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2006-02-28

BUDISMO 1987

mitos-1> os dossiês do silêncio – como a publicidade nos manipula – mitos contemporâneos

A SAÍDA VERTICAL:REFÚGIO BUDISTA

28/2/1987 (in «A Capital») - Perante o espectáculo paroxístico da violência tele-disparada todos os dias sobre a juventude, alguém, um dia, se perguntará: respondo com armas, suicidando-me, ou converto-me ao budismo?
Eis uma subtileza que nem o sociólogo humorista Esteves Cardoso conseguirá discernir: há um fio invisível a separar o suicídio da conversão violenta ao budismo.
Facto que, decisivamente, não dá nenhuma vontade de rir.
Vontade de rir, como é obvio, dão os humoristas.

FENÓMENO CONTAGIOSO

Ele, Boy George, cantor britânico de musica "pop", drogava-se que nem um perdido mas finalmente converteu-se à boa via, converteu-se ao budismo, informam as agências noticiosas.
Nestes casos, os meios de Comunicação Social não têm receio de sujar a sua impoluta reputação, as suas limpas mãos, páginas e antenas, com estas conversões místicas in extremis a uma religião exótica do estilo budismo que até já nem se usa.
A um cantor "pop" perdoa-se tudo, mesmo que "contraia" o budismo.
A propósito da série "Dallas'' que agora volta, após penosa ausência, aos tele-écrãs portugueses, torres e torres erguendo, o actor Patrick Duffy , para maior edificação das gentes, depois de vários passos em falso na vida (real) e de alguns milhões de dólares no mealheiro, chateia-se dos Dallas & Cª e bumba, converte-se ao budismo.
(Querem ver que é moléstia?).
É o cronista Tito Lívio que vai descobrir, quase em nota de roda pé, este tique nervoso do Patrick, esta particularidade insignificante em conta bancária tão confortável.
Paul Mc Cartney, por seu turno, o ex-beatle na reforma, disse à revista You, de Londres, que "ser vegetariano é uma forma de ser pacifista".
Sem se confessar ainda adepto de Buda mas lá andando, também, perigosamente perto, Paul Mc Cartney há 10 anos que "contraiu" hábitos vegetarianos e não se cala: « Acredito no protesto pacifista e não comer animais é um protesto não-violento".
O remorso carnívoro persegue o Paul: "Sinto que não tenho o direito de lhes tirar a vida. Desagrada-me a ideia de que para ter um bom prato de carne à mesa, seja necessário degolar uma criatura viva."
Depois de outras declarações onde o ex-beatle evidencia uma forte perturbação mental, acaba de maneira trágica, quase ecológica: " Penso que devemos proteger o que temos. Compete a nós mudar o mundo e fazer dele um sítio melhor".
Episódio que mais vale esquecer na carreira de Paul, foi o que alguém maldosamente teve o mau gosto de relembrar: pouco depois de os "beatles" terem acabado, Paul Mc Cartney escreveu uma canção ecologista, com o título "Wild Life" que, segundo o próprio, não foi êxito.
"A opinião pública prefere não pensar" rematou ele, vingativo.

