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2006-01-19

HOLÍSTICA 1986

86-01-18-cm>=diário de um consumidor de medicinas

18-1-1986

CARTA DE UM CONSUMIDOR DE TERAPIAS LEVES AOS SEUS TRATADORES

PROJECTO HOLÍSTICO «PROFESSORES DE SAÚDE, PRECISAM-SE»

Se não tiver mais nenhum mérito, este texto (inédito) terá pelo menos a particularidade de citar, há 14 anos, o célebre «acto médico», «pedra sobre a qual a religião médica edificará a sua igreja», como também digo...Outro mérito deste texto é invocar a autoridade da Organização Mundial de Saúde para defender a área holística do tal famigerado «acto médico». Outro mérito deste texto é demarcar a linha de separação entre consumidor de naturoterpia e naturoterapeuta, distanciando-me dos naturopatas enquanto consumidor, através do expediente que utilizei: uma carta do consumidor de terapias leves aos seus tratadores... Outro mérito deste texto é dizer claramente que não estou rendido perante nenhuma doutorice de nenhum senhor doutor, o que tem permanecido até hoje o tabu mais persistente e mais perigoso de defrontar. Nele se encontram alguns dos pontos fundamentais para um manifesto definitivo em favor da causa holística. (8/Setembro/1999)

18/1/1986 - Permitam-me que venha aqui falar-vos na qualidade de consumidor entre milhões de consumidores que, em Portugal, necessitam e procuram os vossos serviços, os vossos cuidados.
É grande a responsabilidade de uma profissão que, apesar de mal conhecida e não reconhecida pelas autoridades, é procurada por milhares de utentes.
Na qualidade de consumidor, portanto, e também de beneficiário da Segurança Social que não pode beneficiar nada dessa segurança pela razão de que recusa a medicina química, permito-me submeter à vossa apreciação algumas considerações que têm apenas um objectivo: contribuir , dentro da minha profissão e do meu campo de acção, para que a classe profissional a que pertenceis - os técnicos holísticos de saúde - ganhe o estatuto de dignidade e autonomia a que tem direito.
Por estranho que pareça e neste momento de conjuntura nacional, a questão é fundamentalmente de palavras. Trata-se de escolher as palavras justas e adequadas ao momento, trata-se de conquistar a linguagem que corresponde a um projecto e definir esse projecto que, por sua vez, corresponde a um espaço social autónomo que vos pertence.
Não se deve esquecer que o poder médico estabelecido assenta a sua força numa expressão aparentemente inocente mas que é o seu maior cavalo de batalha: o famoso «acto médico», com efeito, é a pedra sobre a qual a religião médica pretende edificar a sua igreja.
No entender de alguns médicos, terapeutas e utentes que reflectiram sobre esta questão, trata-se de ganhar tempo, espaço e palavras, antes que outros usurpem o tempo, o espaço e as palavras, perdendo vós (e nós, consumidores) a oportunidade única que agora, e só agora, nos é dada para ter uma pátria onde habitar.
A essa pátria e para já, eu chamaria Holística.
Penso que antes de mais nada deveis considerar uma realidade: Portugal é tido como um país de doutores. Todos aqui querem ser doutores. Entretanto, ninguém se lembra do consumidor, que não é dr. , em coisa nenhuma, a quem compete pagar os altos preços dos serviços prestados pelos doutores e em cujos direitos quase nunca ninguém pensa.
Entre doutores em medicina e doutores em naturopatia , trata-se, no meu modesto entender de consumidor, de criar e institucionalizar uma nova profissão para os novos tempos: professor de saúde é, quanto a mim, a palavra de ordem e polariza todo o processo, todo o projecto.
Falei em projecto. É a grande démarche que o nosso tempo impõe. Deixando a doutorice aos doutores, a doença aos médicos e a naturopatia aos naturopatas, uma nova área, criadora, dinâmica, se abre ao ano 2000, conforme a meta apontada pela Organização Mundial de Saúde. Essa meta é a área holística de saúde. Por isso o nome é projecto holístico.
Deriva daqui um outro ponto fundamental. Estar do lado contrário ao da medicina (que existe para combater a doença) significa que estamos do lado da saúde e sua conservação. Vocês, técnicos holísticos, serão os técnicos em profilaxia, prevenção, defesa e conservação da saúde.
Posto isto, surge o ponto seguinte: para conservar a saúde é preciso ensinar os doentes e conservá-la. Por isso é preciso formar professores de saúde e fazer de cada doente um estudante de saúde. Trata-se, enfim, e como recomenda a OMS no seu programa «Saúde para Todos no Ano 2000», trata-se de democratizar a medicina pelas autoterapias, enfim, pela educação higiénica em geral e alimentar em especial.

