pois, aberto, esperando-se que da sua concretização possa resultar a melhor orientação para a política energética e a qualidade de vida do nosso país.
«Regista-se finalmente o aspecto de particular importância no que concerne às preocupações mais imediatas dos signatários que se dirigiram a este Gabinete , - o controle dos eventuais efeitos do funcionamento das centrais nucleares só adquire verdadeiro significado quando estabelecido a uma escala internacional. No caso concreto do nosso país, é mais importante neste contexto a instalação de centrais nucleares em Espanha junto dos rios que depois têm trajecto no nosso território, do que a instalação de uma central na nossa costa atlântica.»

VIII

Gomo se verifica por estes episódios cómicos atrás relatados, a recuperação do debate e do direito "democrático à controvérsia'' (quer dizer, à asneira), estava assim feita, rápida e eficazmente, pelos sempre eficazes rapazes que sabem da poda e como se recupera a mais indigesta das contestações.
Os outros vespertinos e matutinos, mais sóbrios de títulos, não quiseram a oportunidade para fazer campanha pró Terror Nuclear, o que foi pena para eles porque o comunicado estava precisamente elaborado nesse sentido, embora aparentemente concordasse com o abaixo-assinado dos 512 discordantes e declarasse concordar com o debate.

IX

Portanto e dados os eventos atrás narrados, o que o Movimento Ecológico tem para apresentar como proposta mínima razoável, humana, patriótica , democrática e revolucionária , é uma chamada à razão de todas as forças progressistas deste País para que cerrem fileiras em defesa das condições ecológicas mínimas e básicas para a almejada “qualidade de vida" de todos os portugueses
No sentido de tomar uma decisão com impacto público e de assumir responsabilidades perante a consciência nacional, o Movimento Ecológico Português apresenta, sob a forma de proposta e de futuro abaixo-assinado, o texto que a seguir se transcreve»
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(1) «On peut se passer des centrales Nucleaires”, in «Le Nouvel Observateur”, nº 537 , 2 de Março de 1975. Refere-se também o artigo de Michel Bosquet «Énergie Nucléaire», no mesmo semanário, nº 534, 9 de Fevereiro de 1975
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