LEI IMPLACÁVEL

Conversão ao budismo aparece, assim, na linguagem dos mass media e dos cronistas geralmente bem informados, como um acidente de carreiras brilhantes, acidente regra geral um tanto indecente, quase como variante de uma outra praga e vergonha do século, a famosa e famigerada s.i.d.a. que dá, como se sabe, para tudo, uni-, bi e pluri-sexual: nunca vi doença mais debochada.
Aconteceu até ao Liberace, o pianista dos candelabros, a quem não valeu a fortuna colossal, nem os 20 carros, nem os 18 pianos, nem as sumptuosas vivendas que deixou, etc. Nada disso conseguiu comprar o silêncio da implacável lei médica que manda denunciar quem quer que hoje morra de qualquer doença mal identificada e, logo, identificada como s.i.d.a. (a tal que serve para tudo e para todos), onde quer que o haja, onde quer que o não haja.
Como tem sido repetido até à exaustão - os jornais, com efeito, tomaram o freio nos dentes e decidiram corresponder aos desejos das multinacionais interessadas na gritaria - a s.i.d.a. é Sindroma, como foi dito, sindroma da imuno-deficiência adquirida e não um (número dígito) sintoma, variando de dois a infinito o número de doenças (ditas oportunistas...) que se acobertam nessa sigla que serve para tudo, especialmente para não explicar aquilo que ao sistema interessa que fique por explicar: a sórdida promiscuidade do mundo industrial contemporâneo.
Na minha lógica, que é ainda aristotélica, isto significa que todas as doenças, incluindo a medicina oficial, o mais perigoso cancro da época, poderão vir a estar incluídas no famoso sindroma de imuno-deficiência adquirida. Quem ache que não, o melhor é debater isso publicamente na televisão.
Que se indromine a opinião pública, é de lei, mas que se leve a indrominação até ao fim, então dizendo quem inventa o quê.
Desta barafunda em dó menor, retira-se a suprema lição: chegado ao Ocidente do rock, do tele-disco, do vídeo-tape, do compact-disc, o budismo transforma-se também em marca registada para consumo de massas, em moda mudável em concurso de design industrial.
Quando toda esta violência, implícita, explode num sítio determinado e apanha uma vítima, que pode ser um jovem estudante do Secundário, ( aluno do Liceu Camões), ali à Praça do Chile, ou quando um jovem se suicida na Penitenciária, aqui d'el Rei, começa o alarido dos moralistas a dizerem que a arma e quem a empunhou é que é o grande carrasco.
Os carrascos da alta hierarquia da violência não comparecem nas imediações do Chile nem disparam contra jovens, claro! Atulham-nos é de tele-discos, porno-discos, vídeo-discos, violência-discos!
Chega-se ao budismo como se chega ao suicídio, ou ao crime: quando a lógica paroxística do sistema (que vive de ir matando os ecossistemas com a conivência dos tecno-gestores) , baseado nos epicurismos e hedonismos ocidentais, debita um contingente intolerável de mortos e feridos, de inenarráveis violências, que fazem um himalaia nas nossas cidades e"civilizações".
Chega-se ao budismo, como se chega ao suicídio: no limiar do insuportável, é inevitável tomar uma decisão violenta.
Se se percebeu a tempo que o suicídio é ainda uma falácia originária da mesma filosofia (podre) de hedonistas e cristãos, fica a safa da saída vertical: o budismo.
Budismo que os "mass media" da praça conseguem pôr ao mesmo nível da moda e dos mitos da moda, como mais um produto de consumo. Amen aos "mass media", portanto.

TEORIA DOS HUMORES

Eventualmente e parecendo que oscila na corda bamba da ironia, surge o sociólogo Miguel Esteves Cardoso, que elogia a idiossincrasia portuguesa, que abomina a idiossincrasia portuguesa, que milita no Partido Popular Monárquico, que considera o PPM um clube de amigos, que elogia o Partido Comunista Português, que corre a outra esquerda como Partido Comodista Português.
O que não pode - Deus meu! - um sociólogo, ainda por cima dublé de humorista! Se um sociólogo já conseguira provar que até a trampa é comestível (e por isso mataram Pasolini), um humorista dublé de sociólogo poderá, descontraidamente, mostrar que até um sociólogo duplo se pode beber com Alka-Setzer.
Sendo as ideologias tão oscilantes nos tempos que correm, nada mais conveniente do que uma atitude assim sócio-humorística. À conta do humorista nunca se é suficientemente sociólogo, à conta do sociólogo nunca se é suficientemente humorista. Ora estamos na esquerda, ora na direita, ora elogiamos a lei da rádio, ora abominamos a lei da rádio.
É que sou um humorista e não foi nada disso que eu disse, sabiam?
Coerência de ideias, hoje em dia, é coisa perigosa e traz sequelas. Abre-se o guarda-chuva do humor e bem podem chover raios, coriscos, anátemas, fascismos!
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(*) Publicado no jornal «A Capital» (Crónica do Planeta Terra), 28 /2/1987 – Files relacionados com este – que considero antológico e de 5 estrelas – são:
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