Surge o ponto seguinte: o conceito de higiene, que tem um século, surge renovado no ano 2000, com todas as correntes que entretanto o ampliam e aprofundam:

Artes Naturais de Curar
Defesa ecológica do consumidor
Epidemiologia
Higiene pública (a que se chama erradamente saúde pública)
Luta anti-poluição
Saneamento Básico
Segurança do Peão e do Cidadão
Socorrismo
Toxicologia alargada (Ecologia Humana)

É a toda esta área que eu chamaria área holística.

E surge logicamente o ponto seguinte. A cada um destes itens a sua função em funções convergentes num ponto:
a saúde e a manutenção da saúde do cidadão consumidor. cada um, portanto, a sua função: aos médicos a doença mas a saúde aos professores de saúde e seus alunos, que até agora são os consumidores resignados, utentes e beneficiários, resignados e não saber quem os adoece e mata, mais ou menos desembolsados e reembolsados pela segurança que só existe para apoiar economicamente o sistema médico-farmacêutico existente.
Mas para que o consumidor ganhe autonomia é preciso também ganhar responsabilidade, por si próprio e pelo seu corpo. Esse é um trabalho difícil - a reeducação das pessoas no sentido da autoterapia - tem que ser institucionalizado e não pode continuar a ser resultado da boa vontade de alguns carolas armados em mestres de si próprios (auto-didactas). Tudo na vida, note-se, empurra as pessoas para a irresponsabilidade consigo próprias - a sua alienação - e para entenderem o seu corpo como uma «coisa» que não lhes diz respeito e pelo qual não têm que se responsabilizar. Ao professor de saúde compete ensinar as pessoas e compreender que o corpo e a vida de cada um é um bem (inestimável) que lhes foi doado e pelo qual têm a estrita obrigação de se responsabilizar.
Curiosamente, esse dever e direito de cada um se cuidar e cuidar da sua saúde, está consagrado no artigo 64 da Constituição da República, o que talvez seja não só caso único em todo o mundo mas um das medidas mais civilizadas que o 25 de Abril nos trouxe.
Artigo esse, curiosamente, esquecido por todas as forças que, em outras circunstâncias, tanto exaltam e enfatizam as conquistas do 25 de Abril.
Para lá de outras vantagens, o projecto holístico «Professores de Saúde para o ano 2000» teria a vantagem de ter antecedentes legislativos para a sua institucionalização.
O esquema encontrado para institucionalizar as artes marciais, por exemplo, seria extremamente fácil de adaptar às actividades holísticas de «educador de saúde», os ainda chamados técnicos de saúde.

É, pois, fundamental que a ideia de fundo seja captada: terapêutica é fundamentalmente, na perspectiva holística, uma tarefa educativa, transmissão de mestre a discípulo, e a eterna sequência de cada discípulo vir a tornar-se professor.
Desde que a tónica seja posta nesta ideia - Professores de Saúde para o Ano 2000 - tudo poderá ser facilitado do ponto de vista de oficializar e legalizar actividades ou especialidades ou profissões. A medicina descansa, enfim, porque verifica que ninguém lhes quer usurpar o espaço e o negócio (a doença aos médicos). Também a classe dirigente que sacralizou e não quer mais ninguém na posse do DR e o poder que isso dá, se acalmará quando souber que apenas se trata de criar bons técnicos (afinal, para o consumidor, vale mais um bom técnico do que dez maus doutores).

Obedecendo a este decálogo, o projecto holístico irá ser desenvolvido e levado por diante por um grupo promotor, em nome do qual estou autorizado a falar mas que, por enquanto, guarda segredo das identidades.
É importante dizer, para já, que o projecto holístico irá empreender algumas acções, entre as quais saliento:
a edição de um «Anuário Holístico» com balanço de actividades, pessoas e entidades
a elaboração de um manifesto e de um programa de acção.
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